O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central divulga nesta quarta-feira o reajuste da taxa básica de juros, a Selic , como medida para tentar conter a inflação, que já ultrapassa 10% em 12 meses. No entanto, economistas temem que o desajuste nas contas públicas do país acabe levando a um cenário de dominância fiscal, em que as políticas monetárias deixam de surtir efeito no controle dos preços.
Neste momento, a avaliação é que o aumento da Selic é necessário e importante para manter a inflação sob controle. Mas os economistas alertam que é preciso que o governo se esforce para manter os gastos dentro do teto e para sinalizar ao mercado que a responsabilidade fiscal é uma prioridade. Caso contrário, a confiança dos investidores pode se deteriorar.
Em circunstâncias normais, a elevação dos juros reduz o consumo e, portanto, a demanda, fazendo com que haja menos espaço para que os preços subam. Além disso, aumenta a confiança do mercado na política monetária do país, valorizando o câmbio e fazendo com que haja mais investimentos.
Porém, em um cenário de aumento da dívida pública, como o que ocorre neste momento no Brasil, juros mais altos prejudicam a capacidade do governo de honrar com seus compromissos.
"Numa situação de dominância fiscal, a alta da Selic provoca piora da inflação. O mercado começa a acreditar que o Tesouro não vai conseguir pagar os juros da dívida, e aí os investimentos saem do país, o câmbio se deprecia. É quando a política monetária passa a não funcionar mais", explica Marilia Fontes, sócia-fundadora da Nord Research.
Além disso, um patamar de juros mais altos em meio a desemprego elevado e inflação faz com que haja menos investimentos privados, reduzindo o crescimento econômico do país. É o que se chama de estagflação.
Em relatório divulgado nesta semana, o Itaú já projetou recessão moderada para o ano que vem. O banco revisou as expectativas de crescimento para o país, passando de alta de 0,5% para queda de 0,5% no Produto Interno Bruto (PIB) em 2022.
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No mesmo documento, o banco aponta que o aumento dos gastos fiscais do país, com fatores como o programa Auxílio Brasil no valor mínimo de R$ 400, "aumentaram as dúvidas sobre o futuro do arcabouço fiscal no Brasil, que desde 2016 tem sido baseado em um teto de gastos ajustável".
"Embora a discussão sobre dominância fiscal pareça exagerada no momento, é verdade que, sem uma âncora fiscal crível, a tarefa do banco central de manter a inflação na meta se torna mais difícil", alerta o relatório do Itaú.
Marilia Fontes, da Nord Research, afirma que apesar de o Brasil ainda não ter atingido o cenário de dominância fiscal, as sinalizações do governo no sentido de flexibilizar o teto de gastos fazem com que o país se aproxime cada vez mais desse horizonte.
O mesmo ocorre com a estagflação, que segundo Alvaro Bandeira, economista-chefe do banco digital Modalmais, "não está muito longe".
"A inflação já está em 10,34%, e já se começa a falar em IPCA de 11%, 11,5%, para o final deste ciclo no início de 2022. A expectativa para o ano que vem só faz aumentar, enquanto o centro da meta de inflação do BC é de 3,5%. Algumas casas estão considerando recessão com inflação acima de 5,5% para o próximo ano", explica Bandeira.
Para os analistas, a única forma de evitar um cenário de dominância fiscal e estagflação é através do equilíbrio das contas públicas.
O economista do Modalmais acredita que o governo deveria reduzir os gastos e realizar privatizações para gerar receitas imediatas para reduzir o endividamento.
Já Marilia Fontes avalia que é necessário fazer uma política fiscal restritiva e dar andamento às reformas estruturantes. Ela ressalta, porém, que as reformas do Imposto de Renda e administrativa, que tramitam no Congresso, não seriam suficientes.
"A reforma administrativa não ajuda tanto, é um gasto marginal. E a do Imposto de Renda já perdeu a tributação sobre os dividendos, que é algo que poderia ajudar. Mas fazer uma reforma com potencial de redução de despesas, neste momento pré-eleitoral, é praticamente impossível. É muito importante então que o governo não flexibilize o teto de gastos e mostre para o mercado que a âncora fiscal permanece."