Governadores decidiram, neste sábado (01), se mobilizar para evitar que estados e municípios sejam excluídos da reforma da Previdência , o que estava sendo cogitado pelo relator da proposta, deputado Samuel Moreira (PSDB-SP), em acordo com o governo.
Segundo Moreira, caberá aos líderes dos partidos na Câmara bater o martelo esta semana. Após reação negativa de governadores, o presidente Jair Bolsonaro afirmou que prefere mantê-los no projeto da reforma da Previdência , mas ponderou que a decisão é da Câmara e que ele não tem “nada a ver com isso”.
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O plano do relator e da equipe econômica era facilitar a aprovação da reforma no Congresso. Apesar da severa crise fiscal dos estados, boa parte dos parlamentares, sobretudo do chamado “centrão”, resiste a mexer nas aposentadorias dos servidores públicos de seus estados. Moreira disse que levará o tema, “polêmico e grave”, aos líderes partidários antes de concluir seu texto. Mas ontem, alguns líderes de partidos, como DEM e PR, apoiaram a exclusão de servidores estaduais e municipais.
Se forem retirados da reforma, estados e municípios precisariam tentar aprovar mudanças em suas assembleias legislativas e câmaras municipais. O governador paulista João Doria (PSDB) classificou de “temerária”, “egoísta” e “absolutamente deplorável” a possibilidade de exclusão : “Nós dissemos isso em Brasília e vamos reafirmar aqui: essa medida é temerária, desnecessária e cria problemas de grandes dimensões para governadores e prefeitos”.
Doria afirmou que pretende juntar esforços com os outros governadores para que todos pressionem as bancadas estaduais no Congresso e impeçam a exclusão de estados e municípios da proposta. Doria, Reinaldo Azambuja (PSDB), governador do Mato Grosso do Sul, e o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB), também vão discutir essas preocupações em reunião neste domingo (02) com o relator da reforma.
No sábado passado, os governadores do Sul e Sudeste reforçaram, em encontro na cidade de Gramado (RS), o apoio à proposta de reforma apresentada ao Congresso pelo governo. “A União é feita da soma de todas as partes. Se a União exclui estados e municípios da reforma, o que pode acontecer, lá na frente, é que a própria União terá que socorrer estados e municípios sem condições de pagar suas contas por causa das atuais regras previdenciárias”, disse Leite.
A situação financeira dos regimes próprios de previdência é considerada dramática por economistas. O déficit das previdências estaduais saltou de R$ 47,4 bilhões, em 2014, para R$ 88,5 bilhões em 2018, segundo o especialista em contas públicas Raul Velloso.
O governador do Piauí , Wellington Dias (PT), afirmou que a exclusão significaria uma “reforma meia-sola, de faz de conta”: “Já foi feito assim no passado: a Previdência complementar, novas regras para pensões etc. Resultado? Alguns estados, como o Piauí, aprovaram também no Legislativo. Outros, não. A União vai socorrer esses estados? Já faz isto com alguns. Quem paga a conta? O povo brasileiro”.
Witzel: melhor para o país
Segundo estudo da equipe econômica, a reforma da Previdência traria uma economia de R$ 329,4 bilhões para os estados nos próximos dez anos. “Seria um passo particularmente grave. Esse trabalho terá que começar do princípio, multiplicado por dois mil na esfera local. Diante disso, a tendência é que nenhuma das reformas locais saia com peso tão grande quanto previsto”, observou Luís Eduardo Afonso, professor da USP.
Secretário de Fazenda de Minas Gerais, Gustavo Barbosa afirmou que “todos os estados teriam problema”: “A discussão regional dispersa a discussão, pode ter situações distintas”, observou. “A reforma previdenciária, desde 1998, sempre foi discutida no Congresso e entendemos que esse deva ser o caminho”.
O governador do Rio, Wilson Witzel, afirmou que “o Brasil ganha se nós enfrentarmos de uma vez por todas as questões previdenciárias no Congresso”: “Mas, no Rio, caso seja necessário, temos a legislação pronta para apresentar à Assembleia Legislativa. A reforma da Previdência não acaba aqui”, acrescentou.
Depois de alguns governadores externarem sua oposição à medida ontem, o presidente Jair Bolsonaro afirmou que quer que estados e municípios permaneçam na reforma, mas disse que o tema será definido na Câmara: “Isso está sendo acertado pela Câmara. Nós gostaríamos que fosse tudo junto. Mas, como tem partidos que querem que aprove (separado), tem um impasse dentro da Câmara. Eu não tenho nada a ver com isso. É a Câmara que decide agora”, disse Bolsonaro, após almoçar na casa de um amigo militar.
De acordo com o presidente, deputados reclamam que podem sofrer pressão das suas bases se colegas votarem contra a reforma: “Eu quero aprovar a reforma basicamente como entrou lá. Tem parlamentar reclamando: ‘olha, a gente quer votar, mas o colega de tal partido votando em contrário eu tenho desgaste no estado’. Esse é o problema que está acontecendo na Câmara”.
O líder do PR na Câmara, deputado Wellington Roberto (PB), é um dos que defendem a retirada de estados e municípios da reforma: “Ano que vem é ano de eleição, e por ser eleição de prefeitos, os parlamentares têm atuação junto a suas bases. Com isso, eu e outros líderes já conversamos de forma antecipada sobre a retirada desse ponto da reforma”. Segundo o deputado, a expectativa de alguns líderes é que as próximas pautas, como a reforma tributária, consigam aliviar o rombo fiscal dos estados.
O líder do Democratas na Câmara, Elmar Nascimento (DEM-BA), também autor de uma emenda que retira estados e municípios, considera esse é o melhor caminho.
Pior que a União
A possibilidade de estados e municípios serem excluídos preocupa especialistas. “A situação dos estados é, em termos relativos, até pior que a da União, com o agravante de não poderem emitir moeda para se financiar. Assim, acabam sendo forçados a atrasar pagamentos. Esses atrasados acumulados já somam R$ 100 bilhões”, explicou Raul Velloso. “Hoje, os estados não têm condição de aprovar quase nada em suas assembleias. É inviável politicamente. Logo, a medida tem que ser aprovada no plano federal”.
De acordo com Velloso, há uma percepção equivocada de que a União consegue aprovar a reforma sem os governadores. “Sem os governadores, não há reforma. Por isso, eles têm que se unir com os articuladores da União para conseguir apoio das bancadas de seus estados em prol da reforma”, disse Velloso.
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Segundo Samuel Moreira, o relatório da reforma da Previdência ficará pronto nos próximos dias e será apresentado, no máximo, no começo da semana que se inicia no dia 10, antes do prazo determinado de 15 de junho.