O aumento expressivo nos preços das carnes nos Estados Unidos vem chamando a atenção de consumidores e provocando reclamações nas redes sociais. Brasileiras que vivem no país relatam que a alta, impulsionada pelo chamado “tarifaço” do presidente Donald Trump , já chegou à mesa das famílias.
A influenciadora Vivian Ellsworth, que mora na Flórida, contou que se assustou ao ir ao supermercado Publix em busca de carne para a semana.
“Eu vim aqui no Publix comprar uma ‘carnezinha’ para a semana e estou para cair para trás: um pedaço de carne, 41 dólares! Gente, a crise chegou nos Estados Unidos. As asinhas de frango, esse pacote a gente pagava 6 dólares, no máximo 10 dólares. Agora está 20 dólares!”, lamentou em suas redes sociais.
Em Nova Iorque, Elizabete Saboia fez relato semelhante. Em vídeo publicado em suas redes, mostrou a etiqueta de uma bandeja com quatro pedaços de costela bovina:
“O preço das carnes aqui nos Estados Unidos está um absurdo! Há um mês você comprava por 9 dólares. Hoje está 17,47 dólares.”
A alta não é fruto apenas da inflação ou de problemas internos de abastecimento nos EUA. Dados da DatamarNews mostram que, entre abril e julho de 2025, as exportações brasileiras de carne bovina para os Estados Unidos despencaram 80 % (de 47,8 mil toneladas para apenas 9,7 mil toneladas) . O motivo: tarifas de até 76,4 % sobre carne brasileira que excede a cota anual de 65.005 toneladas livres de imposto, conforme aponta a United Press International.
Antes do tarifaço, a demanda americana estava aquecida: em abril, o Brasil exportou 48 mil toneladas para os EUA, mesmo com uma tarifa inicial de 10%, segundo a Reuters. Em julho, o volume caiu de forma drástica, obrigando importadores americanos a buscarem fornecedores na Argentina, Uruguai e Paraguai. O preço médio pago pelos importadores também subiu, passando de US$ 5.200 (R$ 28.085,46) por tonelada em abril para US$ 5.850 (R$ 31.596,14) em julho.
Curiosamente, no mesmo mês em que as remessas para os EUA despencaram, o Brasil bateu recorde histórico de exportação de carne bovina, com 276,9 mil toneladas enviadas ao exterior, um aumento de 17 % em relação a julho de 2024. Apenas 12 % desse total foi para os Estados Unidos; a China manteve-se como principal destino.
Segundo o professor de Ciências Econômicas da Universidade Presbiteriana Mackenzie, Hugo Garbe, em entrevista ao Portal iG, o impacto das tarifas americanas vai muito além da fronteira dos EUA.
“O ‘tarifaço’ do governo Trump, ao elevar tarifas sobre uma ampla gama de produtos e insumos, reconfigura os fluxos comerciais globais e influencia indiretamente o preço da carne no Brasil, mesmo sendo o país um grande exportador”, explica.
“Ao encarecer importações nos EUA e redirecionar a demanda mundial, ele pode tornar a carne brasileira mais competitiva em mercados que deixam de comprar de fornecedores afetados, aumentando o preço de exportação e, por paridade, o preço interno.”
De acordo com Garbe, há uma relação direta e bem documentada entre a alta da demanda externa e o encarecimento da carne no Brasil.
“Quando frigoríficos e pecuaristas recebem preços mais vantajosos lá fora, ajustam sua oferta para equilibrar margens, elevando o patamar doméstico. Esse efeito é intensificado em fases de menor oferta e em períodos de câmbio depreciado, como mostram dados recentes do Cepea e da Secex.”
Possíveis soluções
Para proteger o consumidor brasileiro dessas oscilações globais, Garbe sugere medidas temporárias e focalizadas:
- Redução transitória de tarifas de importação para cortes populares ou insumos críticos;
- Uso de estoques reguladores de grãos para conter custos de ração;
- Desoneração temporária de tributos sobre proteínas com cláusulas de repasse;
- Aplicação de quotas ou licenças de exportação pontuais; ampliação da transparência e fiscalização das margens na cadeia;
- Criação de linhas de crédito para estabilizar a oferta e reduzir a volatilidade típica do setor.
“O impacto do tarifaço sobre o preço da carne no Brasil decorre de uma combinação de canais — preços de exportação, custos internos e câmbio — e exige uma resposta calibrada que preserve a competitividade externa, mas impeça que o consumidor doméstico arque com todo o custo das mudanças no comércio internacional”, conclui o economista.
Enquanto as decisões políticas e comerciais são debatidas, consumidores, tanto nos Estados Unidos quanto no Brasil, precisam lidar com um cenário de carne cada vez mais cara, transformando o churrasco ou o almoço de domingo em um item de luxo.