Com ameaça de veto de Bolsonaro, projeto contra discriminação salarial entre homens e mulheres volta à Câmara
Reprodução
Com ameaça de veto de Bolsonaro, projeto contra discriminação salarial entre homens e mulheres volta à Câmara

O projeto de lei que pune com multa as empresas que pagam salários diferentes para homens e mulheres na mesma função voltará para a Câmara dos Deputados. Sob risco de veto pelo presidente Jair Bolsonaro , que alegou que a proposta poderia impossibilitar o emprego de mulheres , os parlamentares alegaram uma questão técnica para que o texto voltasse ao Congresso.

"Tem duas situações. É um PL (projeto de lei) antigo, de 2011, e teve alteração no Senado, ele tem que voltar para a Câmara quando tem alteração de mérito. Mas também teve uma preocupação política com o veto", afirmou a deputada Dorinha Seabra (DEM-TO) ao GLOBO.

A deputada se referiu às declarações de Bolsonaro em sua live na última semana. O presidente afirmou estar em dúvida sobre sancionar ou vetar a proposta, e disse acreditar que o texto tornaria "quase impossível" a entrada de mulheres no mercado de trabalho.

"Vamos ver se eu sancionar como vai ser o mercado de trabalho para a mulher no futuro. É difícil para todo mundo, para a mulher é um pouco mais difícil. (Vamos ver) Se o emprego vai ser quase impossível ou não", disse o presidente na ocasião.

A proposta começou a tramitar em 2009, e foi aprovada pela Câmara em 2011. Depois de dez anos, no final de março, o Senado aprovou o texto com pequenas modificações, como a gradação da multa a ser aplicada contra as empresas .

A proposta final estabeleceu que a punição passa a ser de até cinco vezes a diferença salarial verificada entre o homem e a mulher – originalmente, seria de cinco vezes. A indenização será multiplicada pelo período de contratação da funcionária, respeitando um limite de cinco anos.

Para a deputada Dorinha, não há dúvidas de que o problema da discriminação salarial entre homens e mulheres existe no Brasil e é uma questão persistente. Ela cita dados do IBGE que apontam a diferença de 22% nos pagamentos entre homens e mulheres brancos, que pode passar dos 60% quando a comparação é feita entre um homem branco e uma mulher negra.

"É inimaginável pensar que possa persistir uma situação dessa", declarou.

Ela explicou que o presidente da Câmara, deputado Arthur Lira (PP-AL), fez o pedido para que o texto voltasse para a Casa e que já teve reforço do comando do Congresso. Um ofício do dia 23 de abril, assinado pelo senador Irajá (PSD-TO), que é o primeiro-secretário do Senado, solicitava a restituição do projeto enviado à sanção ao ministro Onyx Lorenzoni, da secretaria-geral da Presidência.

"Ele volta para a Câmara para adequação: verificar a alteração no Senado, que a meu ver é mais benéfica ao empregador e menos para a mulher, e tem essa questão de deixar claro os elementos do texto", afirmou a deputada.

A manifestação na live semanal não foi a primeira vez em que Bolsonaro se opôs à aprovação de leis que endureçam as regras do mercado de trabalho para coibir diferenças salariais influenciadas por questões de gênero.

Você viu?

Na campanha presidencial de 2018, Bolsonaro afirmou que era suficiente a previsão na CLT de que homens e mulheres devem ser remunerados da mesma forma. Ele afirmou que eventuais descumprimentos das empresas deveriam ser corrigidas pela Justiça.

Bancada do Senado fez mobilização

A volta do projeto à Câmara causou desconforto entre as senadoras. Havia um entendimento de que durante a pandemia pequenas alterações, como a realizada nesta proposta, não demandariam nova análise da proposta.

A mudança feita pelo Senado estabeleceu que será o juiz que analisar a ação o responsável por estabelecer a multa, que pode chegar até cinco vezes a diferença salarial entre o homem e a mulher.

Na última semana, as senadoras fizeram forte mobilização para pressionar o presidente Jair Bolsonaro pela sanção do texto. Na ocasião, parte da bancada feminina do Senado foi às redes sociais e promoveram algumas hashtags, entre elas a #PL130SancionaPresidente .

A senadora Simone Tebet (MDB-MS) escreveu que “o argumento de que a luta pela igualdade no mercado de trabalho prejudica a empregabilidade das mulheres reforça essa desigualdade. Queremos justiça e respeito”.

Fazendo uma menção mais direta à possibilidade de veto por parte do presidente Bolsonaro, esteve a manifestação da senadora Mara Gabrilli (PSDB-SP). “Congresso aprova lei que multa empresas por diferença salarial entre homens e mulheres, mas Bolsonaro cogita vetar. Mulheres estão cansadas de falta de equidade. Não precisamos de um presidente para perpetuar desigualdades”, escreveu.

Também se manifestaram as senadoras Daniella Ribeiro (PP-PB), Eliziane Gama (Cidadania-MA), Leila Barros (PSB-DF), Kátia Abreu (PP-TO), Rose de Freitas (MDB-ES) e Zenaide Maia (PROS-RN).

Mulheres ganham menos

Pesquisa do IBGE revelou que no Brasil a média salarial das mulheres é ainda muito distante da dos homens. Em 2019, elas ganhavam 77,7% do salário médio de homens. A diferença é ainda maior nos cargos de liderança ou gerência nas empresas. Elas ganham 61,9% da média salarial deles.

Em geral, as mulheres são mais escolarizadas do que os homens – 19,4% das mulheres com mais de 25 anos tinham curso superior em 2019, contra 15,1% dos homens na mesma faixa etária. Mulheres com filhos sentem mais dificuldades para se colocar no mercado de trabalho, e também dedicam o dobro do tempo dos homens aos cuidados com a casa: são 21,4 horas semanais.

    Mais Recentes

      Comentários

      Clique aqui e deixe seu comentário!