A percepção de corrupção no Brasil
Lorena Amaro
A percepção de corrupção no Brasil


Repercutiu na imprensa o último ranking do Índice de Percepção de Corrupção , calculado e divulgado pela Transparência Internacional. O Brasil, segundo as manchetes, perdeu 10 posições no ranking entre 2022 e 2023, colocando-se abaixo de países como Belarus, uma ditadura subserviente a Moscou. Como sempre, e por sua própria natureza, a manchete é bombástica, mas não mostra a essência da questão. Antes de aprofundar, vamos fazer uma rápida revisão da metodologia do índice.


Para calcular este índice, a Transparência Internacional compila 13 diferentes bases de dados de percepção de corrupção do setor público, incluindo, por exemplo, as pesquisas do Economist Intelligence Unit, do Banco Mundial, do FreedomHouse, entre outros.O índice varia de 0 a 100. Quanto maior o índice, menor é a percepção de corrupção no país. A líder do ranking deste ano foi a Dinamarca, com índice 90, ao passo que o lanterna foi a Somália, com índice 11. O Brasil obteve índice 36, tendo perdido 2 pontos em relação ao índice de 2022.

Agora, vamos qualificar um pouco a nota obtida pelo Brasil. O índice 36 deste ano não difere muito do histórico brasileiro. Em toda a série, o índice mais alto (43), foi obtido em 2012 e 2014, enquanto o mais baixo foi o de 2006 (33) [Desconsideramos os anos de 1995 a1997, os três primeiros da série, pois entendemos que a metodologia estava sendo ajustada]. No gráfico a seguir, mostramos a evolução do índice desde 1998, tanto do Brasil quanto da Coreia e do Chile:

Evolução do índice de corrupção
Divulgação
Evolução do índice de corrupção


Observe como os gráficos do Brasil e do Chile permanecem mais ou menos nos mesmos patamares ao longo de todo esse período de 25 anos, o índice do Chile por volta de 70 pontos e o índice do Brasil por volta de 40 pontos. O que chama a atenção é o índice da Coreia, que mudou de patamar nesse período, saindo do “padrão Brasil” e atingindo o “padrão Chile”. O que os coreanos fizeram nesse período para mudar o patamar de percepção de risco do governo?

Outra consideração interessante a se fazer é a relação entre percepção de corrupção e renda per capita. Neste ranking, como em vários outros dessa natureza, os países mais ricos aparecem nas melhores posições. Essa seria uma regra? No gráfico a seguir, mostramos a correlação entre o índice de corrupção e a renda per capita medida em paridade do poder de compra:

Relação Corrupção-PIB/capita
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Relação Corrupção-PIB/capita


O PIB/capita está apresentado em escala logarítmica, pois facilita a visualização. Calculamos uma regressão linear (que no gráfico aparece como uma linha exponencial por causa da escala logarítmica utilizada), e encontramos um coeficiente de explicação (r2) suficientemente alto para estabelecer que o índice de corrupção tem sim alguma correlação com a riqueza do país. Para se mais exato, para cada mil dólares adicionais de renda/capita, o índice de corrupção tende a crescer 0,6 pontos. Deixarei a questão de o quê causa o quê (os países são menos corruptos porque são mais ricos ou os países são mais ricos porque são menos corruptos) para outra hora. O ponto é que uma parte do índice de corrupção pode ser correlacionada com a riqueza do país, mas não tudo.

Por exemplo, Barbados e Turcomenistão têm a mesma renda/capita do Brasil, mas índices de corrupção bem diferentes, sendo o Turcomenistão bem mais corrupto, enquanto Barbados é bem menos corrupto. Aliás, Barbados tem o mesmo índice de corrupção dos EUA mesmo tendo uma fração de sua renda/capita. O mesmo acontece com a Gâmbia, que tem o mesmo índice de corrupção do Brasil mesmo tendo uma renda/capita bem menor. Por fim, a líder do ranking, a Dinamarca, tem mais ou menos a mesma renda/capita dos EUA, mas um índice de corrupção 20 pontos superior.

O que diferencia países mais ou menos corruptos, independentemente de sua renda/capita? O que fez a Coreia para melhorar o seu índice de corrupção ao longo dos anos? Essas são as questões essenciais, e não se o índice do Brasil caiu ou subiu 1 ou 2 pontos, e se perdeu x ou y posições no ranking. Esses são detalhes irrelevantes diante do fato de que o Brasil sempre esteve em uma posição vexaminosa em termos de percepção de corrupção, e pouco ou nada fizemos para melhorar essa posição. Com certeza essa percepção cobra um preço em termos de desenvolvimento econômico.

** Marcelo Guterman é engenheiro de produção pela Escola Politécnica da USP e Mestre em Economia e Finanças pelo Insper. Possui o certificado CFA – Chartered Financial Analyst. Ministrou vários cursos de finanças ao longo dos últimos 35 anos, incluindo Gestão de Investimentos no programa do MBA de Finanças do Insper. Atuou em várias multinacionais de administração de fundos de investimento nas últimas décadas, como gestor de recursos e especialista de investimentos. É autor dos livros “Finanças do Lar” e “Descomplicando o Economês".

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