Na sua última reunião, o Comitê de Política Monetária (o Copom) do Banco Central do Brasil (BCB) decidiu, em uma escolha dividida, por um corte de 0,25 ponto percentual, o que levou a taxa de juros básica da economia, a taxa Selic, a 10,5% ao ano. A mudança no ritmo de cortes (de meio ponto percentual em cada reunião para 0,25 ponto percentual na última) foi, em alguma medida, sinalizada pela entidade monetária , ainda que, naturalmente, houvesse dúvida se ela iria mesmo se materializar. Isso pode impactar os cenários para o nível final da taxa Selic nesse ciclo de cortes. Como tenho sinalizado aqui e nas minhas redes sociais, eu tenho dificuldades em “comprar” o cenário de inflação do mercado (ainda acredito ser pouco provável uma inflação abaixo de 4% em 2024), portanto, imaginar que a Selic terminal será, agora, superior à projeção mediana anterior, não chega a ser uma surpresa. Mas gostaria de atualizar algumas contas com vocês.
Na coluna intitulada “O Banco Central não consegue ver estrelas” , abordei como o conceito de taxa de juros real natural (ou taxa de juros neutra) pode nos ajudar a balizar o horizonte para a política monetária. Nela, comentei sobre o box do Relatório Trimestral de Inflação do BCB (Taxas de juros neutras: evidência internacional) que contém uma estimativa para o Brasil de 4,5% ao ano. Vou seguir com ela. Agora, vamos às atualizações: a (meta da) taxa de juros nominal está em 10,5% ao ano e a projeção mediana do último Relatório Focus para a inflação em 12 mesesé de 3,6%. Ou seja, a taxa de juros real está, por ora, em 6,7% ao ano, acima, portanto, do seu nível natural.
Há espaço para mais reduções? Vamos verificar.
A (expectativa de) inflação ainda se encontra acima da meta, o que implica que a taxa de juros deve seguir acima da neutra. No texto supracitado, fiz dois cenários: taxa real 1,5 ponto percentual (ou 1 ponto percentual) acima da meta. Dadas as expectativas para a inflação em 12 meses, isso implicaria em uma Selic terminal entre 9,5%-10% (acima do intervalo de 9,25%-9,75% no texto anterior). Há quatro semanas, o mesmo relatório Focus trazia uma expectativa mediana de Selic para 2024 de 9% ao ano. Eu já me encontrava, portanto, com uma expectativa superior à divulgada no relatório do BCB. Hoje, a mediana das projeções é de 9,63%, compatível com os meus cálculos nesta coluna. Deve parar por aí? Eu acho que não. Eu acredito que haverá convergência das projeções para um valor maior.
A taxa de juros nominal no fim do ciclo será, portanto, significativamente superior àquela que o mercado esperava há um mês. Podemos concluir que o ambiente econômico mudou nessas quatro semanas? Ou será que a alteração foi mais por parte de um grupo de analistas que, finalmente, aceitaram que ele era diferente do que projetavam? Seja como for, o fim do ciclo está mais próximo do que o mercado há pouco imaginava.