A taxa básica de juros, Selic , foi o assunto central da disputa entre as políticas fiscal e monetária do Brasil em 2023. Enquanto o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) aguarda até o final de 2024 para indicar um sucessor ao presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto , as decisões em torno da taxa delinearam os rumos das prioridades do governo na política econômica.
Desde o começo, a equipe econômica do governo defende que a inflação brasileira é uma questão de oferta, logo, não poderia ser combatida com a queda da taxa básica de juros, conhecida como Selic – sigla para Sistema Especial de Liquidação e de Custódia. A Selic é o principal instrumento utilizado pelo BC para controlar a inflação, que eleva o preço do crédito e, consequentemente, trava investimentos no país.
A queda na taxa foi celebrada pelo governo devido ao ciclo de aperto iniciado em março de 2021, que se estendeu até agosto de 2022 com 12 aumentos consecutivos. Desde então, a Selic foi mantida em 11,75%.
O professor Renaldo Gonçalves, do Departamento de Ciências Atuariais da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) declarou que acredita que o impacto dos cortes da Selic não será no consumo, pois a redução é muito pequena para influenciar o aumento do endividamento do consumidor. “As políticas de geração de renda, direta como o bolsa família (benefícios: renda cidadania; complementar; primeira infância; variável familiar; e extraordinário de transição) e indireta como desenrola Brasil, são os novos motores de consumo”, defende.
“O conflito nesse momento é político, o governo quer regular a linha de crédito mais nociva para o consumidor (cartão de crédito), e os bancos alegam que o mercado é livre e cada instituição decide as taxas que praticará. O caminho mais seguro para a redução das taxas de juros é o aumento da competição, ou seja, a desconcentração do mercado financeiro”, finaliza.
O consenso econômico é que os efeitos de uma taxa de juros mais baixa só serão percebidos na economia entre 12 e 18 meses, indicando que o impacto de uma taxa reduzida só deve se manifestar no final de 2024. Contrariando a impressão inicial, a queda dos juros afeta não apenas os investimentos, mas também outros aspectos econômicos.
Política monetária e Política Fiscal
No Brasil, a Selic desempenha um papel fundamental na política monetária. O Banco Central utiliza esse Sistema para influenciar diretamente o ritmo de crescimento e alcançar metas relacionadas à inflação, sendo a variável central da política monetária. E quando a economia apresenta um desempenho fraco e não há riscos inflacionários, é possível reduzir a taxa de juros, estimulando o consumo e os investimentos da população brasileira.
Já a política fiscal refere-se diretamente às decisões do governo relacionadas aos gastos públicos, arrecadação de impostos e gestão da dívida pública. A ideia é buscar o equilíbrio das contas públicas, promover o desenvolvimento e garantir a estabilidade financeira.
Assim como a inflação, espera-se que o dólar também se valorize em relação ao real. Taxas de juros elevadas têm o poder de atrair investidores estrangeiros, pois investimentos de renda fixa são considerados mais seguros e oferecem retornos superiores aos investimentos de renda variável. Esse cenário geralmente resulta em uma valorização da moeda estrangeira em relação à moeda local
Copom
O Comitê de Política Monetária do Banco Central, Copom, é responsável por ajustar a cada 45 dias, decidindo sobre aumentos, reduções ou manutenção da Selic. O BC utiliza o sistema para influenciar o ritmo de crescimento e alcançar metas relacionadas à inflação, sendo a variável central da política monetária. E quando a economia apresenta um desempenho fraco e não há riscos inflacionários, é possível reduzir a taxa de juros, estimulando o consumo e os investimentos da população.
As metas de inflação fazem parte do "tripé macroeconômico", adotado desde o governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, o FHC, e considerado chave para o bom andamento da economia brasileira. Além das metas para a Selic, o tripé precisa de câmbio flutuante e superávit primário para funcionar.
Autonomia do BC
Com a Lei Complementar que concedeu autonomia ao Banco Central, aprovada em 2021, por Jair Bolsonaro. Desde então, os presidentes têm um mandato de quatro anos, que se inicia no terceiro ano do mandato do presidente da República. Desde então, o BC passou a ser considerado como autarquia de natureza especial. Até essa data, o BC era vinculado ao Ministério da Economia.
‘’A autonomia do Banco Central, a meu ver, foi uma das grandes e poucas conquistas, propriamente e determinantes dentro de perspectiva neoliberal, do governo Bolsonaro’’, defende Mayra Goulart, professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Para a docente, a ideia de fazer política monetária através do Banco Central, é constitutiva do projeto de desenvolvimento efetuado pelo Partido dos Trabalhadores (PT), que vê no banco central um espaço para a atuação política.
‘’Nenhuma reforma vai superar essa divergência entre a proposta de entendimento econômico do PT e a ideia de um banco central autônomo. O tensionamento é político porque ele faz parte de uma visão na qual a economia é um instrumento. Uma visão política de um país menos desigual que usa os instrumentos de política econômica para reduzir a desigualdade’’, finaliza Mayra.
O Projeto de Lei Orçamentária Anual de 2024, aprovado no fim de agosto, com medidas que visam o aumento da arrecadação federal, como a tributação de ativos offshore (no exterior) e taxação de fundos exclusivos. A lei permite atrelar ao orçamento medidas em tramitação no Congresso.
Assim como na área da construção civil, onde "arcabouço" se refere à criação da estrutura utilizando materiais como madeira ou ferro, na Economia ocorre algo semelhante. Para garantir um Orçamento viável e eficaz, é imprescindível contar com um conjunto de normas que projetem as alocações do orçamento.
Além do arcabouço , o governo também conseguiu passar uma reforma tributária . A última vez que o Brasil fez uma grande mudança em relação ao tema ocorreu em 1965, quando o país estava no período da ditadura militar.
A reforma, discutida por quase 30 anos, foi aprovada para simplificar a tributação sobre o consumo, alterando a maneira como os brasileiros compram produtos e serviços. O texto-base recebeu 365 votos a favor e 118 contra após uma série de negociações entre a Câmara e o Senado, contando ainda com a participação do Ministério da Fazenda.