Em poucas horas, o terminal de Viracopos , em Campinas (SP), deve enfrentar a maior turbulência desde que foi concedido à iniciativa privada em 2012. Gestora do sexto maior aeroporto do país, a concessionária Aeroportos Brasil Viracopos, em recuperação judicial desde maio de 2018, deve reunir-se com seus credores nesta quinta-feira (27) para discutir formas de saldar suas dívidas, hoje em torno de R$ 2,8 bilhões.
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A assembleia, marcada para às 14h, pode não ocorrer. Credores como o BNDES , dono de quase 90% da dívida, ainda não estão satisfeitos com os termos das propostas da concessionária e devem faltar à sessão. Neste caso, a assembleia será remarcada para 1º de agosto.
Desde a concessão à iniciativa privada, o terminal de Viracopos teve a capacidade ampliada em seis vezes – atualmente está em 25 milhões de passageiros ao ano. Pelo plano diretor do aeroporto, até 80 milhões de passageiros podem circular por ali em 2040, o que o tornaria um dos maiores do mundo.
Por ora, Viracopos já é reconhecido como um dos melhores terminais do país, além de ter virado um dos principais hubs a destinos no interior graças à presença da Azul, terceira maior companhia aérea do Brasil . Como se não bastasse a conectividade com os rincões, Viracopos é hoje uma das principais portas de entrada a turistas estrangeiros ao Brasil, ao lado de Guarulhos, Brasília e Galeão. Diante de tantas conquistas, por que um aeroporto desse porte entrou em recuperação judicial – e qual será o futuro dessa concessão?
Como é de esperar em uma recuperação judicial , credores e devedores dão versões diferentes – e preferem falar sob condição de sigilo – sobre os motivos para a concessão de Viracopos ter entrado no atual modo “voo em parafuso”. Uma coisa é certa: na origem do problema estão as condições do leilão de concessão do aeroporto, em fevereiro de 2012.
Tido como vitorioso pelo governo petista de Dilma Rousseff
, o certame tinha como critério de escolha do vencedor a proposta com maior ágio sobre o valor proposto pela União. A ideia do governo era arrecadar: no caso de Viracopos, o consórcio Aeroportos Brasil, formado pelas construtoras Triunfo Participações e Investimentos (45%) e UTC Participações (45%), além da operadora francesa Egis Airport Operation (10%), ofereceu R$ 3,8 bilhões pelo terminal – 159,75% acima do patamar inicial estipulado pelo governo.
Obrigações financeiras
Pelas regras do leilão , a dinheirama podia ser financiada por bancos públicos e parcelada ao longo do contrato de concessão. Foi o suficiente para soltar o “espírito animal” dos investidores ávidos por elevar os lances em nome da posse dos ativos.
"Nos preparativos para o leilão, investidores e governo estavam muito otimistas sobre o sucesso dessa concessão", diz a advogada Letícia Queiroz de Andrade, sócia do Queiroz Maluf, um dos maiores escritórios especializados em concessões de infraestrutura do país, de São Paulo.
O problema é que, além do ágio, os vencedores precisaram arcar com o pagamento das outorgas (valor pago ao governo pelo uso de bem público) já nos primeiros meses de contrato. Por fim, comprometeram-se a investir maciçamente nos primeiros dois anos da concessão em obras para preparar os terminais a receber os turistas rumo ao Brasil na Copa do Mundo de 2014 – no caso de Viracopos, R$ 1,8 bilhão.
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Tudo isso somado causou uma verdadeira “pororoca” de obrigações financeiras logo nos primeiros meses de concessão, dizem tanto fontes ligadas à concessionária de Viracopos como as do governo federal. Tanto é que a penúria de Viracopos motivou mudanças nas regras dos leilões seguintes.
No mais recente, em março deste ano, os ágios precisaram ser pagos com recursos próprios e logo após o certame, reduzindo os valores. As vencedoras ganharam carências de até cinco anos para começar a pagar as taxas de outorga. As concordâncias entre União e concessionária sobre as causas do rolo de Viracopos terminam aí.