Waldery Rodrigues, Secretário Especial da Fazenda: orçamento realista
Rodrigues Pozzebom/AgÊncia Brasil
Waldery Rodrigues, Secretário Especial da Fazenda: orçamento realista

O Secretário Especial da Fazenda do Ministério da Economia, Waldery Rodrigues , apresentou na sexta-feira passada (30) a proposta de orçamento do governo para 2020.

O texto prevê um conjunto de despesas discricionárias — ou seja, aquela parte diminuta do dinheiro público que o governo pode decidir como utilizar — quase 30% inferior ao que valor estimado para 2019.

Só para recordar, o orçamento para este ano reservava um total de R$ 102,4 bilhões para as despesas com combustível, conta de luz, material de limpeza, conservação de edifícios e outras despesas importantes para o funcionamento da máquina pública.

Veja mais: O dinheiro Acabou. E agora?

É dessa rubrica que sai, também, o dinheiro para programas sociais e as bolsas de pós-graduação . Os gastos, na prática, não passarão de R$ 94 bilhões neste ano.

Para 2020, o valor previsto é ainda menor, de R$ 89,1 bilhões. Ninguém tocou nos salários dos servidores e nos gastos com a previdência — assunto frequente neste espaço, mas que não será abordado desta vez.

A poda foi, de fato, considerável e suficiente para atiçar a velha discussão sobre o  dinheiro do povo , que há muito tempo perdeu o rumo no Brasil.

Os principais jornais se apressaram em anunciar, nas primeiras páginas, que o orçamento para 2020 pode provocar um apagão no serviço público e paralisar por completo a máquina administrativa.

A impressão que se tem, a partir da leitura de manchetes como as que foram publicadas nos jornais do último sábado (31), é que o governo só não está gastando dinheiro porque não está a fim, entende?

E que a falta da previsão de gastos para a maioria das rubricas discricionárias é consequência, apenas, da insensibilidade de um governo que vira as costas para os programas sociais e despreza a ciência.

Governo Insensível

A discussão em torno do assunto é tão rasa que nem resvala naquilo que de fato interessa. O governo não gasta porque não quer; ele não gasta por que não tem de onde  tirar dinheiro .

Isso não é novidade para alguém que tenha domínio sobre as quatro operações, mas a turma do contra não se preocupa com as formalidades da soma e da subtração. Críticas às decisões do governo serão ouvidas de um jeito ou de outro, independente das razões que justificaram sua existência.

Um momento, por favor! Ninguém está dizendo aqui que o governo é sempre movido por intenções louváveis nem que o presidente Jair Bolsonaro não mereça críticas severas pelos equívocos que comete na condução de algumas políticas essenciais.

Pelo contrário. O governo abusou do direito de errar, por exemplo, na forma de lidar com a Amazônia . E, de equívoco em equívoco, permitiu que a imagem de potência ambiental construída ao longo dos últimos anos ardesse em chamas em apenas oito meses.

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Não está sendo dito aqui que os governos anteriores foram eficazes ao lidar com as queimadas na floresta. O que se afirma é que o governo atual é mais desastrado ao lidar com essa questão do que foram os antecessores.

Não reconhecer essa evidência seria uma demonstração de ingenuidade ou de má fé tão grande quanto afirmar, por exemplo, que a máquina pública brasileira corre o risco de parar porque um governo insensível nega dinheiro para as pesquisas científicas e os programas sociais.

Atenção, senhoras e senhores: o que põe em risco a máquina pública do país não é o que está escrito na peça orçamentária apresentada pela Secretaria Especial da Fazenda! O que pode vir a emperrar o funcionamento dos órgãos do governo é a falta de dinheiro .

Se tem algo a ser dito a respeito da proposta apresentada é que ela representa uma das primeiras tentativas já feitas para tirar o Brasil do reino da fantasia orçamentária em que viveu até aqui e trazer o país para a dura realidade .

A dura realidade de um país que está na maior  pindaíba desde 2013 e só agora encontra alguém disposto a dizer que o rei está nu.

A farra orçamentária

O orçamento nada mais é do que a previsão de receitas e despesas para um determinado período. É um cálculo aproximado dos custos de uma determinada obra ou serviço bem como dos recursos disponíveis para realizá-la.

No Brasil, os orçamentos públicos  sempre seguiram uma trajetória tortuosa: raramente foram tratados com respeito pelos três poderes.

Até a passagem do empresário Dílson Funaro pelo ministério da Fazenda, em 1986, o governo federal trabalhava não com uma, mas com quatro previsões  diferentes. Havia o orçamento da União, o orçamento da Previdência, o Orçamento Monetário e o Orçamento das Estatais.

O dinheiro saia por todos os lados, só havia uma porta de entrada: o bolso do contribuinte, via Tesouro Nacional .

Ok. O orçamento também conta com recursos de outras origens, sobretudo com os empréstimos  que, ao longo da história, sempre foram essenciais ao financiamento da infraestrutura e dos equipamentos públicos no Brasil.

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Mas, de uma forma ou de outra, a conta sempre sobra para o contribuinte , obrigado a pagar impostos cada vez mais elevados em troca de serviços prestados mal e porcamente pelo poder público.

A torcida pelo fracasso

Seja como for, Funaro e sua equipe começaram a tomar providências que, se não resolveram a situação, pelo menos jogaram luz sobre o tamanho do buraco e isso, queiram ou não queiram os críticos da Nova República, foi um avanço considerável .

Na passagem do ministro pela Fazenda, os orçamentos federais foram unificados. Funaro também criou a Secretaria do Tesouro Nacional e pôs fim à Conta Movimento, do Banco do Brasil.

O instrumento permitia que o banco estatal sacasse diretamente do Tesouro, sem precisar dar satisfações a ninguém. Foi, talvez, a primeira das medidas de correção de rota que, anos mais tarde, criariam as condições mínimas necessárias para o  Plano Real , que conteve a inflação descontrolada que havia no país até sua implantação.

Há outras, tomadas durante o governo Collor , mas isso é uma outra história.

Antes da promulgação da Constituição de 1988, Dilson Funaro transformou em apenas um os quatro orçamentos federais
Marcelo Jorge Vieira de Brazil - Flickr
Antes da promulgação da Constituição de 1988, Dilson Funaro transformou em apenas um os quatro orçamentos federais



43 minutos do segundo tempo

Mesmo com a unificação promovida por Funaro e a relevância dada ao tema pela Constituição de 1988, o Orçamento nunca recebeu do Congresso Nacional um tratamento respeitoso.

Parece que a única preocupação de Suas Excelências em relação à previsão de despesas é tornar obrigatória a liberação de recursos para bancar as emendas que cada um deles tem o direito de apresentar.

De resto, o tema é tratado com um descaso que ultrapassa o desdém e beira o escárnio. Deputados e senadores não estão nem aí para sua responsabilidade sobre o orçamento. 

Tanto assim que, entra ano, sai ano, sempre deixam para os 43 minutos do segundo tempo as discussões que deveriam ter sido feitas com calma e profundidade ao longo do ano.

Assim, eles teriam tempo para debater os assuntos, definir as prioridades dos gastos, escolher os investimentos principais e definir despesas com base nos recursos disponíveis.

Mas a verdade é que, nesses pontos essenciais, eles não estão nem aí para a questão. Não, não existe aqui a intenção de falar mal do poder dirigido pelo deputado Rodrigo Maia (DEM/RJ) e pelo senador Davi Alcolumbre (DEM/AP).


Rodrigo Maia  e Davi Alcolumbre: falta de compromisso com o orçamento
Roque de Sá/Agência Senado
Rodrigo Maia e Davi Alcolumbre: falta de compromisso com o orçamento



Mas essa é a realidade dos fatos: eles preferem não se responsabilizar pelo problema do orçamento . Ponto final. Prova disso é que, embora a lei obrigue o Congresso a votar a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) até o mês de agosto, eles nunca cumprem o prazo.

Preferem promover recessos brancos para curtir o forró nas festas juninas de suas bases do que cuidar dessa que é uma das atribuições mais importantes do trabalho parlamentar em qualquer país sério do mundo.

A LDO para 2020 está com o Congresso desde o início do ano e sua aprovação é um etapa que deve preceder à elaboração da peça orçamentária.

Dependendo do que for decido pelos parlamentares quando se derem ao trabalho de se debruçar sobre ela, o documento apresentado pelo governo na sexta-feira passada pode se transformar em letra morta, um pedaço de papel sem qualquer valor.

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Existe certamente o risco de que eles venham a inflar a peça apresentada pela Secretaria da Fazenda e fazer ressurgir na previsão de gastos despesas que o ministério da Economia tentou eliminar agora.

Essa atitude certamente receberá aplausos, mas será uma página triste da história. Significa que os parlamentares do país optaram por jogar fora uma oportunidade de ouro de começar a levar a sério os gastos do dinheiro do povo .

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