Pouco mais de dois meses após o rompimento da barragem da Vale em Brumadinho (MG), que tem 225 mortes confirmadas, o governo do presidente Jair Bolsonaro (PSL) anunciou o bloqueio de R$ 15 milhões do orçamento da Agência Nacional de Mineração (ANM), o que representa 22% do dinheiro que o órgão tem à disposição. Inicialmente previsto para R$ 63 milhões neste ano, o orçamento da agência será reduzido a R$ 48 milhões, segundo integrantes.
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Diretores da ANM afirmam que a decisão irá comprometer a já precária fiscalização de barragens de mineração no País. Foram bloqueados gastos de investimentos e de manutenção de operações, fiscalizações, e de unidades do órgão. Não estão incluídos os gastos com pessoal, que incluem pagamento de salários e benefícios para servidores ativos e aposentados.
O contingenciamento faz parte de um bloqueio de gastos maior por parte do governo, de R$ 29 bilhões , que atingiu todos os ministérios. O orçamento ainda mais baixo da agência foi comunicado aos dirigentes do órgão em uma reunião, na semana passada, pelo Ministério de Minas e Energia, pasta à qual a ANM está ligada.
Antigo Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), a ANM foi criada, no ano passado, para regular a exploração mineral no Brasil, além de controlar e fiscalizar o exercício das atividades de mineração em todo o território nacional, o que inclui a fiscalização de barragens de rejeitos de minério, atividade que se tornou a principal função da agência depois do desastre de Brumadinho . O Brasil tem hoje mais de 700 barragens de mineração.
O bloqueio de gastos determinado pelo governo deve impedir que a ANM atenda ao pedido do Ministério Público Federal (MPF) de Minas Gerais, que ajuizou ação civil pública para que o órgão seja obrigado a inspecionar todas as barragens de mineração do País consideradas inseguras ou com segurança inconclusiva.
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Funcionários da ANM também temem que o orçamento menor obrigue o órgão a fechar unidades em alguns estados. Além de acompanhar a situação das barragens, a ANM precisa fiscalizar e regulamentar as atividades minerárias como um todo, inclusive o recolhimento dos royalties de mineração, atividades que também devem ficar comprometidas com o corte orçamentário.
A agência foi criada numa tentativa de estruturar um órgão federal de mineração forte, nos moldes do que já existe no setor elétrico (Aneel) e do petróleo (ANP). A expectativa dos dirigentes da entidade era que o orçamento do órgão neste ano fosse usado justamente para reestruturar o órgão, já que com o desastre de Brumadinho o foco para a fiscalização de barragens aumentou.
Até o rompimento do reservatório da Vale , a agência tinha apenas 34 fiscais de barragens. Em Minas Gerais, estado que concentra o maior número de estruturas, eram somente cinco. Para fiscais do órgão ouvidos pelo jornal O Globo , seriam necessários, no mínimo, dois mil profissionais para conseguir acompanhar presencialmente todo o sistema de barragens de mineração no Brasil.
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Ainda em Minas Gerais, funcionários da agência relatam que faltam de carros e equipamentos modernos para realizar a fiscalização. Quando a barragem da Vale se rompeu, segundo carta dos funcionários do órgão no estado, um especialista do órgão “teve que abastecer a camionete com a qual se deslocaria utilizando recursos próprios para pagar o combustível, devido à indisponibilidade de verba para esse fim na Gerência Regional de Minas Gerais”.