Um dia você está trabalhando em uma das maiores empresas do país, no outro, ela perde 80% do valor de mercado e prevê iniciar um pedido de recuperação judicial . Já pensou como ficaria sua cabeça? Bem, é assim que os funcionários da Lojas Americanas tem se sentido desde a última semana, quando ex-CEO Sergio Rial pediu demissão após encontrar R$ 20 bilhões em "inconsistências contábeis".
Ao todo, a empresa possui 44 mil "associados", sendo 85% deles permanentes e 15% temporários, segundo o último balanço da empresa, relativo a 2021. Muitos deles estão preocupados com a possibilidade de demissão em massa.
A Reforma Trabalhista de 2017 havia liberado demissões em massa, sem a necessidade de mediação de sindicatos. O Supremo Tribunal Federal (STF), no entanto, reverteu a decisão em junho do ano passado. Agora, representantes dos trabalhadores devem participar das negociações, o que não assegura o cumprimento do acordo.
A advogada Claudia Abdul Ahad, sócia do escritório Oliveira, Vale, Securato e Abdul Ahad Advogados, especialista na área trabalhista empresarial, explica que, nesse caso, é vedada a contratação de novos colaboradores para substituir os funcionários desligados.
"Quando o colaborador é demitido de forma coletiva, ele tem os mesmos direitos que teria em uma demissão individual sem justa causa. A falência não desobriga o empregador de pagar as verbas trabalhistas e os empregados têm preferência sobre os créditos da massa falida."
Há possibilidade de demissões em massa?
Por enquanto, apesar da preocupação, a informação é de que o quadro de funcionários da empresa seguirá estável.
O presidente do Sindicato dos Comerciários do Rio de Janeiro, Márcio Ayer, diz que acompanha o caso de perto e que já esteve em contato com a área de relações sindicais da empresa para obter informações sobre a situação dos trabalhadores e solicitou uma reunião com a direção da Lojas Americanas para saber mais sobre a realidade da empresa. Ele afirma que acompanha diretamente o trabalho dos funcionários, resguardando os direitos da categoria.
"Até o momento o que nos foi passado é de que tudo permanece igual nas lojas. Estamos acompanhando e esperamos que tudo tenha um desfecho positivo para os funcionários, com os empregos e os direitos preservados", afirma Márcio Ayer.
Recuperação judicial em curso
A varejista Americanas informou nesta quinta-feira (19), em fato relevante, que o seu pedido de recuperação judicial deve ser feito "nos próximos dias ou nas próximas horas". No comunicado, a empresa acrescentou ainda que possui apenas R$ 800 milhões em caixa.
A advogada Cláudia Abdul Ahad explica que durante o processo de recuperação judicial, a consequência mais comum é a redução no quadro de colaboradores, com demissões, e neste caso, a empresa tem como obrigação o pagamento das verbas rescisórias integrais (aviso prévio, férias, 13º salário, FGTS), dentro do prazo legal de 10 dias.
"A recuperação judicial não dificulta a quitação de obrigações trabalhistas, uma vez que a atividade econômica da empresa permanece em continuidade. Entretanto, a empresa tem o prazo de 60 dias, após o deferimento do processo da recuperação judicial, para apresentar um plano de recuperação, onde podem ser aprovadas condições de pagamentos, parcelamentos e medidas a serem adotadas, como, por exemplo, o parcelamento de verbas rescisórias, salários e prorrogação no pagamento de décimo terceiro, entre outras medidas. Isso sim, pode prejudicar os empregados demitidos e os que continuarem trabalhando na empresa", afirma.
"Nenhum pagamento pode ser realizado sem cadastro na Recuperação Judicial, já que o processo tem como objetivo concentrar as dívidas da empresa. Ainda assim, é importante ressaltar que os primeiros créditos a serem quitados, são os créditos trabalhistas, por tratarem-se de verba alimentar", adiciona.
Esse dinheiro, no entanto, costuma se arrastar. Não são raros os casos de empresas que decretam falência e demoram anos para pagar os empregados. Entre elas, estão casos famosos como os das companhias aéreas Varig e Vasp.
Corte de gastos
A empresa já começou o processo de corte de custos, entre as decisões mais famosas está a de abandonar o patrocínio do Big Brother Brasil um dos programas de maior audiência da TV brasileira. O investimento da marca era o maior do programa, chegando a custar R$ 105 milhões na última edição.
Caso esse "enxugamento" de gastos continue, é possível que haja demissão de parte do quadro de funcionários.
Abdul Ahad ressalta que é possível reverter a demissão na Justiça, mas só em alguns casos.
"As decisões relativas aos casos de recuperação judicial apenas concedem a reintegração ao emprego em casos de estabilidade, como, por exemplo, membro da CIPA (Comissão Interna de Prevenção de Acidentes), gestantes ou que deram à luz há menos de 5 meses e profissionais afastados por auxílio-doença".
A reportagem entrou em contato com a Lojas Americanas, mas não obteve resposta até o momento.