O Senado Federal aprovou nesta quinta-feira um projeto que coloca um teto de 30% ao ano nos juros do cartão de crédito rotativo e no cheque especial até o fim de 2020. Os senadores ainda votarão as emendas. Depois disso, o texto segue para apreciação da Câmara dos Deputados.
A redução para 30% ao ano é significativa na comparação com as taxas de juros atualmente praticadas pelos bancos. No mês de junho, a taxa média anual do cheque especial foi de 110,2%, enquanto no cartão rotativo (quando o cliente não paga o valor integral da fatura até a data de vencimento) foi de 300,3%. As duas modalidades são as mais caras do mercado e são consideradas de uso emergencial.
O projeto estabelece que a instituição que não cumprir o teto cometerá crime de usura, que tem pena de seis meses a dois anos de prisão e pagamento de multa. Além disso, as instituições deverão manter os limites de crédito que estavam disponíveis para os clientes no dia 20 de março.
O líder do governo no Senado, Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), criticou a proposta. Segundo ele, se aprovada, ela causaria aumento de juros em outras modalidades de crédito.
"Ao estabelecer um limite, a instituição financeira não poderá precificar corretamente o risco do crédito e tenderá a não conceder para tomadores com elevado risco. Os cartões de crédito hoje são importantíssimos para o comércio varejista. Tenho absoluta certeza que isso vai representar uma restrição a recuperação da atividade econômica do varejo brasileiro", defendeu o líder do governo.
O autor da proposta, senador Álvaro Dias (Podemos-PR), defendeu o texto e disse que o teto não era um tabelamento de preços. Ele afirmou que a competição no setor bancário poderia continuar, mas abaixo dos 30%.
"Estamos legislando apenas para o período da pandemia. Os bancos continuarão lucrando, continuarão lucrando bem com a taxa de 30% ao ano. Nós tiraremos da armadilha aqueles que hoje se afundam endividando-se com cartão de crédito e depois não têm condições de sair dessa armadilha", disse o senador do Podemos.
O presidente da Câmara, deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), já disse ser contra o tabelamento, mas criticou as taxas de juros praticadas nas duas modalidades e defendeu o fim ou reformatação do cheque especial . A análise da consultoria Arko Advice aponta que o projeto não avançará na Casa.
Bancos são contra
O setor bancário, fintechs e o governo são contrários à proposta. A Federação Brasileira de Bancos (Febraban) afirma que um tabelamento das taxas traz distorções de preços e tem efeitos negativos ao ambiente de negócios e nos investimentos no país.
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As fintechs receberam um tratamento diferente e terão um limite de 35% em ambas as modalidades. Da mesma forma, elas alegam que o teto vai obrigá-las a reajustar o modelo de negócios. Uma das alterações possíveis seria a cobrança de tarifas em serviços que atualmente são gratuitos.
Em um parecer do Ministério da Economia, o governo também fez críticas ao projeto. O documento aponta que o teto das taxas do cheque especial e do rotativo pode causar aumento em outras linhas de crédito como uma forma de compensar as perdas causadas pelo limite imposto pela lei. Além disso, também poderia fazer com que as instituições "simplesmente não oferecessem tais opções de crédito".
"A Secretaria de Advocacia da Concorrência e Competitividade entende que obrigar as instituições financeiras a conceder crédito em operações tabeladas pelo Governo Federal trará impactos negativos ao ambiente concorrencial, inibindo pequenos bancos com custo de captação mais alto a participar nesse mercado. Com efeito, uma vez que as taxas das operações seriam tabeladas e iguais para todos os concorrentes, seriam beneficiados os grandes bancos dominantes, que têm custos de captação inferiores aos dos concorrentes menores - especialmente em uma situação de crise como a que atualmente passamos".
Outras mudanças
O projeto também estabelece outras alterações no sentido de baratear o custo do crédito . Por exemplo, as operadoras também não poderão reduzir os limites de crédito que já estavam disponíveis até o último dia 19 de março antes do término do estado de calamidade pública.
O projeto isenta de Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) os empréstimos relativos às linhas de crédito sob pena de enquadramento previsto em lei, com punições que podem ir de seis meses a dois anos de detenção, além de pagamento de multa.
O texto também proíbe que as operadoras cobrem multas e juros por atraso no pagamento das prestações de operações de crédito concedidas por bancos públicos e privados e no pagamento de compras diretas de produtos e serviços durante e período.
As prestações que não puderem ser pagas poderão ser "convertidas em prestações extras, com vencimentos em meses subsequentes à data de vencimento da última prestação prevista para o financiamento, sem qualquer adição de cláusula penal ou juros". Essas regras somente valerão para pessoas que tiverem redução de renda comprovada.
O texto do relator também determina que as instituições financeiras comuniquem os clientes que estejam endividados com cheque especial ou no juro rotativo do cartão de crédito que há a possibilidade de juros mais baixos.
O Banco Central e o Sistema Nacional de Defesa do Consumidor serão obrigados a publicar determinações complementares para "garantir o direito à informação do consumidor, além de realizar a fiscalização das disposições", além de poder aplicar sanções às operadoras.