De um lado, a guerra da Ucrânia vem trazendo perdas com o aumento dos custos logísticos e de transporte por conta da alta no preços do petróleo e das commodities agrícolas. Mas, do outro, o conflito pode estimular a conquista de novos mercados e investimentos para o Brasil, um dos países emergentes que deve ser menos afetados diretamente pelo conflito, avaliaram os convidados do “E agora, Brasil?”.
Luís Rua, diretor de Mercados da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA, que reúne os produtores de aves e suínos do Brasil) destacou, durante o evento, que há oportunidades para o país ganhar espaço no mercado internacional, apesar da interrupção do comércio para a Rússia, destino de 2,5% das exportações de carne de frango do Brasil em 2021.
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"Além das complicações, há oportunidades. A Ucrânia vinha conquistando mercados da Europa e Ásia com exportações de carnes de frango e porco. Eles colocavam de oito a nove mil toneladas por meses nesses mercados. Com o fechamento dos portos na Ucrânia, o Brasil está sendo chamado para participar com maiores volumes."
Abertura de mercados
Rua destacou que, para que os exportadores aproveitem essa oportunidade, o governo precisa atuar para buscar acordos comerciais e de abertura de novos mercados:
"A avicultura tem 140 mercados abertos funcionando, e grande parte de nossa exportação está indo para a China. Exportação é uma alternativa para amenizar a situação que temos hoje, com preço alto de trigo e farelo de soja e interrupção das cadeias."
Armando Castelar, professor da FGV Direito Rio, destacou que os efeitos da guerra são limitados para a economia brasileira, comparativamente a outros países emergentes, já que o Brasil é um grande produtor de commodities. E ressaltou que, por outro lado, o Brasil poderá atrair investimentos, num cenário em que grandes indústrias tentam realocar suas cadeias de produção de forma mais local, para evitar os riscos de rupturas no fornecimento global.
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É um movimento que surgiu com a guerra comercial entre EUA e China, acentuou-se na pandemia da Covid e tende a ganhar ímpeto após o conflito na Ucrânia.
"O México está recebendo muita indústria que estava na China. A gente pode se beneficiar, mas o governo precisa melhorar o ambiente de negócios, com reforma tributária, por exemplo."
Sem conseguir repassar
Mas, apesar de o Brasil sofrer menos os impactos da guerra, a pressão de custo para a indústria é incontornável. Gustavo Theodozio, vice-presidente de investimentos e controladoria da M. Dias Branco, líder em massas e biscoitos no país e dona de marcas como Piraquê e Adria, lembrou que os preços do trigo e do farelo de soja estão nos maiores patamares em dez anos, pressionando os custos das empresas em um momento de economia fraca.
"A previsão hoje é que a economia cresça abaixo de 1%. Com a renda apertada, não conseguimos repassar. Em março, o trigo subiu quase 60%, e as empresas não conseguem repassar."
Segundo Theodozio, “da porteira para dentro”, a alternativa para a indústria é melhorar a eficiência e a produtividade. Mas o Brasil poderia ter ganhos no setor com uma redução nas barreiras à importação e incentivos a um aumento de produção. Hoje, 60% do trigo consumido no Brasil vêm da Argentina:
"Temos que olhar para a cadeia. É importante rever as barreiras de importação para vislumbrar outras opções. Se houve um problema ali, que outros países oferecem o mesmo insumo? Então, uma redução temporária de importação é outro caminho para amenizar a inflação. Pode-se ainda incentivar a produção local. O Brasil produz 8 milhões de toneladas e consome 13 milhões de toneladas de trigo. Rio Grande do Sul e Paraná produzem, mas o Brasil tem terra e é riquíssimo, pode incentivar a produção."