O consumidor pode se livrar de uma fatura extra de R$ 32 bilhões deixada pela crise hídrica do ano passado. Em outubro último, o governo contratou energia em caráter emergencial, mas os empreendimentos atrasaram, o que justificaria o cancelamento dos contratos, de acordo com as regras da licitação.
Na prática, isso deve evitar uma cobrança extra de R$ 10 bilhões por ano na conta de luz , que afetaria o consumidor até 2025, de acordo com cálculos da Associação Brasileira de Grandes Consumidores Industriais de Energia e de Consumidores Livres (Abrace) feitos a pedido do GLOBO.
Caso essa cifra fosse incorporada às tarifas de energia, haveria alta média de 6%.
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Com o cancelamento dos contratos, não haverá aumento extra na conta. Apenas seis das 17 usinas contratadas no leilão, desenhado originalmente para garantir o abastecimento neste ano em caso de nova seca, entraram em operação dentro do prazo estabelecido. O prazo limite determinado pelos acordos e previsto nos editais se encerrou no dia 1º deste mês.
E, como neste ano houve um volume maior de chuvas, estas usinas que não foram entregues não representam risco para o abastecimento.
"Se a gente conseguir tirar o custo dessas termelétricas, é um aumento nas contas que fica evitado", afirma Victor Iocca, diretor de Energia Elétrica da Abrace.
Usinas mais caras
A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) já iniciou os processos que tendem a levar à rescisão contratual, embora isso ainda não tenha sido concretizado em nenhum caso. Na terça-feira, a agência revogou a autorização de quatro das usinas, que seriam instaladas em Itaguaí, além de determinar a abertura de processo administrativo para apurar eventuais penalidades pela não implantação das termelétricas.
A portaria do Ministério de Minas e Energia que estabeleceu as regras para o leilão emergencial permitiu um atraso máximo de três meses nesse tipo de empreendimento. A data inicial prevista para a entrada em operação era 1º de maio. Ou seja, as termelétricas teriam de estar ligadas e gerando energia até 1º de agosto no máximo — e isso não ocorreu para 11 usinas.
Os contratos também previam a rescisão após atrasos superior a 90 dias.
Em nota divulgada na quinta-feira (11), a Aneel informou que sete empreendimentos foram entregues — porém, os dados da própria agência mostram que um deles foi concluído além do prazo limite. Apenas uma usina entrou em operação comercial dentro do prazo inicial. Onze usinas foram notificadas em razão de atrasos superiores a 90 dias.
“Após avaliação das manifestações dos geradores (empresas), o que deve ser feito em até quinze dias úteis, a CCEE (Câmara de Comercialização de Energia Elétrica) deverá notificar a Aneel para que se manifeste a respeito da rescisão dos respectivos CERs (contratos), respeitando rito decisório dos processos administrativos no âmbito da Agência”, diz a nota.
A Aneel também pode aplicar multas (que também são previstas nos editais) e impedir novas contratações com a administração pública:
“Onze usinas contratadas no PCS (Procedimento de Contratação Simplificado) já foram notificadas quanto a atrasos superiores a 90 dias”, afirma a agência.
Ao todo, o custo previsto para as 17 usinas contratadas no leilão do ano passado é de R$ 39 bilhões. É um recurso que seria pago por todos os consumidores e que já estava sendo embutido nas contas de luz deste ano, a partir de 2023. Como 11 dessas usinas não foram entregues, o custo total cairá para R$ 7 bilhões.
O leilão realizado em outubro foi convocado às pressas pelo governo federal e adotou regras simplificadas de contratação. O objetivo, na época, era garantir o fornecimento de energia ao país em caso de uma nova crise hídrica. Naquele momento, a crise nos reservatórios das hidrelétricas era a pior em 90 anos.
Das 17 usinas contratadas, 14 eram termelétricas movidas a gás natural; uma termelétrica a biomassa; e duas usinas solares fotovoltaicas. As 14 usinas termelétricas a gás natural foram contratadas por R$ 1.599,57 o megawatt-hora (MWh), em média — preço sete vezes maior que a média de leilões tradicionais, feitos regularmente para garantir o suprimento de energia.
A situação de crise que justificou a contratação das usinas não se repete neste ano. Estudos do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) apontam que há “pleno atendimento” até janeiro de 2023, quando começa o período chuvoso nas principais bacias do país, mesmo sem as usinas emergenciais.
Para efeito de comparação, em agosto de 2021, reservatórios da Região Sudeste/Centro-Oeste — com a maior parte das hidrelétricas, considerada a caixa d’água do setor —, operavam com cerca de 21%. Neste ano, os reservatórios devem terminar o mês com 53% de capacidade, segundo dados do ONS.
Nova redução
A rescisão dos contratos se somaria a outras medidas que podem ajudar a aliviar as contas de luz. Entre elas, está a redução para no máximo 18% do ICMS (alguns estados cobravam até 30%), além da mudança na base de cálculo desse imposto (que será cobrado apenas sobre a tarifa de energia, e não sobre faturas de transmissão e distribuição).
O Ministério de Minas e Energia estima uma redução média de 7% nas contas de luz por causa da mudança no ICMS.