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Sede da Petrobras no centro do Rio de Janeiro
Tânia Rêgo/Agência Brasil
Sede da Petrobras no centro do Rio de Janeiro

Em 2007, quando o governo brasileiro anunciou a descoberta das reservas do pré-sal, os preços do petróleo viviam um processo de ascensão surpreendente que teria seu ápice no patamar de US$ 140 o barril, no ano seguinte. Entusiasmado, o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva defendeu que o Brasil havia ganhado um "bilhete premiado". "É nosso passaporte para o futuro", disse.

A ideia do governo, na época, era usar essas reservas para impulsionar um projeto de desenvolvimento: parte dos recursos provenientes da exploração do petróleo seria direcionada a um fundo para a educação; além disso, regras de conteúdo local garantiriam o avanço, no País, de diversos setores – da indústria naval ao fornecimento de peças e serviços para a construção de plataformas.

Nove anos depois, a indústria petrolífera brasileira vive uma ressaca desse entusiasmo. E não apenas em função da Operação Lava Jato, que paralisou parte das operações da Petrobras. Ou da alta do dólar, que apertou as finanças da estatal, bastante endividada na moeda americana.

Para completar o que parece ser uma "tempestade perfeita", no início da semana o barril tipo Brent, negociado em Londres, atingiu US$ 30,43 dólares, valor mais baixo desde 2004. Em Nova York, o barril de West Texas Intermediate (WTI) caiu para baixo da casa dos US$ 30 pela primeira vez desde dezembro de 2003.

E analistas de instituições financeiras como o banco Goldman Sachs não descartam que o produto chegue ao patamar de US$ 20 ainda neste ano, embora muitos também esperem uma gradual recuperação dos preços no médio prazo.

"É um patamar de preços que lança dúvidas sobre as margens de lucro que podem ser obtidas com a exploração do pré-sal e reservas não convencionais mundo afora", opina David Zylbersztajn, ex-diretor geral da Agência Nacional de Petróleo.

"O que fica claro é que o pré-sal nunca foi um passaporte para o futuro nem um bilhete premiado. Foi um erro apostar tantas fichas em um setor que, apesar de extremamente importante e relevante, também é volátil."

A Petrobras diz que conseguiu alcançar um custo de extração no pré-sal da ordem de US$ 8 o barril, o que mantém a extração como vantajosa. Segundo a empresa, a extração dessas reservas estaria, inclusive, superando as expectativas.

"A constatação da melhor produtividade dos poços do pré-sal em relação ao previsto na época da descoberta, associada aos ganhos de eficiência que obtivemos na construção de poços, tem permitido reduzir significativamente os investimentos previstos", diz a Petrobras em comunicado à BBC Brasil, citando a "diminuição do número de poços a serem construídos e o menor tempo gasto para construí-los" e alegando que isso tem dado competitividade à exploração, mesmo com os preços baixos.

"A produção média por poço no pré-sal tem se mostrado bem superior à média mundial e, ao mesmo tempo, o tempo necessário para a construção dos poços foi reduzido em mais de 50% nos últimos cinco anos", agrega a empresa. "Paralelamente, o atual cenário de baixos preços do petróleo no mercado mundial tem levado a uma redução dos custos, por parte dos fornecedores, de diversos bens e serviços utilizados."

Walter de Vitto, analista de energia da Consultoria Tendências, porém, explica que para viabilizar novos investimentos o custo se torna maior – algo em torno de US$ 40 e US$ 50. "O pré-sal sem dúvida é uma benesse, algo positivo para o Brasil, mas talvez seja a hora de repensar a estratégia para explorar essa riqueza, levando em conta a volatilidade desse mercado", opina Vitto.

"Parece que foi um erro, por exemplo, ter atrasado a exploração em quase dois anos em um momento em que os preços estavam nas alturas para se conseguir definir um novo marco regulatório."

Causas

Analistas atribuem a recente queda do petróleo a três fatores. "Para começar, como o produto é cotado em dólar, no geral seus preços tendem a cair quando a moeda americana se valoriza, como agora", diz de Vitto.

Um segundo fator de pressão sobre os preços seria o excesso de oferta. "A questão é que quando os preços do petróleo estavam altos foram feitos muitos investimentos e abertas novas áreas de exploração", explica Adriano Pires, do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE).

Como resultado, a produção se expandiu em um momento em que a economia global não cresce muito e, portanto, a demanda não está grande. "Por isso, o que temos é basicamente um problema de oferta", diz Pires.

Para completar, houve uma mudança na estratégia dos grandes produtores da commodity, como a Arábia Saudita. No passado, esses países costumavam fazer cortes em sua produção para manter os preços relativamente estáveis, sempre que havia uma queda significativa. Hoje, porém, com a abertura de novas áreas de exploração, esses países hesitam em adotar essa estratégia com medo de perder mercado.

"Os preços podem continuar caindo até maio e poderiam chegar a US$ 20. Mas a grande questão para a indústria petrolífera não é tanto até onde podem cair, mas por quanto tempo devem se manter nesse patamar mais baixo", diz de Vitto.

"E, felizmente para as empresas e países produtores, acho que há certo consenso de que no segundo semestre já deve haver uma recomposição de preços para a casa dos US$ 40 ou US$ 50, que seria até maior não fosse a perspectiva de o Irã voltar a esse mercado com o fim das sanções ao país."

Pires, do CBIE, concorda que no médio prazo a tendência é de alta. "Com o principal problema é o excesso de produção, conforme as empresas ajustem seus planos de negócios a essa nova realidade teremos uma recuperação gradual dos preços", opina.

Revisões

Com a queda nas expectativas de receita, muitas empresas do setor de fato já estão anunciando uma revisão de seus planos de negócios e investimento mundo afora. Principalmente nas áreas de exploração mais caras. A britânica BP, por exemplo, anunciou que irá cortar 4 mil empregos em suas atividades de produção e exploração em diversos países.

A própria Petrobras nesta terça-feira anunciou uma redução de quase 25% em sua previsão de investimento para o período 2015-2019 em um comunicado no qual citou a mudança de patamar dos preços do petróleo e do câmbio.

No novo plano de negócios, a empresa projeta o petróleo a US$ 45 na média para 2016 e prevê que um corte de investimentos de US$ 32 bilhões do que era previsto inicialmente.

"São mais de US$ 30 bilhões que deixarão de ser investidos na economia e isso evidentemente terá um efeito relevante em toda a cadeia produtiva do setor, na geração de empregos e etc.", diz Zylbersztajn. "Por isso, o País perde no médio e longo prazo."

No curto prazo, como ressaltam de Vitto e Pires, é difícil dizer se o Brasil ganha ou perde com a queda do petróleo.

O País ainda é um importador de derivados dessa commodity e uma baixa dos preços tende a reduzir os custos dessas compras, aliviando a pressão sobre a balança comercial brasileira.

Além disso, como os preços dos combustíveis não foram reduzidos internamente, a Petrobras tem ganhado com a diferença de preços entre os mercados interno e externo. "Mas essa é uma situação que, cedo ou tarde, a empresa será pressionada a mudar”, diz de Vitto.

“Trata-se de uma peculiaridade do mercado brasileiro, mas acho que dá para dizer que, do ponto de vista da estatal petrolífera, uma queda do preço do petróleo é sempre uma má notícia. E ao afetar os investimentos no setor, o Brasil também perde", opina De Vitto.

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