O desânimo do mercado financeiro com a situação econômica do país — seja por recrudescimento da pandemia e vacinação lenta, intervencionismo do governo em estatais como Petrobras e Banco do Brasil ou pela agenda de reformas parada — já se reflete nos principais ativos neste início de ano.
Na ponta do lápis, os arroubos intervencionistas do governo saíram caro. Só este ano, o valor de mercado somado de Petrobras , BB e Eletrobras — cujo presidente Wilson Ferreira Junior se demitiu em janeiro por conta do atraso na privatização — encolheu R$ 97 bilhões.
Além disso, a curva de juros futuros dos contratos com prazo de dez anos passou de 7,19%, no início de janeiro, para 9,32%, no fim de março. No mesmo período, o risco-país , medido pelo Credit Default Swap (CDS), uma espécie de seguro contra calotes do Brasil, saltou de 143,5 pontos para 231, uma alta de 87,5 pontos.
"Terminamos 2020 com estimativas mais positivas para o Brasil, com esperança de avanço da vacinação e um superciclo de commodities, com a recuperação da economia da China. Com excesso de recursos pelo mundo, esperava-se que os investimentos viriam por osmose para o país. Mas essas expectativas foram se deteriorando neste início do ano, e os principais ativos refletem esse movimento", diz Matheus Spiess, economista e especialista em investimentos da Empiricus Research.
A entrada de capital estrangeiro na Bolsa murchou a partir de fevereiro, quando o presidente Jair Bolsonaro , incomodado com a alta dos combustíveis , anunciou a troca de comando na Petrobras .
Até fevereiro, o saldo entre compra e vendas de ações na B3 era positivo em R$ 28 bilhões. No final de março, esse saldo ainda está positivo, porque os ativos brasileiros estão baratos em dólar , mas caiu para R$ 11,8 bilhões.
Termômetros do mal-estar
Desde o conturbado anúncio da troca de comando da maior empresa do país, o saldo nunca mais ficou acima de R$ 20 bilhões, lembram analistas, o que sinaliza a desconfiança do investidor estrangeiro.
"A intervenção na Petrobras e no Banco do Brasil, que levou o presidente da instituição a pedir demissão, elevou a percepção de risco das estatais , traz insegurança jurídica e coloca em xeque o projeto de privatizações", observa Gustavo Bertotti, economista-chefe da Messi Investimentos.
Os R$ 97 bilhões que "evaporaram" do valor de mercado das estatais equivalem à soma do valor de mercado de Braskem (R$ 31 bilhões), Gerdau (R$ 48 bilhões) e BRF (R$ 20 bilhões).
"O ano está sendo marcado pela frustração com o governo , com a pouca adesão à agenda liberal , o intervencionismo e um falso dilema entre salvar vidas ou a economia , com atraso na vacinação . A palavra de ordem agora é incerteza , e o mercado quer previsibilidade", diz Maurício Pedrosa, estrategista da Arena investimentos.
Pedrosa observa que há dois principais termômetros da incerteza dos investidores em relação aos rumos do país: o dólar e os juros . A curva de juros futuros de longo prazo vem "empinando" cada vez mais desde o início do ano. E, enquanto em outros países a alta da moeda americana foi moderada, aqui ela foi mais forte.
No ano passado, o dólar subiu mais de 30% frente ao real. No primeiro trimestre de 2021, a moeda valorizou mais 6%.
"Estes são os termômetros do mal-estar do mercado com o governo, que refletem os estrangeiros saindo da Bolsa", afirma Pedrosa.
Um dos grandes fantasmas que está no radar dos investidores é a deteriorada situação fiscal do país . Eles entendem que a pandemia trouxe a necessidade de gastos extras ao governo para ajudar os brasileiros mais pobres e manter a economia pulsando.
Mas a aprovação de um Orçamento inexequível e cheio de manobras fiscais pegou muito mal junto ao mercado.
A própria reforma ministerial , mesmo que tenha trazido nomes mais alinhados com os líderes do Congresso, que foram apoiados pelo governo e defendem pautas mais liberais, foi feita de forma atabalhoada pelo Palácio do Planalto e criou atrito com os militares. Esses movimentos abruptos, causam mal-estar para o investidor.
"A política e a economia estão vinculadas, e os ativos de risco ficam mais sensíveis com as perspectivas futuras diante desses movimentos", lembra Spiess, da Empiricus.
Debate eleitoral antecipado
Outro fator que causa apreensão é a antecipação do debate eleitoral de 2022. Isso, na visão dos analistas, encurta o tempo para que se avance em privatizações importantes ainda neste ano e também na aprovação das reformas estruturais.
Como o mercado está precificando tudo o tempo todo, existe a possibilidade desse cenário mudar. Se a vacinação ganhar ritmo, a economia reabrir totalmente com o controle da pandemia , o desemprego recuar, as reformas andarem e o presidente não tomar um caminho mais populista para tentar se reeleger, a percepção do mercado tende a mudar para um cenário mais positivo.
"O Brasil continua tendo ativos muito atraentes e está barato em dólar . Pode retomar uma trajetória mais sustentável de crescimento, com a volta do investimento e com as agendas de produtividade e fiscal entrando na pauta", comenta Spiess
Sinais que chamaram atenção
Alta dos juros futuros:
A curva de juros futuros dos contratos com prazo de dez anos passou de 7,19%, no início de janeiro, para 9,32%, no fim de março, numa sinalização do desânimo do mercado com a economia do país.
Piora do risco-país:
O risco-país, medido pelo Credit Swap Default (CDS), uma espécie de seguro contra calotes do Brasil, saltou de 143,5 pontos, em janeiro, para 231 pontos, em março, uma alta de 87,5 pontos.
Queda do saldo na Bolsa:
Até fevereiro, o saldo entre compra e vendas de ações na B3 era positivo em R$ 28 bilhões. Março ainda fechou com saldo positivo, porque ativos brasileiros estão baratos em dólar, mas de R$ 11,8 bilhões.
Perda de valor de mercado das estatais:
Só este ano, o valor de mercado somado de Petrobras, BB e Eletrobras encolheu R$ 97 bilhões. Esses recursos equivalem à soma do valor de mercado de Braskem (R$ 31 bi), Gerdau (R$ 48 bi) e BRF (R$ 20 bi).
Valorização do dólar:
Enquanto em outros países a alta do dólar foi moderada, no Brasil ela foi forte. No ano passado, o dólar subiu mais de 30% frente ao real. No primeiro trimestre de 2021, a moeda valorizou mais 6%.