O Supremo Tribunal Federal (STF) voltou a julgar a ADI (Ação Direta de Inconstitucionalidade) 6309 na sexta-feira (23), e tem previsão de terminar a discussão na próxima sexta(30). A ação discute a idade mínima, o cálculo e a conversão de tempo para a aposentadoria especial do INSS.
Para Adriane Bramante, presidente do Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário (IBDP) – que participa do processo como amigo da Corte -, a exigência da idade mínimo tirou o caráter protetivo do benefício; a alteração no cálculo do benefício está incompatível com todo o texto da reforma da Previdência e a não possibilidade de conversão de tempo do período trabalhado após a reforma da Previdência fere o princípio da isonomia, o que é inconstitucional.
A aposentadoria especial era um benefício que tinha a natureza preventiva da saúde do trabalhador e era concedida com três modalidades: 15 anos para o mineiro do subsolo; 20 anos para o mineiro na rampa da superfície ou exposição ao amianto; ou 25 anos para os trabalhadores expostos a todos agentes nocivos (biológicos, químicos, agentes cancerígenos, ruído, calor, radiação ionizante, etcs).
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Com a reforma da Previdência o benefício da aposentadoria especial deixou de ter uma natureza preventiva quando passou a ser exigida uma idade mínima, a qual, segundo Adriane, não foi baseada em nenhum estudo. Foi estabelecido desde então 55 anos para aposentadoria do mineiro do subsolo, 58 anos para aposentadoria do mineiro na rampa da superfície ou exposição ao amianto e 60 anos para os demais trabalhadores expostos aos agentes nocivos. E foi trazida apenas uma regra de transição, que exige pontuação. Então o segurado tem que cumprir o tempo mínimo de exposição (15, 20 e 25 anos) e pontuação (que é de 66 pontos quando é aposentadoria de 15 anos, 76 se for de 20 e 86 se for de 25 anos).
Além desta alteração na idade e pontuação, a reforma da Previdência também trouxe uma mudança no cálculo do benefício (que era de 100% da média dos 80% maiores salários desde julho de 94) e passou a aplicar um percentual de 60% mais 2% a cada ano que supere 15 anos de tempo. Por exemplo, um segurado com 30 anos de tempo de trabalho e, dentro desse período, tem 25 de tempo especial, se tiver 10 anos de tempo rural, com 51 anos poderá se aposentar pela especial. Mas, nesse cálculo com 30 anos, ele vai pegar 80% da média (e não 100% como era antes da reforma). Para conseguir uma aposentadoria com 100%, o homem precisa de 40 anos de tempo de contribuição e a mulher e o mineiro do subsolo 35 anos.
“Ficou muito mais difícil para o segurado exposto a agente nocivo, que tem uma redução de sua expectativa de sobrevida com uma renda diminuída. Isso está incompatível com todo o texto da reforma, porque neste consta que todo o benefício que é de natureza acidentária, causado pelo trabalho, deveria ter 100% da média. Mas no caso da aposentaria especial não foi seguido esse mesmo raciocínio. E deveria ser, principalmente porque é uma aposentadoria que tem uma contribuição específica paga pela empresa para custeá-la”, pontua a especialista.
Outro ponto que a ADI 6309 discute é a conversão de tempo – quando não foi alcançado o tempo mínimo para a aposentadoria. Esta permite o ajuste de tempo entre o especial e o comum, para que o segurado possa ter prestigiado o período trabalhado exposto a agente nocivo. “Com a reforma, essa conversão foi vedada dos períodos após 14 de novembro de 2019. Isso é inconstitucional, porque o tempo especial deve ser tratado de forma diferenciada segundo o próprio texto da Constituição (artigo 201, paragrafo 1º)”, afirma a presidente do IBDP.
Como exemplo, um segurado que hoje tenha tempo especial antes de 2019, vai conseguir ter o tempo trabalhado exposto a agente nocivo reconhecido. Já o trabalhador que começou a exercer a atividade após a reforma, com 24 anos de tempo de contribuição lá na frente, se for demitido e não exercer mais atividade especial, não poderá aproveitar esses 24 anos trabalhados expostos a agentes nocivos e vai para a regra geral, mesmo tendo trabalhado por tanto tempo exposto. “Não há uma contagem diferenciada para esse segurado e isso fere o princípio da isonomia. Daqui a 15, 20 anos vamos sentir que essa pessoa não terá proteção. O que o STF está decidindo nesse momento é essa questão, de considerar inconstitucional ou não a conversão de tempo, o cálculo da média e a idade mínima”, conclui a advogada.