Pelo menos 635 auditores-fiscais abriram mão de cargos de chefia ou com gratificação como parte do movimento de protesto pelos cortes no orçamento da Receita Federal em 2022 e pela falta de regulamentação do bônus de produtividade da categoria. A mobilização pela entrega de cargos atingiu o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), e 44 auditores abriram mão dos cargos e pediram para retornar às funções que exercem no Fisco, o que tem potencial para paralisar os julgamentos do conselho.
Esses números fazem parte de balanço parcial divulgado pelo Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais da Receita Federal do Brasil (Sindifisco). Os auditores estão deixando as funções de chefias e cargos em comissão, mas não deixam de ser servidores.
A categoria está realizando uma série de asssembleias nesta quinta-feira (23) para deliberar sobre a entrega de cargos, a instituição da meta zero para a classe, paralisação dos projetos do Plano Operacional, preenchimento de relatórios e a realização de operação padrão nas aduanas (com exceção de medicamentos e insumos médicos e hospitalares, cargas vivas e perecíveis e outras prioritárias, além do tráfego de viajantes em trânsito internacional.
De acordo com o Sindifisco, só nesta quinta-feira, além da renúncia coletiva no Carf, houve entregas de cargos de delegados e adjuntos em Brasília, Goiás, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, além de chefes da área de inteligência de todo o país.
Na carta para justificar a renúncia coletiva no Carf, os auditores afirmaram que a decisão foi tomada em linha com a mobilização da categoria e pela perplexidade com o tratamento dado pelo governo federal. "Tal descaso se estende, inclusive, a questões remuneratórias, como fica evidente pela demora na regulamentação do bônus de eficiência, uma pendência de 5 anos, o que revela desprestígio institucional incompatível com a importância da Receita Federal do Brasil", escreveram.
O presidente do Sindifisco, Kleber Cabral, diz que a entrega dos cargos e paralisação dos julgamentos do Carf neste momento traz um componente extra, já que em janeiro voltariam à pauta as sessões sem limite de valor, quando haveria julgamentos de recursos mais relevantes.
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Falta de recursos
O Orçamento de 2022 promoveu um corte de R$ 675 milhões na verba para a gestão das soluções informatizadas da Receita Federal, como os softwares ligados à arrecadação e administração do Imposto de Renda. Originalmente a previsão era de R$ 1,311 bilhão para essa finalidade.
O sindicato argumenta que essa verba foi usada para custear reajuste salarial para policiais federais, um pedido do presidente Jair Bolsonaro (PL) ao relator do Orçamento, o deputado Hugo Leal (PSD-RJ).
Auditores da Receita Federal, cujos salários básicos variam entre R$ 21 mil e R$ 27,3 mil, cobram a regulamentação do bônus de produtividade para os servidores, que garante um pagamento extra de R$ 3 mil.
O Bônus de Eficiência e Produtividade na Atividade Tributária Aduaneira (BEP) foi criado via medida provisória em 2016 e convertido em lei em 2017, mas nunca foi regulamentado. Isso significa que ele não mede produtividade, já que todos os auditores e analistas tributários recebem.
A categoria cobra que haja essa regulamentação, o que não ocorreu até agora. A estimativa é de que, caso regulamentado o pagamento, haveria um gasto extra de R$ 430 milhões.
Os auditores-fiscais não são a única categoria a se mobilizar após o aceno do governo aos policiais. Como o GLOBO mostrou, profissionais de outros segmentos do funcionalismo, incluindo carreiras da elite do serviço público, estão iniciando movimentos para pressionar o governo por reajustes para todos.