No último dia 30 de junho, foi celebrado o dia mundial de enfrentamento ao tráfico de pessoas. Milhares de vítimas em situação de vulnerabilidade social, seduzidas pela promessa de uma vida melhor, são atraídas para os mais variados destinos e acabam capturadas pelos tentáculos de organizações criminosas, as quais as reduzem à condição análoga a de escravo e lucram com seu trabalho forçado. Depois do tráfico de armas e de drogas, é o terceiro mercado ilícito mais rentável: tratar o ser humano como mercadoria.
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![Seduzidas por promessas de condições melhores, milhares de pessoas acabam se tornando vítimas do trabalho escravo Seduzidas por promessas de condições melhores, milhares de pessoas acabam se tornando vítimas do trabalho escravo](https://i0.statig.com.br/bancodeimagens/e0/zd/ba/e0zdbaxgx4d48mawfjqq0yvym.jpg)
O trabalho escravo , quando empregado criminosamente na cadeia de fornecimento dentro de uma relação de consumo, faz surgir em todos órgãos que integram o Sistema Nacional de Defesa do Consumidor, o dever de agir com eficiência e eficácia com vistas a combater tal prática nociva ao mercado e, mais ainda, à dignidade da pessoa humana.
Toda atividade empresarial inserida na relação de consumo é economicamente organizada e desenvolvida para atender o consumidor como destinatário final, de maneira que este, ao final, remunere o produto ou serviço e mantenha a viabilidade financeira de toda a cadeia de produção.
Embora ausente a responsabilidade criminal do consumidor, diante da ausência de nexo subjetivo (dolo ou culpa) ou objetivo (causalidade), está presente a responsabilidade social , ou co-culpabilidade.
O consumidor não tem a intenção de escravizar ninguém (dolo), nem concorre para isso mediante negligência, imprudência ou imperícia (culpa), ao menos em um nível que desperte a relevância penal de sua participação, mas com certeza ajuda a manter em funcionamento a cadeia produtiva viciada e ilegal.
O fornecedor desonesto, ao burlar regras legais e humanitárias em sua rede de produção, explorando a dignidade humana em seu grau mais baixo, a escravidão, de fato consegue oferecer seu produto ou serviço a um preço mais competitivo, mas a um custo social e humano absolutamente desproporcional e injustificável. Ao tomar conhecimento dessa realidade, é responsabilidade social denunciar e compartilhar nas redes sociais o mau fornecedor e deixar de consumir o bem produzido de tão degradante modo.
O problema é que nem sempre essa realidade chega ao conhecimento do consumidor, já que este é reconhecidamente a parte vulnerável na relação de consumo e, como tal, desconhece as etapas de criação, desenvolvimento e produção de determinado produto ou serviço (vulnerabilidade técnica). Assim, seu intuito é o de satisfazer seu desejo de consumo, e não o de financiar um crime.
Existem estruturas administrativas no governo federal e estadual que tem por finalidade investigar o desrespeito à legislação trabalhista e criminal quando envolvam trabalho escravo.
Ao Procon e demais órgão do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor incumbe fazer a sua parte e orientar o consumidor a evitar tais relações de consumo, multar o fornecedor criminoso e interditar administrativamente sua atividade, conforme previsto no art. 56 do Código de Defesa do Consumidor, bem como o de fiscalizar toda a produção, nos termos do art. 55, parágrafo primeiro, do mesmo Diploma.
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Um dos direitos básicos do consumidor é a coibição eficiente dos abusos praticados no mercado de consumo (art. 4º, VI, CDC). Aos Procons só resta cumprir a missão que a lei e a Constituição Federal lhe incumbiram, e a todos nós, como seres dotados de razão e dignidade, cooperarmos levando tais situações degradantes ao conhecimento das autoridades e órgãos de proteção ao consumo.