Uber Eats deixou o mercado de entrega de bares e restaurantes
Divulgação/Uber
Uber Eats deixou o mercado de entrega de bares e restaurantes

A saída do Uber Eats do mercado de delivery  na terça-feira (8) deixou muitos donos de bares e restaurantes na mão. Agora, os empresários se sentem dependentes do iFood, que é a plataforma que domina o mercado.

Um exemplo é o caso de Denizard Terenzzo, de 40 anos, dono da padaria Bendita Padoca, em Campinas (SP). O empresário conta que o iFood sempre deteve seu maior fluxo dentre os aplicativos de delivery, mas que ele estava tentando inverter esse cenário.

Em alguns meses, a plataforma chegou a ser responsável por 99% dos pedidos, o que fez com que ele passasse a investir no Uber Eats. "Eu não posso colocar todos os ovos em uma cesta só. Com 99%, eu tinha que tirar de lá", comenta. E foi o que ele fez. Como as taxas praticadas pelo Uber Eats eram mais vantajosas para o seu negócio, ele começou a tentar crescer no aplicativo.

"Não se cresce da noite  para o dia, mas a gente estava tentando no Uber Eats. A gente começou a forçar um pouco mais, já estava crescendo e a tendência era crescer ainda mais", conta Denizard, que conseguiu atingir 23% dos pedidos no Uber Eats em dezembro passado. "Neste ano, a gente esperava melhorar bastante, mas fazer o que? É triste", lamenta, ao comentar a saída do aplicativo do mercado.

Agora, o empresário se vê novamente dependente do iFood. "Quanto antes a gente tiver outro player para fazer frente ao iFood, vai ser melhor. Não podemos deixar um só dominar tudo. Essa é uma preocupação que eu já tinha e, com a saída do Uber, estou com ela ainda maior", afirma o empresário.

A dependência em relação a outros aplicativos não é o único problema enfrentado por bares e restaurantes com a saída do Uber Eats do mercado. A loja de doces Delícias da Mari, em Belo Horizonte (MG), sentiu o impacto na logística.

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"A saída do Uber Eats prejudica em questão de área de entrega, porque não são todas as áreas que nosso máximo de quilometragem trabalhados na loja consegue alcançar. Coisa que na Uber Eats já conseguíamos, porque o raio de distância dos pedidos era maior, consequentemente alcançava um maior número de clientes", comenta Matheus Henrique Silva, de 21 anos, atendente da loja.

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Concorrência comprometida

Paulo Solmucci, presidente-executivo da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel), afirma que o impacto notado por Denizard e Matheus com a saída do Uber Eats do mercado é geral. "A gente acaba ficando na mão não só do iFood, mas também de qualquer outro aplicativo que você já esteja cadastrado, porque eles sabem que a gente não tem alternativa. Quem estava abaixo, como Rappi e outras, muitas vezes está aumentando seus preços porque sabem que a gente vai precisar. É uma situação muito ruim para o setor", diz.

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Se antes o domínio do iFood era grande, a situação ficou ainda mais grave com o fim do Uber Eats, que era vice-líder. É por isso que a Abrasel está reforçando o pedido para que o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) impeça que plataformas de delivery firmem contratos de exclusividade com restaurantes. "Essa é uma barreira importante que tem que ser derrubada, porque distorce a concorrência tanto de plataformas quanto de restaurantes", afirma Paulo.

As práticas do iFood, inclusive, foram os motivos pelos quais o Uber Eats deixou o mercado nacional. Quando anunciou a mudança, em janeiro deste ano, a Uber afirmou apenas que se tratava de uma estratégia de negócios. No início de março, porém, a companhia entrou com uma manifestação contra o iFood no Cade.

"Infelizmente, as barreiras artificiais impostas pelo iFood com sua conduta exclusionária contribuíram para a decisão da Uber de encerrar as operações do aplicativo de intermediação de delivery de refeições Uber Eats", disseram os advogados da Uber na manifestação. "As evidências claramente mostram que o iFood utiliza seu poder de mercado para abusivamente impor cláusulas de exclusividade e outras condições comerciais desproporcionais em seus contratos com restaurantes parceiros", continuam.

Na terça-feira, em depoimento à CPI dos Aplicativos, realizada pela Câmara Municipal de São Paulo, os advogados da Uber voltaram a dizer que a saída do Uber Eats do Brasil fez parte de uma "mudança de estratégia global".

Procurado pela reportagem, o iFood disse que "não comenta decisões de negócio de outras empresas". "Com relação ao mercado de entrega de refeições, o iFood esclarece que o setor de delivery online segue em constante evolução com a entrada frequente de novos competidores e o surgimento de novos modelos de negócios. Essa competição intensa favorece restaurantes, entregadores e consumidores, e promove mais inovação para todo o ecossistema", afirmou a empresa, em nota. Rappi e Uber foram procurados para comentar o tema, mas não responderam até a publicação desta matéria.

Para a Abrasel, a solução para criar uma maior competitividade no mercado de delivery é o Open Delivery, projeto que visa utilizar um padrão único para plataformas de entregas. Assim, um restaurante pode se cadastrar em várias ao mesmo tempo, recebendo os pedidos por um único canal. "A gente quer ampliar a concorrência e reduzir a ineficiência do setor", afirma Paulo.

Segundo o presidente-executivo da Abrasel, a novidade pode resolver o problema de empresários como Denizard, que gostaria que sua padaria estivesse presente em mais plataformas, mas ainda não encontrou outras soluções disponíveis em sua cidade.

"Com o open delivery, os aplicativos pequenos ganham espaço, porque eles não precisam fazer investimento para conversar com todos os restaurantes. Nós temos pelo menos duas dezenas de plataformas novas que estão só aguardando um ambiente mais favorável. O que elas estão esperando é que a facilidade de negociar se amplie de maneira que elas possam ganhar velocidade e competir com o gigante que é o iFood. A gente acredita que a concorrência vai crescer", afirma Paulo.

** Dimítria Coutinho atua cobrindo tecnologia há cinco anos, se dedicando também a assuntos econômicos. Antes de trabalhar no iG, era repórter do Ada, um portal de tecnologia voltado para o público feminino. É jornalista formada pela Universidade de São Paulo com passagem pelo Instituto Politécnico de Lisboa.

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