POR VITOR HUGO TERRES
A cada década, as grandes cidades brasileiras se debruçam sobre o futuro. Vereadores, prefeitos e sociedade civil discutem e dialogam em busca de alternativas que reformem não só a estrutura física dos municípios, mas que levem em consideração novos estilos de vida dos cidadãos e as consequências que derivam disso.
Um bom exemplo é o novo Plano Diretor da cidade de São Paulo, aprovado em junho de 2023 pela Câmara Municipal. Gigantesca por si só, a cidade é constantemente atravessada por novidades tecnológicas, mas também pelas tendências dos grandes conglomerados urbanos espalhados pelo mundo, que absorvem inovações quanto à mobilidade, moradia, cotidiano, e agora recebem a companhia de um novo agente transformador: as mudanças climáticas.
Soluções são imperativas e a tecnologia é bem-vinda
Quer um exemplo? Cidade esponja. Explico. O termo, criado nos anos 1990 nos Estados Unidos, trata do impacto que as grandes trombas d’água podem causar nos aglomerados urbanos. Para manejar tamanha pancada, as superfícies dessas cidades passam a ser aliadas à medida que ao adotar jardins filtrantes, pavimentos permeáveis, pisos verdes conseguem absorver boa parte dessa água despejada do céu e impedir os costumeiros alagamentos, entre outras situações.
Do mesmo modo, a China, no fim de 2014, formatou um programa que deu voz a esse rol de iniciativas esponjas. Batizada de Programa de Cidades Permeáveis, a ideia é que, até 2030, 80% das áreas urbanas do país adotem medidas sob essa direção, com o objetivo de evitar alagamentos, prejuízos à qualidade de água e outros problemas.
Muito embora a iniciativa chinesa e de planos diretores sejam louváveis, é preciso adotar um conjunto de medidas para tirar essas soluções do papel. Impostos, financiamentos e isenções fiscais precisam estar em pauta. Mas não só isso. Também é importante levar em conta a depreciação dos ativos, porque uma vez feito o investimento, há uma taxa de retorno a ser considerada no horizonte.
Revolução nos usos e costumes
Contudo, nada disso ganhará a superfície se não houver vontade legislativa que garanta segurança jurídica. Há uma legítima demanda por iniciativas verdes, mas o consumidor também só vai se engajar se a oferta couber em seu orçamento. E fazer caber é um papel do setor produtivo.
Um desdobramento óbvio dessa intrincada discussão é que as Soluções Baseadas na Natureza (SbNs) acabam por se colocar no centro desse debate. Até porque a Organização das Nações Unidas (ONU), em 2022, as classificou como um dos pilares de desenvolvimento sustentável hoje no planeta.
Um ponto relevante e que reverberou no Fórum Econômico Mundial de 2024, em Davos, Suíça, com a apresentação de uma pesquisa que elencou os três maiores riscos para o desenvolvimento da humanidade: a desinformação, os eventos climáticos extremos, e polarização social, respectivamente.
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E se a pergunta fosse direcionada para daqui a dez anos? Qual seria o resultado? O saldo foi ainda mais preocupante. Para CEOs, políticos, grandes banqueiros, pessoas do mercado financeiro, economistas renomados e em ascensão, os eventos climáticos extremos, seguido das mudanças críticas no funcionamento do planeta, e os danos à biodiversidade compõem o cenário em uma década. Em outras palavras, há trabalho árduo pela frente.
A aplicabilidade desse rol de estratégias demanda a adoção de medidas que obedeçam a lógica socioeconômica. Não é possível ignorar a questão financeira e tampouco deixar para lá o aspecto cultural. Eles precisam caminhar juntos.
Naturalmente, os jardins filtrantes não são a única alternativa, apesar de serem baratos e eficientes. Há também quem defenda desenterrar rios, que foram colocados debaixo do asfalto no momento da urbanização de bairros e cidades, ou mesmo reverter canalizações de córregos.
Tem também a discussão sobre a descarbonização do meio ambiente, com diversas iniciativas como aquelas ancoradas em crédito de carbono. A lista é extensa quando se fala de Soluções Baseadas na Natureza.
O fato é que as grandes metrópoles brasileiras, bem como as cidades de porte médio do país já não se podem dar ao luxo de não discutir a substituição do concreto e a consequente adoção de soluções mais verdes.
O que estamos vendo nesse início de 2024 ratifica a necessária tomada de decisões. Já não é mais possível imaginar que discussões sobre a organização da vida cotidiana em grandes aglomerados urbanos seja feita somente em janelas de oportunidade, como planos diretores ou medidas isoladas.
É preciso tirar da frente o conceito de isolamento e tratar o problema sob a égide de compartilhamento. Porque continuaremos a gerar esgotamento sanitário, produzir carros, pavimentar estradas, erguer bairros, mas isso precisa ser feito em harmonia com a natureza, não de maneira dissociada.
Sob essa perspectiva, as SbNs deixaram de ser uma alternativa. Elas passam a ser solução. E precisam ser vistas como política de Estado e não mais de governo.
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Vitor Hugo Terres – Engenheiro Civil e diretor de operações da Phytorestore no Brasil.
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