Sob pressão do presidente Jair Bolsonaro (PL), a Petrobras anunciou nesta terça-feira (19) uma redução de 4,9% no preço da gasolina, a primeira no valor do produto desde dezembro do ano passado. A partir desta quarta (20), o valor médio de venda nas refinarias da estatal passará de R$ 4,06 para R$ 3,86 por litro , um corte de R$ 0,20.
Economistas calculam que esse alívio no preço pago pelas distribuidoras vai chegar a 2% para os motoristas nos postos de combustíveis, que já vêm reduzindo o preço nas bombas na maior parte dos estados nas últimas semanas com o teto para o ICMS sobre combustíveis.
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Essa redução, viabilizada por um alívio na cotação internacional do petróleo, reforça a expectativa de deflação entre julho e agosto, quando a campanha eleitoral se intensifica, puxada pelos preços de combustíveis e energia elétrica. André Braz, economista da FGV, prevê uma redução de 0,13 ponto percentual no IPCA, o índice oficial de inflação do país, em trinta dias.
O efeito contra a inflação é uma notícia que não poderia chegar em melhor hora para Bolsonaro, já que a alta do custo de vida é um dos principais responsáveis pela baixa aprovação de seu governo e um fatores que dificultam seu avanço nas pesquisas na corrida eleitoral para reduzir a vantagem do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que lidera a disputa com um discurso focado na economia.
O núcleo da campanha de Bolsonaro avalia que a gasolina pode ajudar o presidente a "virar a página" do desgaste provocado por sua reunião com embaixadores para repetir suspeitas infundadas sobre as urnas eletrônicas.
O impacto da redução da gasolina na inflação é tão importante na estratégia eleitoral de Bolsonaro que, antes mesmo do comunicado da empresa, o presidente afirmou em conversa com apoiadores que a estatal ia “começar a dar boa notícia”. Depois do anúncio da Petrobras, Bolsonaro divulgou a redução em suas redes sociais e afirmou que “brevemente” o Brasil terá uma das gasolinas “mais baratas do mundo”.
Gasolina é quase 7% do consumo das famílias
A redução surpreendeu analistas de inflação, que já começaram a revisar para baixo suas projeções para o IPCA do ano, o que eles já vinham fazendo desde a aprovação no Congresso de um limite de 17% para o ICMS, imposto estadual, cobrado sobre combustíveis, energia e transporte já havia levado economistas a reverem suas estimativas.
Segundo André Braz, economista e pesquisador do Ibre/FGV, a redução no preço da gasolina, tem efeito imediato e um peso grande no IPCA, o índice oficial de inflação. Ele estima que o corte na bomba chegue a 2%. O combustível compromete, em média, quase 7% do orçamento familiar:
"Com isso, haverá uma redução de 0,13 ponto percentual no IPCA daqui a trinta dias. O efeito máximo será percebido em agosto. Quando se olha a inflação anual, o índice deve cair da previsão atual de 7,5% para 7,4%, se for mantido o preço atual. A redução da Petrobras é mais um componente que ajuda a diminuir as tensões inflacionárias para 2022."
O J.P.Morgan revisou suas estimativas. “Agora esperamos que a inflação termine o ano em 7,4%, em vez dos 7,6% que estávamos projetando antes”, afirmaram os economistas Cassiana Fernandez e Vinícius Moreira, em relatório. O banco prevê deflação em julho e uma alta de 0,11% no IPCA de agosto.
Analistas de petróleo já vinham afirmando nos últimos dias que uma redução na gasolina era possível, já que o valor cobrado no mercado doméstico estava acima do praticado no mercado internacional. O diesel, porém, que não teve reajuste, é fator de preocupação diante do aumento da demanda no segundo semestre.
Preço da gasolina alinhado com o exterior
Segundo a Abicom, associação dos importadores, a queda de 4,9% no valor da gasolina zerou a diferença em relação ao mercado internacional. Antes do anúncio, o combustível era vendido com preço 8% maior no país. Ontem, o diesel tinha valor 3% maior no Brasil em relação ao mercado externo.
"Havia espaço para uma queda. É coerente a companhia acompanhar essa paridade. Agora, esperamos que o mesmo movimento ocorra se os preços subirem no exterior e que os valores não fiquem artificiais. Não pode a Petrobras ficar quase 100 dias sem reajuste como ocorreu esse ano. Esperamos que a empresa continue acompanhando a paridade e que essa redução não tenha sido uma ação política", afirmou Sergio Araujo, presidente da Abicom.
O atual presidente da Petrobras, Caio Paes de Andrade, é o quarto a dirigir a estatal no governo Bolsonaro. Ele chegou à estatal com a missão de segurar preços até as eleições. Embora Bolsonaro tenha tentado associar a redução no preço da gasolina à troca no comando da empresa determinada por ele, a petroleira atribuiu a decisão à estabilização da cotação internacional do petróleo, que chegou a registrar queda nos últimos dias.
Segundo o comunicado da empresa, “essa redução acompanha a evolução dos preços (do petróleo) internacionais de referência, que se estabilizaram em patamar inferior para a gasolina, e é coerente com a prática de preços da Petrobras”.
O mercado financeiro entendeu que a redução de preço já era esperada. Os papéis ordinários (com voto) da Petrobras subiram 1,12%, a R$ 31,67, e os preferenciais (sem voto) avançaram 2,03%, a R$ 29,18. Segundo analistas, pesou mais para o comportamento das ações a alta do petróleo no mercado internacional — o contrato para setembro do barril do tipo Brent subiu 1%, para US$ 107,35 —, mas o risco de interferência política segue no radar dos investidores.
"A princípio, o mercado não viu essa redução com temor por não atribuir o movimento a uma intervenção do governo. Mas vale lembrar que muita coisa ainda pode acontecer, e o mercado tem plena ciência das tentativas veladas de conter o preço do combustível por parte do presidente", disse Sidney Lima, da Top Gain.
Resposta após 'provocação' da estatal
No governo, a redução de preço foi comemorada. Integrantes do executivo e parlamentares aliados ao governo já vinham intensificando a cobrança à Petrobras por uma redução após emplacarem Paes de Andrade na presidência da empresa.
Junto com essa pressão, nos últimos dias, voltaram a crescer em Brasília as discussões sobre eventuais mudanças na Lei das Estatais, depois que o Comitê de Elegibilidade da Petrobras rejeitou duas indicações do governo para o Conselho de Administração por conflito de interesses.
Governistas do Congresso e o Palácio do Planalto viram essas rejeições como uma "provocação", mesmo que a empresa tenha seguido o que está na lei. Por isso, agora creem que a empresa deu uma resposta: tentou afastar a crise após a rejeição dos conselheiros governistas e reduziu os preços, como já vinha sendo cobrada.
O ministro de Minas e Energia, Adolfo Sachsida, também tem feito cobranças para que a estatal reduza preços e para garantir que as medidas de redução de tributos cheguem às bombas.
Para integrantes da campanha de Bolsonaro, a inflação tem sido o principal foco de problemas para a popularidade do presidente. As iniciativas aprovadas pelo Congresso nas últimas semanas antes do recesso parlamentar devem causar alívio no orçamento e no índice de preços antes das eleições.