A alta do dólar e o fechamento das fronteiras são um fator decisivo para a valorização do vinho brasileiro
Leo Martins / Agência O Globo
A alta do dólar e o fechamento das fronteiras são um fator decisivo para a valorização do vinho brasileiro

O consumo de vinho nas casas brasileiras cresceu nesses tempos de reclusão, mais precisamente, aumentou 10,9% no primeiro trimestre de 2020 se comparado ao mesmo período do ano passado, segundo dados da Ideal Consulting, empresa especializada em pesquisa de mercado neste setor.

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Não faltam taças girando em fotos nas redes sociais. E quem lucra com isto são as vendas on-line, o e-commerce tem sido a grande alternativa para enfrentar a crise. A primeira quinzena de abril registrou um aumento de 36% no número de pedidos em relação à primeira quinzena de março, quando o fechamento do comércio ainda não havia sido decretado, segundo dados da plataforma Nuvemshop.

No período, foi registrado crescimento de 60% no número de novas lojas. As vendas on-line triplicaram de tamanho com a adesão de importadoras que não tinham a venda direta ao consumidor, como a Barrinhas, que se mobilizou para comercializar através das redes sociais e loja virtual.

E-commerce alavancou vendas das bebidas no país no primeiro trimestre do ano
Reprodução
E-commerce alavancou vendas das bebidas no país no primeiro trimestre do ano

"Temos efetuado muitas vendas e conseguido a cada dia novos clientes interessados na compra de kits de vinhos , montados por nós, as pessoas preferem os kits, que são temáticos, criamos um para o Dia dos Namorados. Aproveitamos para promover lives com bate-papo e degustação de nossos vinhos", diz a diretora Rosemary Moreira, da Barrinhas, uma das maiores na importação de vinhos portugueses, que faz 30 anos em 2020.

Assim que surgiu a pandemia, Ana Luísa Santos, da Asa Gourmet, estava viajando. Chegou e se deparou com os 800 restaurantes para os quais fornecia vinhos e azeites fechados. Em tempo recorde, ela percebeu que precisava mudar seu foco. E ele seria para venda para pessoas físicas.

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"Em uma semana, a Asa Gourmet já havia transformado o site institucional em uma loja virtual, com entrega em 24 horas. Quem bebia antes da pandemia duas garrafas por semana passou a beber cinco, ou seja, mais que dobrou o consumo de vinho em casa. Os mais pedidos são aqueles até R$ 50 e os das promoções. Na compra de seis garrafas destes três portugueses - Xisto Preto (Douro), Intimista (Alentejo) e Testamento (Lisboa), a unidade sai a R$ 35", exemplifica Ana.

Outras importadoras também perceberam este aumento desde que as medidas de distanciamento social começaram a ser implementadas para conter a disseminação de Covid-19 no Brasil . Com 600 rótulos de 20 países na prateleira, a Casa Flora, que sempre focou no atendimento de restaurantes, hotéis e varejos, resolveu investir numa loja virtual, mas com cautela.

"Com essa pandemia, nossos clientes perceberam a necessidade de avançar a estratégia no canal eletrônico. Hoje, ele é realidade na aquisição de vinhos e existe uma tendência de crescimento. Isto aconteceu conosco também e estamos entendendo que, por conta de nosso extenso portfólio, possa fazer sentido avançarmos também nesse canal com uma segmentação inteligente para não gerar conflitos entre nossos canais", ressalta o sócio diretor Antonio Carvalhal Neto.

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No período, foi registrado crescimento de 60% no número de novas lojas
Roberto Moreyra / Agência O Globo
No período, foi registrado crescimento de 60% no número de novas lojas

Completando 50 anos em 2020, a importadora tem vendido mais e, a cada semana, lança promoções mediante demanda dos consumidores: "o vinho se mostra como a bebida mais democrática e com capacidade de fazer o melhor casamento com as refeições. E como estamos nesse momento fazendo mais refeições em nossas casas, naturalmente o consumidor se identificou".

Percebendo um bom nicho de mercado em relação ao serviço de entrega, a sommelier carioca Elaine Oliveira não pensou duas vezes e abriu sua própria loja on-line, a Amai Vinhos, com direito a um canal tira-dúvidas ao vivo.

"São 300 rótulos de 12 países (R$ 45 a R$ 2 mil), incluindo Eslovênia e Áustria, por exemplo, além de uma sommelier virtual que ajuda na escolha e até na harmonização de pratos e queijos", conta Elaine.

Vale tudo para atrair a atenção do cliente. Três  grandes players do setor, Decanter, Evino e Wine estão fazendo bota-fora do seu estoque, com 70% dos seus vinhos custando entre R$ 50 e R$ 60. Geralmente, vinhos em final de estoque por troca de safra ou mudança de produtor, e que acabam sendo uma oportunidade para conhecer rótulos diferentes por preços bem atrativos. Tudo virtual.

A Evino, por exemplo, verificou aumento de 19% na quantidade de garrafas vendidas na comparação entre os meses de fevereiro e março do ano passado e de 2020. Segundo o e-commerce, o volume de pedidos cresceu 20%, com um incremento de 30%, entre fevereiro e março deste ano, das solicitações feitas por novos clientes em relação ao total.

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A hora e a vez do vinho nacional

Para atrair clientes, empresas fazem
Roberto Moreyra / Agência O Globo
Para atrair clientes, empresas fazem "bota-fora" com promoções de até 70%

A alta do dólar e o fechamento das fronteiras são um fator decisivo para a valorização do vinho brasileiro. A Miolo comemorou um aumento de 62% nas vendas on-line durante o mês de abril, se comparado ao mesmo período do ano passado. A marca, que já atua há oito anos com loja virtual, vem intensificando ações para aumentar a representatividade do e-commerce. Medida decisiva para o momento.

"Acreditamos que as vendas on-line deverão seguir em alta nos próximos meses. Estamos trabalhando numa nova plataforma e na oferta de kits que atendam a demanda deste consumidor que está em casa, além de frete grátis em todo território nacional para compras acima de seis garrafas e rótulos a partir de R$ 25", informa Eduardo Lapenda, da Miolo.

Até os espumantes pegaram carona nesta onda. Uma das novidades da Serra Gaúcha - que já chegou com uma linha de cinco espumantes -, o rótulo Amitié, lançado ano passado pelas amigas Andreia Gentilini Milan, sommelier, e Juciane Casagrande, enóloga, registrou um aumento de aproximadamente 30%. E olha que nem é a melhor época para a turma das borbulhas.

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"O que temos feito é instigar o consumidor, com ações de compra e ganha, sem mexer no preço", conta Juciane Casagrande. A linha, comercializada no Rio pela Wine Out, varia de R$ 39,90 a R$ 149,90.

A sommelier gaúcha Michelle Landgraf, da Divas do Vinho, informa que, até antes da pandemia, o percentual do faturamento dos vinhos no supermercado era de 1%, mas agora são 5%.

Empresas aproveitam para promover lives com bate-papo e degustação de vinhos
Divulgação
Empresas aproveitam para promover lives com bate-papo e degustação de vinhos

"Até dez dias atrás, a gente conseguiu verificar que algumas lojas conseguiram manter suas tabelas sem mexer. Mas alguns fornecedores aumentaram 30%. Hoje, temos um aumento de procura nos vinhos até R$ 40. Não quer dizer que os nacionais ficaram melhores, mas com o veto à entrada de vinhos importados, os nossos ganham mais espaço", explica.

Alguns produtores brasileiros conseguem vender direto para o consumidor, muitos com ajuda de lojas como a Cave Nacional, no Rio, que começou virtual e, só dois anos depois, ganhou forma física, onde só se encontra vinhos de pequenas e médias vinícolas do Brasil (R$ 41 a R$ 376), desde a Serra Gaúcha até o Sertão.

"Houve um aumento de mais de 300% nas vendas on-line. As pessoas passaram a consumir mais vinho em casa e não só aos finais de semana. A família cozinhando junta tem sido um momento íntimo, afetivo, e o vinho tem feito parte desses momentos", destaca o sócio Marcelo Rebouças, anunciando uma série de promoções que inclui um kit com uma seleção harmonizada de três rótulos.

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Hábito saudável

Até os espumantes pegaram carona nesta onda, dominada pelos tintos Foto
Bruno Kaiuca / Agência O Globo
Até os espumantes pegaram carona nesta onda, dominada pelos tintos Foto

Freud explica: "A tendência de isolar todas as fontes que causam desprazer do ego cria um puro ego de busca de prazer". Com base na psicanálise, compensamos o distanciamento criando outros prazeres.

"Em "O mal-estar na civilização", Freud  diz que não é natural que a gente renuncie nossos desejos. Segundo ele, a droga é uma solda para obtenção deste prazer, o que, neste momento, diz sobre qualquer substância que altere o humor. Isto vale para o vinho, ele acalma e também é um prazer", comenta a psicanalista Lindinaura Canosa, da Sociedade de Psicanálise da Cidade do Rio de Janeiro (SPCRJ).

Em meio à pandemia do Coronavírus, em que o mundo passou a seguir regramentos de circulação de pessoas, gerando o distanciamento social, muitos costumes mudaram. Com restaurantes fechados, o consumo passou a ser um hábito ainda mais caseiro, uma prática que migrou da rua para a casa.

"Tem mais gente indo para a cozinha, o que leva a ter mais vinho em casa, para acompanhar todo o processo e ainda harmonizar com o prato", comenta o fotógrafo e enófilo Francisco Carneiro, o Chico Cineasta, do site Vinhos Pelo Mundo.

Beber é bom, e quase todo mundo gosta. Para a psicóloga Rita Almeida, uma das formas para lidar com situações de angustia e mal-estar é usando drogas: lícitas, ilícitas ou medicamentos.

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"As substâncias presentes nas drogas podem nos dar alívio e prazer. Quem bebe vinho não bebe para se embriagar", diz.

A Organização Mundial da Saúde (OMS) aprova, mas limita o consumo diário de vinho a uma ou duas taças diárias (tem polifenóis ajudam a combater doenças cardiovasculares). No mais, resta-nos beber moderadamente e manter a sanidade.

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