Com o agravamento da crise econômica nos últimos anos, a solução para o desemprego encontrada por muitos profissionais foi começar a trabalhar como autônomo, com o próprio carro, em aplicativos de transporte. No entanto, após o inchaço das plataformas com motoristas e as consecutivas altas dos combustíveis, o negócio não tem se mostrado mais tão lucrativo. Muitos condutores ainda reclamam das altas tarifas pagas para os apps a cada corrida. A fim de resolver esses problemas, surgiram concorrentes nacionais, criados pelos próprios motoristas que viviam esses dramas: o Bora 94, o Moovecar e o Chofer 46.
Ao perceber que muitos colegas desistiam da direção pelo custo-benefício, o motorista Fábio Lucas decidiu criar seu próprio app, em novembro do ano passado, na cidade de Marabá, no Pará. Ele vendeu um celular e pegou um empréstimo, somando quase R$ 10 mil. O valor foi todo investido no Bora 94, através da contratação da plataforma de tecnologia Machine, e em publicidade. Cobrando a taxa fixa de R$ 1 por corrida, hoje já conta com 1.100 motoristas parceiros que transportam passageiros na cidade com 250 mil habitantes.
Com uma média de 15 mil corridas mensais, o empreendedor explica como tem atraído clientes.
"Como a tarifa dos grandes aplicativos é muito alta, com aumento dos combustíveis, ficou desvantajoso para o motorista aceitar corridas a mais de dois quilômetros de distância de onde estão, já que a cobrança só inicia quando o passageiro entra no carro. Isso acarretou em um enorme número de cancelamentos", explica Fábio Lucas: "No Bora 94, os motoristas têm um desconto muito baixo e, assim, cancelam menos. O passageiro já percebeu isso. Como o valor para o consumidor é semelhante ao de outros apps, estamos ganhando a preferência."
A insatisfação com as tarifas também foi um propulsor para o motorista Angelo Toniazzo criar o Chofer 46, em Francisco Beltrão, no Paraná, ao lado de outros nove condutores. Cobrando valor fixo dos motoristas e tarifas aos passageiros cerca de 20% mais baratas que Uber e 99, o grupo viu o negócio crescer rápido. Decidiram, então, implementar o modelo de franquias, conseguindo expandir para 15 cidades do Paraná e de Santa Catarina.
"Cada cidade tem um franqueado, que é responsável pela seleção dos motoristas e suporte aos passageiros. Os parceiros precisam ter MEI e são livres para atuar como preferirem. Quem trabalha cinco vezes por semana, em torno de oito horas por dia, consegue recebr R$ 6 mil bruto", compara Beltrão: "Enquanto outras plataformas focam no cliente, a nossa prioridade são os motoristas."
Em Porto Velho, Rondônia, Jonathan Daniel não queria mais trabalhar como taxista por precisar fazer jornadas de até 16 horas diárias para quitar todas as despesas da família. Resolveu empreender, usando uma reserva financeira que dispunha, e criou o Moovecar. O negócio também expandiu e virou franquia, chegando a cidades como Cuiabá (MT), Umuarama (PR), Ponta Porã (MS), Tietê (SP). Hoje, já são cerca de 900 motoristas cadastrados.
Com o objetivo de parar de viajar e poder acompanhar o crescimento do filho, o ex-representante farmacêutico Chalaco Fortes resolveu abrir uma franquia da Moovecar em Ji-Paraná (RO), com o investimento inicial de R$ 25 mil, e está satisfeito com a iniciativa. Recebendo salário semelhante ao de quando era celetista, diz que ganhou qualidade de vida.
"Já são 63 motoristas cadastrados em Ji-Paraná e eu faço a administração da minha própria casa. A cobrança para eles é de uma mensalidade fixa de R$ 185. Então, o profissional tem a satisfação de realizar as corridas e saber que o valor é integralmente dele. Com isso, prestam bom atendimento e não cancelam as corridas", observa.
Reajuste nas tarifas de aplicativos
Segundo dados da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), desde 2018, o preço da gasolina subiu cerca de 40%. O etanol e o GNV não passaram ilesos e também sofreram aumentos nas bombas. Em paralelo, motoristas reclamavam que as tarifas dos aplicativos de transporte permaneciam congeladas. Diante dessa demanda, Uber e 99 fizeram ajustes neste ano.
Segundo a 99, os ganhos dos motoristas parceiros foram reajustados entre 10% e 25% em 20 regiões metropolitanas de todo o país, com subsídio da empresa:
"Os novos valores levam em consideração o impacto negativo do aumento dos combustíveis sobre a categoria, considerando a manutenção do equilíbrio da plataforma. O objetivo é continuar oferecendo uma fonte de ganho para os motoristas parceiros e um meio de transporte financeiramente viável, seguro e eficiente para a população", afirmou em nota.
A 99 ainda disse que os motoristas são descontados no máximo 30% por corrida, porém há casos em que é empregada a taxa negativa — o valor repassado ao motorista é maior que o pago pelo passageiro, e a diferença é custeada pela empresa.
Já a Uber informou apenas que os ganhos na plataforma da Uber dependem de diversas variáveis, como o perfil do parceiro, como o modelo de veículo, se o carro é próprio ou alugado, o tipo de combustível usado, sem esclarecer qual valor máximo da taxa cobrada dos parceiros por corrida.