Mais de 20 milhões de brasileiros realizaram sua primeira compra pela internet no ano passado, segundo um estudo realizado pela Associação Brasileira de Comércio Eletrônico (ABComm), em parceria com a Neotrust. O balanço das vendas on-line em 2020 registrou um crescimento de 68% , com um faturamento de R$ 126,3 bilhões , e mais de 300 milhões de pedidos realizados pelos consumidores.
A popularização desse mercado foi impulsionada principalmente pela pandemia, que manteve as lojas físicas fechadas durante os primeiros meses da crise sanitária no Brasil — e, mesmo depois da reabertura do comércio, fez com que a população continuasse optando pelas compras à distância.
— O comércio eletrônico vem crescendo no Brasil nos últimos 10, 15 anos, independentemente de governo ou crise. Mas os números de 2020 são bastante expressivos, e mostram o papel importante que o e-commerce teve para o distanciamento social — afirma Rodrigo Bandeira, vice-presidente da ABComm.
Apesar das vantagens das compras on-line, porém, o crescimento desse setor faz surgirem dois problemas: o aumento do número de golpes, e um maior risco de endividamento da população, atraída pelas facilidades e variedade que a internet oferece.
Um estudo da empresa de cibersegurança Kaspersky mostrou que o número de ameaças contra dispositivos móveis cresceu mais de 120% no início da pandemia, atingindo principalmente os brasileiros, que são os maiores alvos de ataques de phishing no mundo, com índice de 20% contra média global de 13%.
— O phishing é um ataque muito voltado para quem compra on-line, e o aumento do consumo na internet é um incentivo gigantesco para que o fraudador continue cometendo esses crimes — alerta Fabio Assolini, analista sênior de segurança da Kaspersky.
Esse tipo de golpe ocorre por meio do envio de mensagens atrativas aos consumidores, seja por e-mail, SMS ou WhatsApp, oferecendo promoções ou vantagens na compra de algum produto em uma loja falsa. O objetivo é roubar os dados pessoais da vítima e clonar o cartão de crédito.
Segundo Assolini, boa parte dos brasileiros ainda tem muita dificuldade para identificar mensagens maliciosas e sites falsos, o que aumenta a vulnerabilidade diante desses golpes, principalmente entre quem ainda não está totalmente familiarizado com o comércio eletrônico.
— Uma técnica comum em todos os ataques é oferecer produtos a preços muito mais baixos do que o mercado. Há os fraudadores que usam os nomes de empresas já estabelecidas, e também aqueles que criam empresas do zero, mas que parecem legítimas. Depois, clonam o cartão e vendem os dados da vítima para outros fraudadores ou usam esses dados em outros golpes.
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Atenção às compras por redes sociais
A pandemia fez crescer também o número de novas lojas virtuais, incluindo comércios informais em redes sociais como o Facebook e o Instagram. Segundo Rodrigo Bandeira, para pequenos comerciantes, artesãos e pessoas que trabalham com venda direta essas mídias são um canal importante e com grande potencial, mas é necessário capacitação para que esses negócios sejam sustentáveis.
— Redes sociais são onde o consumidor está, e não só as grandes empresas estão presentes, mas as pequenas também encontraram aí uma possibilidade de manter os negócios abertos. Mas as empresas precisam ter escala e planejamento, mesmo para atuar dessa forma — ressalta.
Fabio Assolini, da Kaspersky, afirma que esse tipo de transação tem mais riscos, pois as redes sociais não se responsabilizam pelas vendas que ocorrem em suas plataformas. É diferente dos marketplaces, como Lojas Americanas, Mercado Livre e Amazon, em que as empresas são solidárias, ou seja, têm responsabilidade jurídica.
— Nas redes sociais, as compras também costumam ser feitas por transferência bancária e boleto, modalidades nas quais é mais difícil reaver o dinheiro em caso de golpe. A compra é mais arriscada. Então, é preciso ter mais cuidado, conversar com pessoas que já compraram e ver se a loja é realmente confiável — diz Assolini.
Tentação para gastar é maior na internet
O percentual de famílias endividadas (com dívidas em atraso ou não) no país chegou a 66,5% em janeiro deste ano, segundo uma pesquisa feita pela Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC). Desse total, 80,5% correspondem a dívidas com o cartão de crédito, atingindo um patamar histórico.
Professora de Finanças da Fundação Getulio Vargas (FGV) e planejadora financeira, Myrian Lund afirma que o crescimento do comércio eletrônico é um fator que pode colaborar para o endividamento, já que os estímulos para comprar são maiores na internet.
— Tudo que é muito fácil acaba fazendo com que você compre mais. Hoje na internet se você pesquisa um produto, aparecem várias sugestões de compra. São gatilhos que estimulam os nossos desejos — explica a professora, ressaltando que o consumidor deve criar meios de se proteger contra esses estímulos: — O melhor é evitar ter um limite muito alto no cartão de crédito, e fugir também dos parcelamentos. Priorize compras parceladas de bens duráveis ou viagens, por exemplo.
Outra dica da especialista é refletir sobre a real necessidade da compra antes de fazer o pagamento.
— Resistir às tentações é um desafio. Por isso, antes de comprar algo, o ideal é esperar um ou dois dias, para dar tempo de acionar a razão. Muitas vezes, o consumidor vai até esquecer do produto — diz.