O cenário de guerra na Ucrânia nas últimas semanas e que tem impactado os preços no país não deve alterar a decisão do Banco Central (BC), nesta quarta-feira (16), de subir a taxa básica de juros, a Selic, para 11,75% ao ano, uma alta de 1 ponto percentual em relação à taxa atual. A expectativa consta no relatório Focus, que reúne as projeções de mercado.
Divulgado na segunda-feira, o documento mostra que o desenrolar do conflito entre Ucrânia e Rússia só deve impactar as decisões sobre juros ao longo do ano e não a desta quarta-feira. Neste sentido, o que mais tende a pesar é a inflação interna, que em fevereiro acumulou alta de 10,54% em doze meses, segundo o IPCA.
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A CM Capital não mudou sua expectativa de alta para 11,75% ao ano para a decisão do Copom desta semana. Segundo Carla Argenta, economista-chefe, o conflito é muito recente e é difícil prever o que vai acontecer para ter como base em uma decisão sobre juros.
"Antes de ocorrer um risco muito grande em que você tenha que fazer uma reversão da política monetária, é mais seguro para a instituição manter a política desenhada inicialmente", explicou.
Argenta ressalta também que o Banco Central brasileiro tem uma vantagem porque começou a subir os juros bem antes dos outros países e já está em um patamar que deve influenciar a inflação para baixo.
O Focus mostra que já há previsão de que o impacto da guerra nos preços dos combustíveis e alimentos deve elevar a inflação do ano, o que, por sua vez, impõe a necessidade de um salto maior nos juros.
Na semana passada, a expectativa era de Selic em 12,25% no fim do ano, mas já foi elevada para 12,75% ao ano. Houve também um salto na projeção de inflação de 5,65% para 6,45%.
Étore Sanchez, economista-chefe da Ativa Investimentos, passou a prever um ciclo mais intenso de alta nos juros, com a Selic em 13,25%. No entanto, para a reunião de quarta-feira a perspectiva continua sendo de elevação para 11,75%.
Sanchez aponta que o Banco Central deve manter prudência em um cenário econômico nebuloso. A expectativa do economista é que uma mudança nas decisões deve ser vista nas reuniões ao longo do ano.
"Acredito que a guerra está atribuindo um grau de imprevisibilidade muito grande para o horizonte econômico e acho que a autoridade monetária vai usar esse argumento como o ponto focal da prudência que eles deverão ter na condução da política monetária", afirmou.
A economista-chefe do Banco Inter, Rafaela Vitória, também não mudou seu cenário para os juros. A expectativa é de alta de 1 p.p na reunião de quarta-feira, mais 0,5 p.p em maio, mantendo o patamar de 12,25% até o final do ano.
Segundo a analista, o cenário complicou por conta da alta nos preços de combustíveis e alimentos, mas os juros não têm tanto efeito neste caso porque é uma inflação de oferta e não de demanda.
Ou seja, não houve um aumento de demanda por um produto escasso, mas diminuição da oferta em um cenário de manutenção da demanda.
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"A gente faz uma avaliação de que a alta é vinda de um novo choque de oferta e a política monetária tem pouco efeito sobre ela nesse momento. Principalmente nos próximos meses, a alta vai impactar a inflação de 2022, mais próxima de nós", apontou.
Rafaela Vitória ainda ressalta que haverá um elemento de risco fiscal nas próximas decisões do Copom, como as medidas que o governo vem trabalhando com o objetivo de amenizar a alta dos preços dos combustíveis.
"O governo vai fazer superávit este ano, então isso seria positivo para o BC, mas eu acho que as discussões de medidas sem contrapartidas, principalmente ferindo a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), são discussões que a gente ainda não sabe a magnitude", ressaltou.
Em um documento do setor de pesquisa macroeconômica do Santander, a avaliação é também de uma alta de 1 p.p na reunião de quarta-feira.
Esta análise considera que um ajuste para 11,75% é relevante, mas ainda mantém um espaço para que o Banco Central analise os impactos da guerra que ainda seguirão.
"Acreditamos que o comunicado do Copom vai manter os sinais de que a política monetária pode avançar ainda mais em território restritivo, com o Banco Central identificando riscos para cima (tanto fiscal como geopolítico) para a ancoragem das expectativas de inflação", aponta o documento.
Aumento de juros também nos EUA
A alta nos juros não deve se restringir o Brasil. Também nesta quarta-feira, a expectativa é que o Federal Reserve, Banco Central americano, eleve as taxas referenciais em 0,25 ponto percentual.
Autoridades do banco mantêm as taxas de juros próximas de zero desde março de 2020 para conter os efeitos da pandemia. A alta desta quarta-feira será a primeira desde 2018.
O aumento foi sinalizado pelo presidente da instituição, Jerome Powell, em depoimentos a parlamentares no Congresso americano.
A inflação nos EUA vem renovando recordes de quatro décadas nas últimas leituras. Havia o receio no mercado de que o conflito entre Rússia e Ucrânia e seus efeitos para a economia mundial pudessem acelerar o cronograma do banco.
A possibilidade foi afastada por Powell. No entanto, os agentes de mercado já esperam que ocorram várias altas de juros no ano. O último ciclo de aumento das taxas pelo Fed começou em dezembro de 2015.
"Pelo estilo do Powell de ser bem mais ponderado, acredito que ele vai dar o 0,25 ponto percentual e vai acompanhar os indicadores de inflação. Ele já está dando sinais e vai seguir com isso", disse o disse o gestor de renda variável da Western Asset, César Mikail.
Além das taxas, os investidores estarem atentos ao posicionamento do Fed sobre a redução do balanço da instituição.