Bebidas açucaradas
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Bebidas açucaradas

Um relatório inédito da Aliança de Controle do Tabagismo (ACT), divulgado nesta quinta-feira, mostrou que a tributação sobre bebidas adoçadas, como refrigerantes e sucos artificiais ou industrializados, não causa impactos negativos na economia. O trabalho refuta um dos principais argumentos contra a medida e mostra que ela tem efeitos positivos sobre a saúde pública.

O estudo avaliou a adoção desse tipo de imposto em mais de 60 territórios no mundo. Foram analisados dados de países como Portugal, México, Chile, África do Sul, França, além de algumas cidades dos Estados Unidos.

A consequência da adoção de impostos mais altos para esses produtos, de acordo com o relatório da ACT, é a potencial redução dos quadros de obesidade e de doenças crônicas relacionadas à alimentação inadequada na população. O imposto mais alto encarece o produto e desestimula o consumo.

O estudo adverte, no entanto, que implementar tal medida sem o mapeamento da cadeia produtiva de bebidas e do sistema tributário nacional poderia tornar a medida inócua, uma vez que o Brasil ainda oferece uma série de incentivos fiscais que favorece fabricantes desses produtos.

Acesso a alimentos saudáveis

Além disso, a pesquisa também aponta que é necessário investir em soluções que tornem bebidas e alimentos saudáveis mais acessíveis para que a tributação não penalize os menos favorecidos.

 "A gente sabe que há os recursos no Brasil para diminuir a desigualdade, sabe o que precisa ser feito e quais as políticas efetivas", afirmou a diretora-geral da ACT Paula Johns durante evento virtual de lançamento do relatório, nesta quinta-feira. "Isso é só um pequeno exemplo de uma crise sistêmica muito mais ampla de como a gente organiza a nossa economia."

 México, Índia e África do Sul têm bons resultados

México, Índia e África do Sul são alguns dos países com maior dimensão geográfica e em estágio ide desenvolvimento similar ao do Brasil, a aplicar a medida com sucesso, aponta o relatório.

Nos Estados Unidos, onde as taxas de obesidade estão entre as mais altas do mundo, a medida já foi adotada em oito cidades.

No México, com um imposto de 25% sobre bebidas com açúcar adicionado (como refrigerantes, chás, bebidas energéticas, sucos industrializados e afins) e insumos para a produção, houve uma arrecadação de US$ 5,4 bilhões (R$ 29 bilhões) entre os quatro primeiros anos de tributação (de 2014 a 2018).

Lá, a água foi o principal substituto das bebidas açucaradas, com aumento de 16,2% nas compras.

Em Portugal, uma avaliação preliminar mostrou a redução de 41% no volume de produção de bebidas com elevado teor de açúcar, além da redução de 15% na ingestão de açúcar das bebidas tributadas.

Já na África do Sul, cerca de 30% das reduções de açúcar nas bebidas se deram por conta da tributação.

Governo já cogitou 'imposto do pecado'

Um estudo da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe), realizado em 2020, já havia demonstrado que a tributação sobre refrigerantes, sucos de caixinha e bebidas açucaradas tem um potencial de arrecadação de até R$ 3,5 bilhões ao Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil.

O governo Jair Bolsonaro e o Congresso já cogitaram sobretaxar refrigerantes, juntamente com outros produtos cujo abuso é considerado prejudicial à saúde, como bebidas alcoolicas e cigarros. A iniciativa ficou conhecida como 'imposto do pecado', mas não foi adiante.

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Ao contrário, o presidente Jair Bolsonaro tornou permanente o benefício tributário para esse tipo de bebida. O Congresso, entretanto, já avalia alterar essa decisão.

A Fipe também fez uma simulação que revelou que a adoção de um tributo nos moldes da Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide), poderia levar a uma redução no consumo dessas bebidas.

Segundo o estudo, uma alíquota de 20% reduziria o consumo em cerca de 19%, enquanto que uma taxação de 50% levaria a uma redução de aproximadamente 49%.

"No Chile, por exemplo, há o avanço da rotulagem de alimentos ricos em açúcar, gorduras e sódio. O Brasil deveria aproveitar e se inspirar nessas iniciativas, de forma a proteger, sobretudo, o ambiente escolar", afirma a autora do estudo, Bruna Kulik Hassan.

Ela continua:

"A tributação de bebidas e outros alimentos não saudáveis deve ser um dos componentes de um conjunto amplo de políticas fiscais em consonância com uma estratégia ampla de promoção, proteção e apoio à alimentação adequada e saudável."

Impacto econômico do consumo

O relatório da ACT traz dados alarmantes sobre o consumo de bebidas adoçadas e como elas impactam não apenas a saúde da população, mas também a economia do país.

Isso porque os custos elevados com saúde, a perda de produtividade no trabalho, aposentadoria e morte precoces são alguns dos fatores que contribuem para um custo econômico e social que advém do consumo exagerado desses produtos.

"O relatório traz uma dimensão evidente do problema, mostrando que grandes corporações estão vendendo produtos que estão destruindo a saúde das pessoas em vez de contribuir para a sociedade", diz o economista Ladislau Dowbor.

Anualmente, custos diretos de saúde decorrentes da obesidade e a consequente perda de produtividade representa um gasto de cerca de US$ 2 trilhões (aproximadamente R$ 10,7 trilhões), ou 2,8% do PIB global, aponta o relatório.

Uma estimativa da ONU aponta que o impacto econômico causado pelas mortes prematuras pelas cinco principais doenças crônicas não transmissíveis (DCNTs) e a obesidade, entre 2011 a 2030, será de US$ 47 trilhões (R$ 252 trilhões).


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