Em novo aceno a senadores em busca de votos para aprovar a PEC dos Precatórios, o governo sinaliza que aceita algumas mudanças no texto da proposta de emenda à Constituição que altera regras para pagamento de dívidas judiciais da União e o cálculo do teto de gastos.
O objetivo é acelerar a aprovação da PEC — votada na Câmara na semana passada — no Senado para viabilizar o pagamento de um Auxílio Brasil de no mínimo R$ 400 ainda este ano.
Os senadores fariam um fatiamento da PEC dos Precatórios: tudo o que está previsto no texto aprovado na semana passada pelos deputados seria votado pelos senadores até o dia 30, evitando a necessidade de nova votação na Câmara.
Já as alterações em discussão seriam agrupadas em outra proposta, uma PEC “paralela”.
A PEC abriria espaço no Orçamento de 2022 de R$ 91,6 bilhões. Como ainda não tem os 49 votos necessários para aprovação entre os 81 senadores, emissários de Bolsonaro e do ministro da Economia, Paulo Guedes, começaram a negociar.
O governo corre contra o tempo para agilizar a tramitação, pois a PEC é considerada crucial para viabilizar o Auxílio Brasil no valor de R$ 400. E o governo deseja iniciar o pagamento do benefício turbinado ainda em dezembro.
As conversas são coordenadas pelo líder do governo no Senado, Fernando Bezerra (MDB-PE), que se encontrou com os presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), na quinta-feira para discutir as ideias.
Veja a seguir as principais mudanças que senadores e o governo estão discutindo:
1 - Recursos extras restritos à área social
Líderes governistas discutem um acordo para criar uma forma de vedar que a margem fiscal aberta com a aprovação da PEC dos Precatórios seja usada para elevar salários de funcionários públicos. A ideia é destinar recursos exclusivamente a políticas sociais.
Em viagem ao exterior, o presidente Jair Bolsonaro afirmou esta semana que poderia dar um aumento linear a todos os servidores federais se a PEC dos Precatórios for aprovada. O governo chegou a discutir um reajuste de 5% em 2002, abaixo da inflação, mas que criaria uma despesa permanente nova de R$ 15 bilhões nas estimativas de técnicos da equipe econômica.
No entanto, o Congresso dá sinais de que se articula para barrar qualquer tentativa de reajuste ao funcionalismo em ano de eleição.
O que se discute é incluir no texto a vinculação para que todo o espaço no Orçamento a ser aberto pela proposta seja destinado ao Auxílio Brasil, a programas de assistência social e ao reajuste pela inflação de despesas obrigatórias (Previdência Social, abono salarial e seguro-desemprego).
A vinculação do espaço fiscal a gastos sociais é uma demanda de senadores, especialmente das bancadas do MDB e do PSD, que não querem ver o dinheiro da PEC ser canalizado para esses gastos.
2 - Tornar o Auxílio Brasil de R$ 400 permanente
Pelo atual desenho do programa social que substitui o Bolsa Família, o valor do benefício é de R$ 220 mensais, mas será pago um complemento para atingir R$ 400 somente até dezembro de 2022 — pouco depois da eleição, na qual o presidente Jair Bolsonaro pretende concorrer à reeleição.
O novo Bolsa Família é considerado a principal vitrine da campanha de reeleição. O que se espera no governo é um efeito na popularidade do presidente parecido ao que teve o auxílio emergencial de R$ 600 em 2020.
Para determinar que o valor do benefício seja elevado de forma definitiva, será preciso avançar em outros projetos em tramitação no Senado que gerem fonte de recursos, como a reforma do Imposto de Renda.
De acordo com o texto apresentado pelo governo e aprovado pelos deputados, o país voltaria a tributar dividendos, uma ideia que encontra resistência entre especialistas e parlamentares. Com base nesses recursos, seria possível criar a compensação tributária para reajustar o Auxílio Brasil acima da inflação e cumprir a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).
"O problema é explicar no texto de onde virão os recursos para os anos subsequentes. Neste caso, o auxílio se transformaria em uma despesa permanente e, como tal, é preciso apontar uma fonte permanente (de custeio)", disse o ministro da Cidadania, João Roma.
O debate sobre o adicional do benefício do Auxílio Brasil valer somente até o fim de 2022 gerava desconforto no Senado. Além de significar uma pressão para quem for eleito para ocupar o Palácio do Planalto a partir de 2023, o caráter temporário é visto como benefício eleitoreiro.
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"É inadmissível que o Auxílio Brasil seja temporário e termine em 2022. Isso não cheira bem. Seja para um número menor ou maior, essa política tem que ser permanente. Aprovamos por unanimidade no Senado a renda básica ao povo brasileiro. Essa PEC não pode ter um projeto que seja temporário até dezembro de 2022. Enquanto houver miséria e pobreza neste país, a política pública é permanente, nós aprovamos isso. Portanto, uma das posições que precisam ser construídas para que essa PEC possa andar é que esse projeto não pode ser mais temporário", disse o líder do MDB no Senado, Eduardo Braga (AM).
3 - Fiscalizar precatórios
Na negociação em torno da PEC, um tema debatido é o pagamento dos precatórios, dívidas da União reconhecidas pela Justiça e que não cabem mais recurso. Entre os credores estão pessoas físicas, empresas, estados e prefeituras.
Os senadores querem prever a criação de um grupo para fiscalizar os pagamentos de precatórios. Este é um pleito antigo dos estados, que têm muita influência no Senado.
4 - Fatiar a proposta em duas PECs
Para conciliar a agilidade de tramitação e vencer resistências no Senado, o texto poderia ser fatiado. Dessa forma, tudo que for proposto a partir de agora seria analisado em uma PEC paralela, que seria votada pela Câmara após a análise do Senado, o que inclui a trava ao reajuste de servidores.
O presidente da Câmara acenou com a possibilidade de votar essas mudanças até 16 de dezembro, de acordo com fontes que participaram da reunião.
Além de ser a chave para o Auxílio de R$ 400, a PEC dos Precatórios modifica a regra do teto de gastos, o principal parâmetro dos investidores, e cria uma fila de credores para o pagamento de precatórios — decisões judiciais das quais a União não pode mais recorrer.
Tudo que for consensual e idêntico ao texto aprovado na Câmara seria votado pelos senadores até o dia 30 deste mês e entraria em vigor. Nessa parte estaria a mudança na regra do teto de gastos e a fila de credores dos precatórios. O que for mudado voltaria para a Câmara.