Por que a quantidade nos produtos sempre diminui e o preço permanece o mesmo?
Tânia Rêgo/Agência Brasil
Por que a quantidade nos produtos sempre diminui e o preço permanece o mesmo?

Um fenômeno que tem se manifestado tanto dentro como fora dos supermercados está atraindo a atenção dos consumidores. Quando você realiza suas compras e nota que as embalagens estão diminuindo de tamanho, mas o valor na nota fiscal permanece o mesmo, não está sozinho nessa experiência.  Esse fenômeno se chama reduflação, que é um neologismo que soma "redução" com “ inflação ”.

“A reduflação ocorre quando a quantidade do produto diminui, mas o preço continua o mesmo (ou pelo menos não cai tanto quanto a quantidade). Por exemplo, se você pagava 10 reais por 400 gramas de um produto e agora paga os mesmos 10 reais por 350 gramas do mesmo produto, você está pagando mais caro”, diz em entrevista ao iG Fábio Gomes, economista e diretor da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FEARP-USP)

“A reduflação pode ocorrer também em virtude da redução na qualidade do produto. Em qualquer caso, se os institutos que apuram a inflação não levarem em conta mudanças como essas, a inflação será subestimada”, complementa.

“A inflação corrói o poder de compra do consumidor,  pois a quantidade de produtos e serviços que ele consegue comprar simplesmente diminui quando esses encarecem. A reduflação tem o mesmo efeito, pois o consumidor tem que comprar mais unidades do produto quando a quantidade do produto por embalagem diminui”, finaliza o economista.

Segundo o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA),  que é o índice de inflação usado no sistema de metas de inflação do Banco Central, de janeiro a agosto de 2023 a inflação acumulada é de 3,23%. Se considerarmos os últimos doze meses, desde agosto de 2023, a inflação acumulada é de 4,61%, sendo inferior à inflação de 2022, que foi 5,78%., o que leva a uma significativa diminuição do poder de compra da população, que sofreu uma redução de 30% no poder de compra ao longo dos últimos cinco anos.

“A escalada da inflação no Brasil deve-se a fatores como escassez na cadeia produtiva (ou dificuldade de comprar matéria-prima) e expectativa econômica negativa em relação ao quadro político e institucional. Se só ocorrer a redução do produto nas embalagens sem aumento de preços, não haverá impacto nenhum”, defende Renaldo Antonio Gonsalves, professor do Departamento de Ciências Atuariais da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).

O fenômeno da "reduflação" teve origem na década de 90, durante o período de hiperinflação no Brasil. Nesse contexto, as empresas identificaram esse artifício e o utilizaram de maneira abusiva. Para combater essa prática, a Lei n.º 8.078, de 11 de setembro de 1990, do Código de Defesa do Consumidor, estabeleceu a obrigatoriedade de os fabricantes informarem qualquer alteração no peso ou na quantidade do produto em suas embalagens. No entanto, não existia uma padronização nos comunicados.

A fim de regular de forma mais eficaz essa prática, a Portaria 81, de 23 de janeiro de 2002, estabeleceu normas complementares à lei. De acordo com essas normas, as mudanças nos produtos devem ser destacadas em letras maiúsculas, em negrito, com contraste de cores e em um tamanho que permita uma fácil visualização ao longo de, no mínimo, 180 dias.

As empresas possuem o direito de realizar alterações na quantidade ou nos ingredientes de seus produtos. Entretanto, a legislação brasileira estipula que é fundamental que qualquer modificação seja claramente comunicada ao consumidor, sem margem para dúvidas. Aqueles que não seguirem essa regra estarão sujeitos a penalidades financeiras, com multas que podem alcançar valores próximos a 10 milhões de reais, segundo o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (IDEC).

Conforme a lei, esse aviso de mudança deve ser feito com um prazo mínimo de seis meses, proporcionando tempo suficiente para que os consumidores identifiquem e compreendam que o produto que costumavam adquirir já não é mais o mesmo. Essa regulamentação está prevista no Código de Defesa do Consumidor e também na Portaria 392, datada de 29 de setembro de 2021, emitida pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública.

No documento, é estabelecido que as empresas devem destacar a mudança nas embalagens usando letras maiúsculas, em negrito, com cores de contraste e em tamanho visível. Entretanto, a própria Portaria apresenta uma exceção no parágrafo 2º do artigo 3º, que permite que, caso não haja espaço suficiente para incluir a declaração em uma única superfície contínua da embalagem, o fornecedor poderá mencionar apenas a alteração na quantidade do produto.

“O consumidor brasileiro não tem o hábito de boicotar as marcas, seja porque para a população de baixa renda o consumo de alguns produtos representam 'status', ou porque os que têm poder aquisitivo alto se habituam a comprar o mesmo produto sem reclamar das mudanças de peso ou volume. A solução seria boicotar as marcas que praticam a reduflação, e procurar produtos alternativos prestigiando novas marcas. Sendo assim, o equilíbrio entre poder de compra do consumidor e a reduflação da indústria se desloca a favor da indústria”, finaliza o professor.

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