Daqui a pouco, assim que o Congresso Nacional aprovar esse arremedo de reforma da Previdência que vem sendo discutido
, outro tema rumoroso entrará na pauta política — e, a julgar pelo nível rasteiro dos debates políticos travados em torno das aposentadorias, é de se esperar uma nova temporada de agressões ao bom senso. O tema em questão é a reforma Tributária, outra medida essencial para o futuro do país que, certamente, será vítima do mesmo jogo de interesses corporativos e paroquiais que costumam marcar os debates na Câmara e no Senado.
Os senhores parlamentares, como de hábito, lidarão com a questão mais preocupados em garantir a liberação de suas emendas do que em criar um sistema de impostos capaz de destravar o mercado e por a economia para funcionar. O Brasil, com toda certeza, manterá sua carga tributária de país rico (equivalente a 33,5% do PIB) totalmente a serviço do pagamento dos salários dos funcionários públicos. E continuará a oferecer ao cidadão pagador de impostos um conjunto de serviços e políticas públicas de qualidade sofrível, equivalentes aos dos países mais atrasados do mundo. Em matéria fiscal, o Estado brasileiro tem uma personalidade bipolar. Na hora de arrecadar, é rigoroso e detalhista. Na hora de gastar, é perdulário e irresponsável.
Isso vale para todos os poderes. Defendida como um movimento importante no jogo democrático, a vocação recém-descoberta pela Câmara dos Deputados de assumir o protagonismo das iniciativas políticas tem se caracterizado mais pela defesa de interesses específicos do que pela busca de providências voltadas para “o interesse geral da nação”. Foi assim na discussão da Previdência, quando as corporações mais poderosas nada perderam, e será assim na elaboração da nova política fiscal
do país.
Para garantir o seu controle sobre o tema, os senhores deputados resolveram, nesse segundo caso, nem esperar pela apresentação de um projeto de lei elaborado pelo governo, como aconteceu com a Previdência. E puseram para tramitar um projeto que estava nas mãos deles desde o ano passado e pelo qual ninguém tinha movido uma palha até o governo manifestar a intenção de tratar do assunto.
O projeto em questão é como quem tem um olho em terra de cego: parece um rei se comparado ao quadro atual. Caso se mantenha a salvo dos interesses corporativos e regionais que orientam as ações do parlamento, representará um avanço considerável em relação ao quadro atual. Apresentado pelo economista Bernard Appy, do Centro de Cidadania Fiscal, o projeto tem como principal proposta a substituição do PIS, da Cofins, do IPI, do ICMS e do ISS por um único importo inspirado no IVA europeu. Caso essa consolidação dê certo, já será um avanço. Mas a chance de uma mudança como essa passar pelo parlamento é tão próxima quanto a de uma viagem do homem a Júpiter ser feita nos próximos dez anos: pode até acontecer, mas é extremamente improvável.