A psiquiatra americana Elisabeth Kübler-Ross, em 1969, enumerou em um livro os cinco estágios pelos quais uma pessoa passa ao experimentar o luto. São eles, na seguinte ordem: negação, raiva, barganha, depressão e aceitação. Para muitos, a vitória de Luiz Inácio Lula da Silva foi um processo traumático, do qual ainda não se recuperaram. É possível ver que o triunfo petista gerou em vários indivíduos reações semelhantes à da etapa do luto – com exceção da fase da barganha.
Em primeiro lugar, veio a negação. Essas pessoas não conseguiam acreditar no que estava acontecendo e passaram a acreditar em várias teorias de conspiração. Depois, surgiu a raiva, que motivou várias brigas entre amigos com credos ideológicos diferentes. Em um terceiro momento, surgiu a depressão. Muitos estão ainda nessa fase, curtindo uma tristeza profunda por tudo o que a presidência de Lula trouxe.
O último estágio, o da aceitação, ainda está longe para alguns. Mas muita gente já assimilou o golpe e resolveu tocar a vida para frente. Quem não superou a frustração ainda está atônito, mesmo depois de mais de um ano da posse de Lula.
Mas talvez o melhor exemplo a se mirar, mesmo para os inconformados, seja o do próprio presidente. Em 2018, ele poderia ser considerado o inimigo número um da República. O país, sacudido pela Operação Lava-Jato, colocava o combate à corrupção como prioridade nacional e via o PT como um exemplo cabal de desvio dos recursos públicos – e Lula, como a figura mais expressiva do partido, personificou todos os pecados exibidos no chamado Petrolão. Nesse embalo, o petista foi preso e ficou mais de quinhentos dias encarcerado. Muitos diziam que ele estava acabado. Mas o Supremo Tribunal Federal anulou seu processo, ele foi solto, concorreu novamente à presidência e foi eleito. Em quatro anos, portanto, Lula saiu do inferno e chegou ao paraíso: hoje, está aboletado no Palácio do Planalto.
Boa parte do empresariado está desanimado com o rumo que o Brasil está tomando, especialmente no que diz respeito ao legado da Lava-Jato. Os acontecimentos recentes são de fato desanimadores: o STF cancelou as multas bilionárias que estavam sendo pagas pelos grupos J & F e Odebrecht (réus confessos e signatários de um acordo de leniência). As chances de reabilitação do ex-ministro José Dirceu são significativas – e ele pode retomar seus direitos políticos em breve. Há ainda um tempero especial nesse caldeirão: um torniquete imposto aos porta-vozes direitistas, sob o pretexto de um suposto combate às fake news (que existem e são um problema sério, diga-se).
Talvez esses empresários pudessem paradoxalmente se mirar no exemplo de Lula, que conseguiu se reerguer de um pleito para outro e voltar ao poder. O presidente se aproveitou de uma série de erros de seu oponente, Jair Bolsonaro, e conseguiu vencer por uma margem diminuta. Um recado aos empresários que hoje estão com farol baixo: se Lula conseguiu dar a volta por cima, a Direita também pode conseguir.
A esquerda tem o costume de ignorar o tema corrupção. Entre os anos 1950 e 1960, o PTB tratava a União Democrática Nacional com escárnio frequente. A razão estava no discurso de boa parte dos udenistas, que ficavam indignados com as denúncias de corrupção do governo de Juscelino Kubistchek, especialmente as relacionadas à construção de Brasília.
O lema da UDN era uma frase atribuída ao orador irlandês John Philpot Curran: “o preço da liberdade é a eterna vigilância”. Curran escreveu milhares de frases em seu tempo que poderiam ser repetidas neste Brasil de 2024, especialmente diante de várias medidas que soam como censura. “Assassinar-me você pode; mas intimidar-me você não irá”, também disse Curran. Podemos lembrar de mais uma frase do irlandês, também adequada aos dias de hoje: “o mal prospera quando os homens de bem não fazem nada”.
Voltando às fases do luto: aqueles que mais cedo aceitaram a vitória de Lula se voltaram com maior rapidez aos negócios e despejaram toda a energia em suas empresas. Precisamos lembrar que o Brasil é maior do que qualquer governo e que nossa economia é resiliente. Já resistimos a planos de estabilização sem pé nem cabeça (Cruzado e Collor) e superamos políticas econômicas sem eira nem beira (Dilma Rousseff). Lembremos: o mercado brasileiro é enorme e a capacidade de nossos empreendedores é imensa. O que necessitamos, agora, é fazer um detox de pessimismo. Apesar de enfrentarmos diariamente um governo antimercado. É difícil. Mas é melhor do que se deixar abater pela depressão.