A alta dos juros tornou o sonho da casa própria mais distante e fez com que o mercado de aluguel de imóveis ficasse mais aquecido. Em paralelo, a volta ao trabalho presencial levou muitos brasileiros que haviam se mudado para cidades do interior durante a pandemia a retornarem às capitais, contribuindo para o aumento dos contratos de locação. De acordo com o índice FipeZap+, o aluguel subiu, em média, 9,49% desde janeiro, quase o dobro da inflação no país no período, de 5,49%.
Em algumas capitais, o salto foi ainda maior. Em Goiânia, houve alta de 19,55%, em Florianópolis, de 18,6% e em Salvador, de 15,26%. Mesmo com os reajustes, o preço por metro quadrado nestas capitais segue menor do que em mercados como São Paulo, onde sai por R$ 43, e Rio, por R$ 35. O valor para locação no Rio subiu 10,8% desde janeiro.
"O valor dos aluguéis vem subindo desde outubro do ano passado e acelerou neste ano com o avanço da vacinação, o mercado de trabalho respondendo positivamente. Tudo isso possibilita que os proprietários repassem preços para inquilinos. Os donos se veem ainda mais tentados em repassar com o aumento do IPCA", afirma Pedro Tenório, economista do DataZap+.
Com o salto nos juros, que passaram de 2% desde meados de 2021 para 13,25%, muitos brasileiros que já estavam com a chave da casa própria quase na mão adiaram os planos, em razão do custo do financiamento e do risco de inadimplência. O jeito foi refazer as contas e voltar ao aluguel.
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Outro levantamento, do Quinto Andar, mostra que no primeiro semestre os contratos têm sido fechados no Rio com alta de 9,5%.
"As pessoas estão se segurando, evitando assumir financiamento de longo prazo com juros altos, eleições. E as aplicações competem com quem vai pagar à vista. Vale mais a pena manter o dinheiro em uma aplicação que rende ao menos 12% ao ano e pagar o aluguel com o que receber", diz Leonardo Schneider, vice-presidente do Secovi Rio.
Taxa de vacância menor
O caminho é negociar. Carlos Eduardo Caldas, de 36 anos, transformou um reajuste de 60% em R$ 200 depois de conversar com a imobiliária e com o dono do apartamento que mora no Leme, na Zona Sul do Rio, há três anos.
"Eu gosto muito do lugar onde moro. Pensei em me mudar, mas, além de todo o estresse, seria deixar para trás a minha casa. Nas pesquisas por outros imóveis, vi que a correção do aluguel estava em desacordo com outros da mesma rua e decidi propor um acordo", conta.
Para Jean Carvalho, gerente de imóveis da Apsa, que administra mais de cem mil unidades em várias cidades, a perda de renda — com o avanço da inflação — também retarda a aquisição, e muitos profissionais estão voltando do interior para o trabalho presencial.
Estudo interno corrobora essa avaliação: a taxa de vacância (imóveis vazios) estava em 13,8% em maio, patamar equivalente ao nível pré-pandemia. No pior momento da crise, um em cada cinco imóveis estava desocupado.
Com o aumento no preço dos aluguéis, muitas famílias têm procurado apartamentos menores, em bairros menos valorizados ou em prédios que oferecem menos serviços. Em São Paulo, por exemplo, o Centro da cidade passou a ser buscado com mais ênfase, e crescem ofertas de imóveis de apenas um quarto.
Gabriel Leão, sócio responsável pela área de ciência de dados da Amora, uma startup que atua em compra, aluguel e revenda de imóveis para os próprios usuários, em São Paulo, percebeu esse movimento.
"As pessoas que nos procuram não estão abrindo mão da tipologia do imóvel. Não deu para Vila Mariana (Centro-sul de SP), ele aceita falar de Vila Andrade (Zona Sul), por exemplo", diz Leão, que acompanha em sua base cerca de 1.500 imóveis, além de tomadas de preços de diversas fontes.
Para o diretor de locação da imobiliária Lello, Raphael Sylvester, o revezamento dos bairros na preferência das famílias é um fator que contribui para a retomada do mercado de aluguel ser bem distribuída. Sem ter mais como segurar o reajuste dos contratos em vigor, em muitos casos a solução foi ampliar os horizontes para regiões que antes não estavam nos planos.
"Isso é uma mudança natural. Perda de renda, restrição do crédito... A única opção é procurar regiões que te atendam, mas com um preço mais acessível para o bolso", conta Sylvester.
Edifícios antigos
O gerente de logística Carlos Nader não precisou se afastar da Mooca, na Zona Leste de São Paulo, onde queria permanecer. Após resistir aos reajustes, ele teve de ceder a um aumento de 10% no contrato que mantinha em um apartamento de dois quartos e 67m2, que foi a R$ 3.600 por mês (com condomínio e IPTU).
Achou a quatro quarteirões dali uma alternativa de 80m2, por R$ 2.100. A chave para resolver o problema no orçamento foi um prédio mais antigo, com menos serviços. "Continuei no mesmo bairro e tive redução de R$ 1.500 por mês", diz Nader.
Segundo o gerente de dados do Quinto Andar, Thiago Reis, a demanda é maior por imóveis menores, que ficam ainda mais valorizados. "As pessoas querem morar perto do transporte público, do trabalho", afirma.
Ele aponta como exemplo o Butantã, bairro da Zona Oeste de São Paulo. Contemplada recentemente pela expansão do metrô, a região viveu uma explosão de novos empreendimentos, boa parte dos quais dedicada a imóveis de baixa metragem, enquadrada ao novo zoneamento da cidade. "Foi o bairro que mais se valorizou nos últimos seis meses em São Paulo, mais de 23%", conta o gerente do Quinto Andar.
A profusão de novas unidades de até um quarto a partir do novo zoneamento da capital paulista também criou uma oferta que veio ao encontro desse movimento de volta ao Centro, segundo Leão.
Flat virou alternativa
No Rio, quem não quer abrir mão de bairros mais nobres também precisa se mudar para apartamentos mais compactos. O diretor de marketing Fabio Balassiano iniciou a busca por um imóvel após o divórcio, em 2021. Ele mora de aluguel desde janeiro e sentiu um aumento de 20% no valor dos contratos, o que o levou a abandonar a busca por apartamentos e se mudar para um flat na Lagoa, Zona Sul do Rio.
"Eu desisti de procurar por apartamentos, estava tudo um absurdo. O flat pode não ser uma boa opção se você considerar apenas o aluguel, mas ele já está todo mobiliado, com faxina e espaços compartilhados, como a cozinha".