A crise da Covid-19 promete causar um impacto sem precedentes na economia global. Alguns países, como França e Inglaterra, já projetam a maior recessão desde o fim da Segunda Guerra Mundial; e o Brasil não deverá ficar de fora.
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Todos os modelos de negócio precisam de adaptações rápidas para evitar fechar as portas nos próximos meses. Principalmente bares e restaurantes, que dependem tanto da presença das pessoas.
De acordo com Percival Maricato, presidente da Abrasel-SP (Associação Brasileira de Bares e Restaurantes), mais de 15% dos trabalhadores do setor já foram demitidos . A recuperação da crise poderá durar até um ano e meio, no cenário mais pessimista. “Certamente, teremos recessão na saída desta pandemia”, lamenta.
A reportagem do Brasil Econômico conversou com proprietários de bares e restaurantes de São Paulo e do Rio de Janeiro para entender o que vem sendo feito em termos de reinvenção para superar este momento difícil
Um novo portal para restaurantes
O chef Thiago Bañares é sócio proprietário do Tan Tan Noodle Bar, em Pinheiros (SP). Até o começo da quarentena, o restaurante não operava com delivery , serviço que começou a funcionar pelo Rappi no dia 31 de março. “No momento, tenho um terço dos funcionários trabalhando. Estou segurando o salário de todo mundo, ninguém está de férias. Vou evitar ao máximo fazer suspensão’, conta o empresário.
De acordo com Bañares, ainda não é possível mensurar a redução nas operações do restaurante. “Se o delivery continuar do jeito que espero, vai me ajudar a segurar a onda até passar o caos”, afirma. “A crise jogou todo mundo num poço, onde as pessoas estão arranhando as paredes para sair”.
Pensando em ajudar não apenas o Tan Tan, mas também outros estabelecimentos, Bañares se reuniu com outros dois amigos para criar a plataforma Como Pedir. “A ideia é ajudar os lugares que não faziam entrega e não estavam nas grandes plataformas”.
“Meu amigo Zambrano mora em Nova York. Estávamos conversando sobre o que os restaurantes de lá estão fazendo para sobreviver à crise”, afirma Bañares. No momento de publicação desta matéria, Nova York é a cidade mais afetada pela Covid-19 nos Estados Unidos, sendo o atual epicentro do novo coronavírus no mundo.
“Nos juntamos com nosso amigo Kato, que é fotógrafo, para criar um portal, um celeiro, onde é possível compartilhar informações sobre restaurantes. Assim nasceu o Como Pedir . Nossa intenção não é ajudar apenas os restaurantes, mas também fornecedores e distribuidores”, diz o empresário.
O site do Como Pedir funciona de forma simples, e conta com a inscrição de restaurantes, fornecedores e distribuidores de mais de dez estados. Basta selecionar sua localização para que os restaurantes inscritos na região sejam mostrados. Clicando em cada um, o consumidor será direcionado para a página de serviços do estabelecimento. É possível fazer o pedido diretamente do site.
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Contra a maré e taxas altas
Quem ainda não está nas principais plataformas de entrega precisa improvisar. É o caso de Izabel Craveiro, sócia-proprietária do restaurante La Violetera, da Barra da Tijuca (RJ). “Optamos por férias coletivas aos nossos funcionários a partir do dia 2 de abril. Fizemos isso por senso de responsabilidade com os colaboradores e suas famílias”, diz a empresária.
Antes da pandemia, o La Violetera servia a média de 80 pratos diários (entre executivos, pratos feitos e especialidades da casa). Ao menos no início da pandemia, o volume diário caiu para 20 pratos uma queda de 75% no número de refeições. “Estamos fazendo um horário reduzido, das 11h às 15h, e trabalhando com pedidos para viagem”, diz a empresária.
Com a possibilidade de uma quarentena duradoura, os aplicativos de delivery já entraram no radar dos sócios. “Estamos pensando sobre as plataformas. A maior questão é em relação às taxas . Somos um restaurante de bairro, e as mensalidades e tarifas em cima de cada pedido são altas para pequenos comércios, como é o nosso caso”, afirma.
Mudanças radicais no trabalho
Alguns bares precisaram mudar totalmente a maneira como operam. É o caso do Mundano Bar, de Perdizes (SP), do empresário Rodrigo Basler. Dos quatro funcionários, dois estão afastados, e a esposa do dono passou a ajudar em alguns horários.
“Em situações normais, o bar funcionava apenas de terça a sábado, durante a noite. Não tínhamos nem almoço, apenas um grelhado que realizamos nos fins de semana”, conta o empresário. “Hoje precisei inserir um cardápio de almoço que não existia anteriormente. Eu mesmo estou fazendo uma porrada de entregas. Estamos no iFood, mas o volume ainda é baixo”.
A primeira iniciativa tomada pela administração do Mundano Bar, ainda na semana de declaração da pandemia, foi desovar o estoque de chopps e vinhos. “Divulgamos muito no Instagram, Whatsapp, grupos do Facebook. Foi super rápido. Vendemos em garrafas pet , justamente pela praticidade, mas também operamos com growlers”, conta Basler.
Mesmo com os números positivos no começo da quarentena, Rodrigo já percebe queda acentuada na renda. “Dá para dizer que o consumo de chopp caiu ao menos 50% com o início da quarentena”, lamenta o empresário.
Ações do governo
Os três empresários concordam que pouco foi feito para socorrer os restaurantes. “Nada muito significativo foi proposto pelo governo. Houve uma mobilização dos sindicatos para parcelamento de férias e contratos, mas nada que resolva o lado do restaurante. Precisamos de alterações fiscais e tributárias para poder tocar o negócio”, diz Thiago Bañares, do Tan Tan Noodle Bar.
“Na parte de mão de obra, as pessoas deveriam ter um apoio do governo para se manterem afastadas e a carga não ficar tão pesada na iniciativa privada”, acrescenta.
“Entendemos que é preciso da participação do Governo para a aprovação de algumas medidas, como a suspensão das obrigações de pagamentos de impostos pelos próximos 90 dias e a criação de uma linha de crédito acessível, pelo menos”, conta Izabel Craveiro, do La Violetera.
“A ajuda é muito necessária para que não ocorra demissão em massa no setor. Isso vale para comércios alimentícios de todos os portes”, afirma Izabel
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“Em relação aos funcionários, se o governo pudesse bancar uma parte de quem estiver afastado, seria o ideal para aliviar um pouco a folha”, diz Rodrigo Basler, do Mundano Bar.