Luiz Inácio Lula da Silva, ex-presidente da República
Reprodução/Facebook Lula - 15.02.2022
Luiz Inácio Lula da Silva, ex-presidente da República

Em 2002, o  ex-presidente Lula acenou ao mercado com a “Carta ao povo brasileiro” , indicando que respeitaria o “tripé macroeconômico” adotado por Fernando Henrique Cardoso, baseado em câmbio flutuante, e metas de inflação e fiscal. Vinte anos depois, se eleito, Lula encontrará a economia em frangalhos por conta da pandemia e promete soluções mais ligadas às suas raízes.

Com indicadores de inflação, desemprego e crescimento preocupantes após quase 6 anos de política neoliberal, Lula aposta em desfazer medidas adotadas após o governo Dilma Rousseff. Entre as propostas estão:

  • Revogação da reforma trabalhista;
  • Anular privatizações;
  • Reversão da política de preços da Petrobras;
  • Revisão do teto de gastos. 

Reforma Trabalhista

Ainda em janeiro, Lula disse que os brasileiros deveriam "acompanhar de perto" o que está acontecendo com a reforma trabalhista na Espanha , que anunciou a revogação do texto aprovado em 2012, após o aumento da taxa de desemprego no país. Segundo Lula, o presidente espanhol Pedro Sánchez estaria "trabalhando para recuperar direitos dos trabalhadores".

O líder das pesquisas eleitorais considera que o texto aprovado em 2017 por Michel Temer  “dinamitou” direitos dos trabalhadores e afirmou que pretende revogar a PEC para criar empregos com qualificação no país. 

Antes da reforma trabalhista, o Brasil tinha 12,7 milhões de desempregados, dois anos e meio depois, o número recuou para 12,4 milhões. A pandemia diminuiu o impacto da medida, mas na visão do ex-presidente, só melhorar o quantitativo não basta. 

"O mundo novo criou piores condições de empregabilidade para o povo brasileiro e destruiu parte do que a gente construiu na Educação. Tem menos jovens estudando na universidade, menos salário no bolso do trabalhador e os empregos são intermitentes, que não garantem segurança", criticou Lula em entrevista à rádio Som Maior, de Santa Catarina na última terça-feira (22).

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Uallace Moreira, Professor Visitante da Faculdade de Economia da Universidade Federal da Bahia (UFBA) e da Seoul National University (SNU), diz que a revogação é justa, pois a promessa de criação de 6 milhões de empregos apresentada na época não se concretizou, uma vez que, segundo o economista, "não é a legislação trabalhista que cria empregos, e sim crescimento econômico".   

"Nos governos do PT a CLT estava em pleno vigor e tivemos a menor taxa de desemprego da história do Brasil", comenta. "Hoje temos 11,2% de desemprego, mais 4,9% de desalento (pessoas que desistiram de procurar emprego),  quase 16% fora do mercado de trabalho. A reforma não resolveu o problema já que o Brasil não cresce, não gera emprego", finaliza. 

PIB andou de lado na última década
Reprodução IBGE
PIB andou de lado na última década

O economista lembra que o PIB brasileiro não cresce desde 2014, e alerta para o crescimento da taxa de subutilização (pessoas que queriam trabalhar por mais tempo e não conseguem), um indicativo da precarização do trabalho. 

"Hoje esse índice está em 24%, mas chegou a 29%. O quadro hoje é esse: desemprego alto, queda de renda e trabalho precário. Isso impacta também na contribuição previdenciária. O Brasil tem um mercado interno imenso, e isso para ser efetivado precisa ser fortalecido, mas a reforma está ampliando a desigualdade, portanto a revogação é uma medida urgente", opina o professor.

Teto de gastos

Lula promete também acabar com a âncora fiscal do teto de gastos, e "fazer o que for necessário" para melhorar a vida do povo. "Vamos gastar o que for preciso gastar. Muitas vezes o gasto é investimento", afirmou Lula em entrevista à rádio Espinharas, na Paraíba, em 15 de março.

O ex-presidente entende que muitas vezes os gastos são investimentos limitados pela PEC 241, instituída no governo Temer. 

"Você não tem que limitar, porque quando limita, é para gastar menos para o benefício do povo. Eles consideram como gastos pagar aposentadoria, salários, investimentos na saúde", completou. 

A regra do teto de gastos limita o crescimento das despesas à variação da inflação, mas, na visão do petista, funciona como "algemas" para governantes incompetentes. 

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A professora de economia da UFF (Universiade Federal Fluminense), Julia Braga, afirma que nos quase seis anos em que vigora o teto de gastos, ele provocou estagnação econômica, imprevisibilidade constitucional e não concluiu o propósito para que foi criado, que era controlar a inflação. 

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"O crescimento dos gastos públicos de 2015 a 2019 é de 0,9% ao ano e de 2004 a 2014 esse crescimento era perto de 7,5%. Essa retração nos gastos públicos coincide com a queda no potencial de crescimento da economia brasileira, que se descolou da média mundial. O Brasil cresceu cerca de 3,5% entre 2004 e 2014 e a partir de então o mundo continua crescendo nesse ritmo e a economia brasileira fica estagnada", critica. 

"Além disso, você tem uma necessidade de mudar a Constituição muito frequentemente, dado que essa regra é absolutamente restritiva e não permite nem mesmo o bom funcionamento da máquina pública", completa. 

Essas modificações constantes diminuem a transparência das contas públicas, como no caso das emendas do relator que formam o  "orçamento secreto" .

Julia acrescenta que existem outras regras que limitam o gasto desenfreado.

"Não acredito que revogar o teto de gastos atinja a credibilidade do governo, lembrando que ainda temos a LRF (Lei de Responsabilidade Fiscal). Além disso, o governo precisa apresentar um planejamento econômico e que de fato siga."

Política de preços da Petrobras

O ex-presidente Lula tem intensificado suas críticas à atual gestão da Petrobras, visto que a alta da gasolina supera o IPCA em 158% durante governo Bolsonaro, sendo os combustíveis os principais causador da inflação de 10,6% registrada em 2021. Como solução, o petista garante que vai extinguir a política de PPI (Preços de Paridade de Importação) e " abrasileirar" a gasolina .

"O Brasil abriu mão de sua soberania para destruir a Petrobras, toda política é para ter lucro para dividir com acionistas de Nova York . Quando a gente enriquece esses acionistas, a gente empobrece o povo. Se a gente ganhar, vamos abrasileirar a Petrobras", prometeu o petista após criticar a atual política de preços da estatal.

Desde outubro de 2016, a Petrobras adota a política de Preços de Paridade de Importação (PPI), que vincula o preço dos derivados de petróleo ao mercado internacional. Após cinco anos da mudança, o combustível no Brasil concentra a maior alta da história, superando a inflação em mais de 30%.

"Quando Temer assume, ele coloca vários representantes de fundos de investimentos no Conselho da Petrobras. Bolsonaro também reduziu drasticamente a composição de integrantes do governo na administração da empresa e nomeando pessoas do mercado com votos do governo. Esse conselho impõe o PPI e reduz o investimento da companhia de R$ 48 bilhões para R$ 8 bilhões e passa a vender ativos como refinarias. Assim a Petrobras passou a representar os interesses dos acionistas, sendo 44% estrangeiros  e 22% brasileiros", explica Uallace Moreira, adicionando: "Esse grupo está preocupado com lucro e distribuição de dividendos, mesmo que isso resulte em uma política que onere a classe trabalhadora".

"Tínhamos um parque de refino para processar petróleo durante o governo do Lula e da Dilma, reduzindo a dependência de importação, permitindo a Petrobras o processamento aos seus custos, que dava margem para administrar a alteração da cotação do barril e da variação cambial. A política de preços era mais estratégica e considerava o cenário interno", lembra Moreira.

Privatizações

A privatização de empresas é crucial na agenda neoliberal do atual ministro da Economia, Paulo Guedes, mas, se depender de Lula, elas não vão longe. Os dois principais alvos da gestão bolsonarista, a Eletrobras e os Correios, estão em pés distintos, sendo a estatal de energia a mais avançada. 

Lula, no entanto, se mostrou contrário à venda do "patrimônio do povo brasileiro", e deu indícios que pode reestatizar as companhias , caso vença a disputa ao Planalto. 

"Quero deixar bem claro que eu e o PT somos contra a privatização da Eletrobras. Não há necessidade de se vender um patrimônio construído pelo povo brasileiro, que regula o sistema elétrico, e que pode impedir preços abusivos nas contas de energia", disse Lula.

** Luís Felipe Granado é repórter do Brasil Econômico, editoria de Economia do Portal iG, e pesquisador na Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz)

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