O Porto de Santos calcula prejuízos entre R$ 820,5 milhões e R$ 5,85 bilhões com a decisão do Tribunal de Contas da União (TCU) que obriga a autoridade portuária (SPA) a renovar o contrato da Marimex, operadora de uma área de contêineres retroportuária (sem acesso direto ao porto) até que haja um novo operador ferroviário do porto, o que deve ocorrer apenas em 2025.
Em seu recurso junto ao órgão no qual tenta reverter o acórdão, a SPA argumenta que a extensão do contrato com a empresa, que originalmente venceu em maio de 2020, traria prejuízos ao erário com perda de receita e pedidos de reequilíbrio de outros operadores do porto.
Os cálculos financeiros das perdas variam de acordo com a depender do tempo de contrato a ser concedido à Marimex .
No documento, ao qual o GLOBO teve acesso, a autoridade portuária afirma que a prorrogação do contrato está “imediatamente desalinhado com o planejamento de curto, médio e longo prazo (do porto) e, consequentemente, contra o interesse público”.
Em maio, o TCU impôs uma derrota ao Ministério da Infraestrutura ao decidir, por 5 votos a 3, estender o contrato já vencido da Marimex até que haja um novo operador ferroviário do porto. A atual operadora da ferrovia interna do porto, a Portofer (controlada pela Rumo), tem contrato até junho de 2025.
Novos planos do ministério
A operadora de contêineres, no entanto, mantém pretensão de conseguir, na Justiça, ficar na área por mais 20 anos contados a partir de maio de 2020.
Os ministros do TCU julgaram um pedido do Sindicato dos Empregados Terrestres em Transportes Aquaviários e Operadores Portuários (Settaport), que defende a prorrogação do contrato com a Marimex sob o argumento de que o encerramento da operação causaria demissões. Na ocasião, o TCU contrariou o histórico do próprio tribunal, de não fazer renovações sem licitação.
A pasta comandada por Tarcísio de Freitas quer liquidar o contrato da Marimex, que acabou em maio de 2020, porque pretende licitar ali um terminal de fertilizantes que ocuparia cerca de 90% do espaço e, no restante, construir uma área de manobra de trens (por ferroviária) para destravar um gargalo logístico do porto.
A atual ferrovia opera hoje com 49 milhões de toneladas ao ano, próxima das 50 milhões de toneladas de sua capacidade máxima.
O TCU entendeu, porém, que o Ministério e a SPA não têm o planejamento sobre quem deve construir a pera.
Há três opções à mesa sobre a construção da pera. A primeira é a obra ser incorporada pela atual operadora da ferrovia interna do porto, a Portofer (controlada pela Rumo). A segunda seria ficar a cargo da vencedora da licitação do novo terminal de fertilizantes na área da Marimex. A terceira, é que um novo operador ferroviário do porto assuma a obra no contrato da Ferrovia Interna do Porto de Santos (Fips), caso seja antecipado o fim do contrato da Portofer.
Em seu recurso, a autoridade portuária propõe ao TCU a assinatura de um contrato de transição com a Marimex que tenha duração flexível, e maior do que os seis meses previstos na legislação, até o início da construção da pera ferroviária ou o início da operação de um novo terminal.
Contratos de transição de seis meses
A proposta anterior do Ministério da Infraestrutura, de assinar vários contratos de transição de seis meses até que fosse iniciada a construção da pera ou o início operação do terminal de fertilizantes, foi rejeitada pelo TCU por supostamente não dar à Marimex previsibilidade sobre quando cessariam suas atividades na área.
Em sua petição, o governo federal diz que “a imposição de prorrogação contratual imporá perdas à administração (...) quanto à frustração de receita, pois, com a celebração de contrato de transição, haveria, no mínimo, a pactuação de reajuste do valor pago à SPA pela exploração da área”.
Caso o contrato com a Marimex seja prorrogado sem necessidade de reequilíbrio econômico-financeiro até junho de 2025, quando termina o contrato da SPA com a atual operadora da ferrovia interna do porto, a Portofer (controlada pela Rumo), o cálculo da autoridade portuária é de perdas de R$ 820,5 milhões.
A maior parte desse valor (R$ 353,1 milhões) refere-se à perda de receita tarifária e de arrendamento variável ocasionada pela menor movimentação de cargas por falta de capacidade ferroviária. Isso porque as obras da pera ferroviária só poderiam ser iniciadas em julho de 2025, e sua operação só ocorreria, portanto, em outubro de 2026.
Há ainda prejuízos de R$ 289,2 milhões com eventuais reequilíbrios de contrato de outros operadores de terminais na margem direita do porto, que seriam prejudicados com o gargalo ferroviário. O pedido cita grandes empresas como Copersucar, Hidrovias do Brasil, Suzano e Eldorado entre as que podem pedir reequilíbrio contratual por frustração de caixa até 2026.
Prejuízos maiores para autoridade portuária
A não negociação de um contrato de transição com a Marimex, que implicaria reajuste no valor pago hoje pela operadora ao porto, e o adiamento da licitação do terminal de fertilizantes que ocupará futuramente a área da empresa também entram na conta de prejuízos da SPA.
Como a Marimex pleiteia na Justiça a renovação de seu contrato por 20 anos, as perdas calculadas sobem para R$ 5,85 bilhões, segundo o cálculo da SPA.
Além disso, o governo afirma que a situação pode estimular outros operadores em situação similar à Marimex a buscarem prorrogações contratuais da mesma forma que a obtida pela empresa.
“A insegurança jurídica causada com a prorrogação do contrato pelo TCU pode ser vista como jurisprudência para todos os atuais arrendatários do Porto de Santos, resultando em avaliação de risco aos potenciais investidores. Cálculos preliminares indicam que, caso todos os contratos tivessem o mesmo benefício dado pelo TCU à Marimex, a SPA e a União deixariam de arrecadar R$ 6 bilhões em receitas (em 20 anos)”, diz o documento.
Pelos cálculos da autoridade portuária, 18 dos 50 contratos de arrendamento ativos hoje poderiam em tese ter o benefício dado pelo TCU à Marimex.
A SPA afirmou em nota ao GLOBO que defende a modernização do Porto de Santos e mantém o planejamento “tanto para implantação de novo terminal de fertilizantes quanto para a Ferrovia Interna do Porto de Santos (Fips)”. Procurada, a Marimex não quis se manifestar sobre o recurso por não ser parte no processo. A empresa diz que aguarda informações da Secretaria Nacional de Portos sobre a prorrogação de seu contrato.