João Ricardo Costa Filho

O que realmente sustenta o crescimento do Brasil?

Desde 2020, somos sustentados por aumentos transitórios de produtividade

Foto: Sophia Bernardes
O que realmente sustenta o crescimento do Brasil?


O ano de 2023 foi um ano de surpresas no que diz respeito a atividade econômica no Brasil. Ao considerarmos a mediana das expectativas coletadas semanalmente pelo  Banco Central do Brasil no dia 30 de dezembro do ano passado, esperava-se um crescimento de 0,8% frente à 2022. Passados quase seis meses, a expectativa já era de 2,14% e na última leitura (em 15/12), 2,92%.

Do ponto de vista da oferta dos bens e serviços, há, fundamentalmente, duas formas de aumentar a produção: fazer mais com mais, isto é, utilizar mais fatores de produção (como, por exemplo, mais trabalhadores e mais capital). Alternativamente, pode-se fazer mais com menos. Em outras palavras, podemos ser mais eficientes nos usos desses fatores de, ou seja, mais produtivos.


Não bastasse a distinção anterior, ainda temos duas possibilidades quando se fala em aumentos de produtividade. Novas práticas podem impactar a tendência de longo prazo da produtividade, o que vou chamar de alterações (ou choques) permanentes. Mas isso não vale para todas elas. Em alguns casos, a influência se dá apenas na taxa de crescimento em um período específico e acabam sendo, portanto, transitórias.

Utilizei o arcabouço do artigo “Emerging Market Business Cycles: The Cycle is the Trend” (“Ciclos de negócios de mercados emergentes: o ciclo é a tendência”, em tradução livre), publicado por Mark Aguiar e Gita Gopinath no Journal of Political Economy em 2007 para estimar a dinâmica da produtividade considerando as duas possibilidades mencionadas no parágrafo anterior.

O gráfico abaixo sintetiza os resultados do exercício. Nele, considerei a contribuição estimada em pontos percentuais para a taxa de crescimento trimestral do PIB desde o primeiro trimestre de 2020. Podemos notar que os chamados choques transitórios se sobrepõem aos permanentes. Ao olharmos o comportamento do PIB neste, os dois primeiros trimestres foram muito influenciados por fatores que não alteraram tendencialmente a nossa economia, apenas de maneira conjuntural (até tivemos uma ligeira alteração na tendência no terceiro trimestre, mas considero prudente aguardarmos mais dados para confirmar esse resultado que ainda é muito preliminar).

Foto: Divulgação
Decomposição do crescimento do PIB trimestral


O que isso significa?

Acredito que esse resultado corrobora com a ideia de que houve uma reversão recente dos entraves na produção que atrapalhavam a economia brasileira, como abordei aqui . Mas o que mais me chama a atenção é que essas estimativas indicam que talvez o crescimento potencial do Brasil não tenha se alterado significativamente nos últimos anos (ao menos para cima). É possível que ele ainda esteja entre 1,5-2% ao ano, ou seja, segue sofrível (ou desesperador, como escrevi nesta coluna ).

Na verdade, pensando na dinâmica de longo prazo, se olharmos os sinais dos choques permanentes, eles foram quase exclusivamente negativos desde 2020. Portanto, com base nos resultados do modelo, fico um pouco cético em acreditar que após um evento como a pandemia, que impacta profundamente a nossa economia ao forçar falências que não ocorreriam em situações normais e jogar na pobreza pessoas que dificilmente sairão dela, para ficar apenas em dois exemplos, a nossa economia tenha encontrado o segredo para crescer sistematicamente mais do que antes do episódio. Não parece ser o caso. Desde 2020, somos sustentados por aumentos transitórios de produtividade. Estruturalmente, só pioramos. Teremos muito trabalho à frente se quisermos mudar essa situação.