A perspectiva de um ciclo de alta dos juros no Brasil para além de maio, quando era esperado o fim das elevações na taxa básica feitas pelo Banco Central nos últimos meses, ficou ainda mais provável para o mercado com uma declaração do chefe da autoridade monetária, Roberto Campos Neto, sobre a inflação.
A taxa básica de juros (Selic) atualmente está em 11,75% ao ano e as projeções já apontam para 13,5%.
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O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, afirmou, na segunda-feira, que o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de março, de 1.62%, a maior inflação para o mês desde 1994, surpreendeu, e afirmou que o núcleo da inflação (que retira as maiores variações de alta e de baixa do índice) está muito alto.
O IPCA de março também foi a maior taxa desde janeiro de 2003 (2,25%). Com o resultado, o IPCA acumula alta de 11,30% em 12 meses, maior índice desde outubro de 2003. O número veio acima do esperado pelo mercado e analistas já revisam as projeções de inflação e dão como certo que o Banco Central vai subir os juros numa intensidade ainda maior que a esperada no início do ano.
A convicção entre os investidores e analistas de que os juros vão subir por mais tempo só ganhou força na segunda-feira com a declaração de Campos Neto admitindo ter sido surpreendido pelo índice.
Porta aberta para alta até junho
O economista-chefe da Órama, Alexandre Espírito Santo, diz que Campos Neto deixou a porta aberta para subir os juros também em junho. Para a reunião de maio, segue a previsão de que a taxa suba para 12,75%.
Após a ata da última reunião do Comitê de Politica Monetária (Copom) de março sinalizar que o ciclo de alta de juros terminaria em maio, o mercado começou a ver aperto monetário mais curto. Mas isso mudou:
"Realmente foi um número de inflação alto e surpreendente. O mercado está pondo nos preços que o ciclo não vai se encerrar no 12,75% e, provavelmente, vai para 13,25%."
Espírito Santo lembra ainda o índice de difusão (a parcela de produtos e serviços que subiram em março) também veio alto, o que aumenta a preocupação do mercado, pela disseminação da inflação.
O economista do banco BV, Carlos Lopes, concorda:
"O IPCA como um todo, mostrou que a inflação é disseminada, que ataca vários grupos da economia. E começa a jogar uma inflação esperada para o ano que vem muito grande."
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Lopes diz que o mercado já espera um alta adicional em junho e algumas chances de elevação também em agosto. Tanto que o banco subiu de 13,25% para 13,5% a previsão para a taxa de juros.
"As expectativas do mercado (para o fim de 2023) vêm subindo. Já estamos no segundo ano de inflação acima do teto da meta. É importante ele reagir agora diante da piora das expectativas de inflação", afirmou.
O banco Credit Suisse, em relatório divulgado logo após o IPCA na semana passada, revisou os juros para 14% no fim do ciclo.
Claudia Moreno, economista do C6 Bank, porém, afirma que, a partir de agosto, qualquer subida nos juros só terá impacto em 2024, quando as previsões de inflação estão dentro da meta, por isso não seria necessário novas altas de juros:
"Acreditamos que o BC irá optar por uma última alta adicional de 100 pontos-base na reunião de maio, elevando a taxa Selic ao nível de 12,75% ao final do ciclo de aperto monetário."
‘Mais alta aqui’
Segundo Campos Neto, o BC está analisando os novos números a fim de verificar se mudará algo na análise para a tendência da inflação.
Ele disse que essa aceleração na inflação ocorreu também em outros países, em diferentes magnitudes, mas reconheceu que é um problema para o Brasil, com o agravante de que a desvalorização do real frente ao dólar vem alimentando a inflação junto com a alta dos preços internacionais das commodities agrícolas e do petróleo.
"A realidade é que nossa inflação está muito alta, o núcleo está muito alto. A gente tem comunicado com maior transparência possível nosso processo de enfrentamento a essa inflação mais alta e mais persistente", declarou Campos Neto na segunda-feira.
Dólar pode dar alívio no longo prazo
Espírito Santo acredita que a recente queda do dólar pode ajudar a retirar a pressão inflacionária, mas ressalta que isso leva tempo:
"Inflação a gente sobe de elevador e desce de escada. A queda é mais lenta, então, quando temos uma depreciação da nossa moeda, isso faz com que a inflação suba muito rápido. O inverso é um pouco mais lento. Vamos aproveitar em algum momento no tempo dessa queda do dólar, mas não será no curtíssimo prazo."