Prevista para julho deste ano, a retomada das obras para a conclusão da Unidade de Fertilizantes de Nitrogenados (UFN3) — fábrica de ureia e amônia cuja venda a Petrobras negocia com o grupo russo Acron — ainda está cercada de incertezas. A operação não foi finalizada, e as tratativas ocorrem em um cenário de dúvidas trazidas não apenas pela guerra na Ucrânia, mas por questões domésticas.
Por um lado, existe o temor de que o negócio seja suspenso, caso as sanções contra a Rússia durem mais tempo, o que impediria um aporte de capital para concluir a transação. Por outro, críticos afirmam que há problemas de insumos e que os termos da venda podem dificultar o impacto positivo que o agronegócio espera com essa transação
Representantes das duas empresas continuam em reuniões com integrantes da prefeitura de Três Lagoas, onde está a fábrica, e do governo de Mato Grosso do Sul.
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O acordo entre as partes foi anunciado pela ministra da Agricultura, Tereza Cristina, no mês passado, poucos dias antes de o presidente Jair Bolsonaro — que festejou a notícia em redes sociais na época — viajar para a Rússia, e cerca de duas semanas antes da invasão da Ucrânia por tropas russas.
24 meses de obra
O valor da operação não é revelado, mas segundo uma fonte, a soma corresponde ao que a Petrobras investiu no empreendimento, em torno de R$ 3,8 bilhões. A expectativa é que fábrica comece a operar em 2027.
Além dos impactos da guerra, a senadora e pré-candidata à Presidência da República pelo MDB, Simone Tebet — que, há 11 anos, quando era prefeita de Três Lagoas, cedeu um terreno de 50 hectares para a fábrica — afirma que a estatal, além de ter se precipitado com a venda, não se preocupou em colocar no contrato um prazo que obrigue a compradora a produzir a partir de determinado período.
A UFN3 começou a ser construída em 2011, para produzir ureia e amônia, em volumes de, respetivamente, 3.600 t/dia e 2.200 t/dia. As obras, no entanto, estão paradas desde dezembro de 2014.
Em 2017, a Petrobras colocou a fábrica à venda, alegando querer sair da área de fertilizantes. Na ocasião, com a unidade 81% concluída, a Acron chegou a mostrar interesse, mas desistiu, devido à dependência do fornecimento de gás natural pela Bolívia.
O secretário de Meio Ambiente, Desenvolvimento Econômico, Produção e Agricultura Familiar (Semagro) do Mato Grosso do Sul, Jaime Verruck, fala em frustração e lembra que o estado havia concedido incentivos fiscais à Petrobras.
O acordo entre a estatal e a Acron foi celebrado, mas o impasse em torno do gás permanece: o Brasil não tem como fornecer 2,5 milhões de metros cúbicos do combustível para que o grupo russo possa produzir fertilizantes.
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— Como a obra tem previsão de 24 meses no mínimo para que seja construída, a expectativa é que nesses dois anos seja resolvida a equação de gás natural — disse Verruck.
Equipamento ocioso
Simone Tebet, porém, discorda da alegação sobre o gás: para ela, a Petrobras teria condições de desviar parte do que recebe para uma causa urgente, que é aumentar a oferta adicional de fertilizantes no momento em que estes produtos podem faltar para o agronegócio brasileiro.
Enquanto isso, para garantir pelo menos parte da demanda, a expectativa é que a empresa importe insumos da Rússia e fabrique o produto final em uma misturadora já a partir do ano que vem.
A senadora enfatizou que a única garantia que existe hoje é que o Acron vai usar material importado da Rússia. Mas a fabricação desses insumos, para reduzir a dependência que o Brasil tem dos importados, pode não acontecer, diz:
— Essa fábrica virou um elefante branco que poderia se transformar em uma galinha dos ovos de ouro, pois há petroquímicas brasileiras interessadas nela. A Acron vai importar da Rússia fertilizantes que não tem para misturar, e tenho dúvidas se o grupo não vai levar para aquele país os modernos equipamentos que estão na fábrica e podem não ser usados nunca.
Momento de Incerteza
Já o senador Nelson Trad (PSD-MS) avalia que este não é o momento ideal para vender a fábrica:
— Ninguém conseguirá prever as consequências e o desfecho dessa guerra.
Procurada, a Petrobras informou que não vai se manifestar sobre a declaração da senadora. Em relação à fábrica, a estatal afirma que nada mudou desde o anúncio da negociação, ou seja, que o contrato depende ainda de “tramitação na governança da Petrobras, após as devidas aprovações governamentais.”
A Acron não respondeu às mensagens do GLOBO.