A 123milhas está atualmente no centro de uma polêmica depois de informar, na última sexta-feira (18), que não vai honrar seus compromissos com os clientes e deixará de emitir passagens de viagens que deveriam acontecer entre setembro e dezembro deste ano.
As passagens em questão são da categoria "Promo", que vendia pacotes mais baratos com datas flexíveis. Este modelo também era utilizado pelo Hurb, que enfrenta forte crise e também deixou passageiros prejudicados ao cancelar viagens. Desde o ano passado, ambas as empresas recebem queixas de clientes.
Pacotes promocionais
No caso da 123milhas, a empresa anunciou que deixou de vender pacotes flexíveis na última semana, e que todas as viagens da linha com previsão de embarque entre setembro e dezembro deste ano não terão suas passagens emitidas.
O modelo de pacotes flexíveis funcionava da seguinte maneira:
- O cliente comprava a passagem aérea para determinado destino e escolhia a data de ida e volta;
- Essas datas, porém, eram flexíveis, o que significa que a 123milhas podia emitir passagens com diferença de até 24 horas, mas sempre respeitando o intervalo da viagem;
- No momento da compra, o cliente não sabia de qual aeroporto sairia, com qual companhia viajaria ou quantas conexões o voo teria;
- A 123milhas emitia as passagens até 10 dias antes da viagem.
Para exigir toda essa flexibilidade por parte dos clientes, a empresa oferecia grandes descontos, tornando o modelo atraente para quem queria viajar gastando menos.
Diferentemente da 123milhas, que cancelou o modelo de pacotes flexíveis no momento de crise, o Hurb continuou vendendo os pacotes, mesmo enquanto cancelava viagens de clientes. Em maio, a Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon) obrigou o Hurb a suspender esse modelo.
Atualmente, a companhia ainda vende pacotes flexíveis, mas com outro nome: "Pacote de Mês Fixo". Nessa categoria, os clientes do Hurb escolhem o mês da viagem, e as passagens são emitidas com 30 dias de antecedência.
A reportagem pesquisou em outras plataformas de viagens, mas não encontrou outras empresas que pratiquem o modelo.
Por que o modelo não deu certo?
As experiências de 123milhas e Hurb revelam que os modelos de pacotes flexíveis se mostraram insustentáveis. Isso porque eles são vendidos a preços muito baixos e muito tempo antes das viagens. Nesse sentido, o modelo é um risco para as empresas, que deveriam estar preparadas para lidar com mudanças de mercado - o que não aconteceu.
De acordo com a 123milhas, os cancelamentos de viagens devem-se "à persistência de fatores econômicos e de mercado adversos, entre eles, a alta pressão da demanda por voos, que mantém elevadas as tarifas mesmo em baixa temporada, e a taxa de juros elevada".
Marcelo Oliveira, assessor jurídico da Associação Brasileira de Agências de Viagens (ABAV), afirma que o que essas empresas vendem ao comercializar pacotes flexíveis é, na verdade, "o direito a uma viagem". Isso porque as companhias não emitem as passagens no ato da compra, já que ficam buscando oportunidades de encontrar opções mais baratas e, portanto, mais lucrativas.
"O modelo apresenta fragilidade por conta da movimentação do mercado. Os preços das passagens são vulneráveis a influências, como câmbio e combustível, por exemplo. Para comercializar antecipadamente esses direitos de viagens, é preciso estar muito lastreado para conseguir garantir tudo isso", afirma Marcelo.
Nesta segunda-feira (21), o secretário Nacional do Consumidor, Wadih Damous, disse que "a argumentação de que houve alteração no cenário econômico não é problema do consumidor", e que "os riscos do negócio pertencem à empresa que oferece os serviços".
Como se proteger de cancelamentos de viagens?
Apesar de, tanto no caso da 123milhas quanto do Hurb, a responsabilidade ser das empresas, Marcelo afirma que há algumas formas dos consumidores se protegerem de dores de cabeça na hora de viajar.
O assessor jurídico da ABAV orienta que, em primeiro lugar, os clientes busquem se a empresa com a qual pretendem fechar negócio tem cadastro no Ministério do Turismo, ou seja, se estão regularizadas. Para isso, é possível acessar o Cadastur e procurar pela empresa, sempre usando sua razão social, e não nome comercial.
Outra dica é analisar os preços. Marcelo afirma que é muito importante comparar valores antes de fechar uma viagem, mas sempre considerando preços próximos. Se encontrar uma oferta muito boa, destoante das demais, pesquise mais a fundo. É comum, por exemplo, que companhias aéreas façam promoções periódicas com descontos grandes; nesses casos, é seguro realizar a compra, já que a passagem será emitida no ato.
Por outro lado, se os grandes descontos forem encontrados em plataformas de viagens, é melhor pesquisar todas as condições e decidir por assumir, ou não, determinados riscos - como a flexibilidade da viagem.
Além disso, é importante pesquisar sobre a reputação das empresas em sites de reclamações, como o ReclameAqui. Se uma companhia ou modelo de pacotes tiver muitas queixas, o indicado é não realizar a compra.