A aprovação do atual texto da reforma administrativa , enviado pelo governo federal ao Congresso Nacional na última quinta-feira (3), pode afetar as regras para aprovados em concurso que ainda não assumiram os cargos.
Dentre as propostas previstas na reforma administrativa , está o fim da estabilidade para os novos servidores, com exceção daqueles em cargos típicos de estado, ou seja, dos que têm equivalência na iniciativa privada, por exemplo área militar e diplomacia. O argumento é aumentar a eficiência da máquina pública.
O especialista em gestão pública e empresarial, Antônio Batist, explica que, independentemente do período de realização do concurso , qualquer pessoa que não tenha tomado posse da função pode ser alcançada:
"O candidato não é servidor público antes de assinar o documento de posse. Porém, acredito que o texto precisa ser alterado para se tornar mais claro", defende.
O advogado especialista em administração pública, Hebert Borges, avalia que isso pode provocar uma corrida aos tribunais para reivindicar o enquadramento nas regras anteriores.
"Os concurseiros podem alegar que era um direito adquirido, já que se submeteram a um edital publicado antes", opina.
O professor de Direito Público da Universidade Federal Fluminense, Luiz Jungstedt, no entanto, combate a ideia. Segundo ele, no serviço público, há direito adquirido em relação ao regime, mas não às regras do mesmo.
"O Estado não pode falar que o estatutário virou celetista, mas pode alterar sim as regras a qualquer momento, e o servidor terá que se adaptar. Por exemplo, quando entrei na UFF, recebia o pagamento de anuênio. O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso retirou isso e não fez nada de errado", argumentou. "O gasto com servidor chegou a um nível insuportável. Nós precisamos fazer uma reforma realmente. Só que é preciso acontecer da maneira correta e não como está sendo proposto", diz.
O especialista em concursos, Paulo Estrella, sugere que as mudanças podem causar desinteresse pela carreira pública. Ele alega que a aprovação exige, na maioria das vezes, anos de estudo e esforço, e que a principal contrapartida, que é a estabilidade, deixará de ser oferecida como garantia.
"Acho que não será muito relevante para os que já foram aprovados em concursos porque creio que a reforma demorará para sair do papel. O maior problema é para quem estava pensando em iniciar os estudos", diz ele. "Existem alguns benefícios que foram tirados no passado, mas a estabilidade tem impacto maior. O que era um emprego definitivo passa a ser risco de um futuro desemprego", explica.
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Mudanças insuficientes
Para ter efetividade, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 32/2020 precisa ser aprovada em dois turnos pela Câmara dos Deputados e pelo Senado.
O texto prevê o fim do regime jurídico da união, que dará lugar a cinco possibilidades de contratações; substitui o estágio probatório pelo vínculo de experiência; veda férias em período superior a 30 dias para um ano trabalhado, além de licença-prêmio, aumentos retroativos, indenização por substituição não efetiva, redução de jornada sem redução de salário, incorporação de valores relativos a cargos ou funções, aposentadoria compulsória como modalidade de punição e promoções exclusivamente por tempo de serviço.
Para o professor de Direito Público da UFF, Luiz Jungstedt, a reforma proposta é pífia e não aliviará o orçamento do país, já que o magistrado foi deixado de fora:
"O pagamento fora do teto é o que quebra a máquina. Com essa proposta, quem serão afetadas são as carreiras de administração direta e indireta do poder executivo, como servidores de ministérios, médicos, professores", expõe.
O especialista em gestão pública Antonio Batist concorda e afirma que é preciso sugerir mudanças para os servidores que têm as melhores remunerações:
"O estado brasileiro é muito caro. A questão são os penduricalhos, benefícios e gratificações que custam dinheiro e não compõem salário. Por isso, não contam para efeito do teto. Isso é, uma pessoa pode ganhar R$ 39 mil de salário e ainda receber, por fora, uma quantia enorme".
Jungstedt alerta para outros problemas do texto, como propostas vazias e repetitivas:
"Não conheço uma categoria funcional que tenha mais de 30 dias de férias. Quem tem esse benefício são os servidores que não estão sendo afetados. Há ainda coisas que não se justificam, como dizer que o comissionado vai se aposentar pelo regime geral da constituição... isso já está na constituição!", diz.
O professor também critica a criação do vínculo de experiência, afirmando que a medida desrespeita o princípio da impessoalidade. Por não ter assinado ainda a posse, o candidato estaria sujeito a pressões políticas, além de ficar mais suscetível a sofrer diversos tipos de assédio. No estágio probatório, por sua vez, fase em que o candidato já é servidor, se for avaliado negativamente, pode questionar e entrar com processo administrativo.
"Voltar ao estágio experimental é desrespeitoso. Imagina que o candidato é alguém que o avaliador não goste. Ele pode dar uma nota baixa e fica por isso mesmo. Já no estágio probatório, ele precisaria argumentar porque a pessoa não correspondeu às expectativas", explica.