Paulo Guedes possui offshore milionária em paraíso fiscal

Negócio é considerado conflito de interesses para servidores públicos do alto escalão

Offshore foi descoberta por meio de apuração internacional
Foto: Edu Andrade/ ME
Offshore foi descoberta por meio de apuração internacional


O ministro da Economia, Paulo Guedes, é dono da offshore Dreadnoughts International, nas Ilhas Virgens Britânicas, um paraíso fiscal situado no Caribe. Ele abriu o negócio em setembro de 2014 às vésperas da eleição vencida por Dilma Rousseff (PT).


A abertura de uma offshore, tipo de empresa aberta em lugares onde há menor ou nenhuma tributação , ou mesmo de contas no exterior não é ilegal desde que o proprietário declare à Receita Federal e ao Banco Central os valores guardados fora do país. No entanto, servidores públicos como Guedes atendem a outras regras.


Segundo a revista Piauí, o artigo 5º do Código de Conduta da Alta Administração Federal proíbe funcionários do alto escalão de manter aplicações financeiras, seja no Brasil ou no exterior, passíveis de serem afetadas por políticas governamentais. Como Guedes é ministro da Economia, sua offshore configura conflito de interesse.


As informações foram obtidas pelo projeto Pandora Papers, do Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos (ICIJ). Eles tiveram acesso a 11,9 milhões de documentos sobre offshores em paraísos fiscais. Essa apuração específica da Piauí identificou que Guedes abriu a conta numa agência do banco Crédit Suisse, em Nova York, com 9,55 milhões de dólares. Na época, esse valor equivalia  a R$ 23 milhões. Hoje, ele é convertido para R$ 51 milhões.


Por infringir essa regra, Guedes poderia ser punido de diferentes formas, que vão de uma leve advertência à recomendação de demissão. À revista, ele disse que informou sobre seus investimentos no exterior à Comissão de Ética Pública, como deve ser feito. O colegiado, no entanto, só julgou o caso dois anos e meio depois, em julho de 2020, e entendeu que não havia nenhuma irregularidade. Sendo assim, não fez nenhuma recomendação a Guedes e arquivou o caso. Procurada para responder mais esclarecimentos, a comissão justificou que as informações contidas no julgamento são sigilosas "em face dos dados sensíveis que delas constam - inclusive fiscais e bancários".


Já Guedes respondeu em nota, por meio de sua assessoria. "Toda a atuação privada do ministro Paulo Guedes, anterior à investidura no [atual] cargo, foi devidamente declarada à Receita Federal e aos demais órgãos competentes, o que inclui a sua participação societária na empresa mencionada", diz um trecho do texto.



Não é possível dizer a motivação que o levou a abrir a offshore, mas a publicação contextualiza que razões comuns para isso, segundo especialistas, é a possibilidade de blindar o patrimônio de instabilidades políticas e fugir de tributações mais elevadas. No caso do ministro, a offshore foi criada em 25 setembro de 2014, um dia após o Banco Central intervir para conter a alta do dólar diante da agitação do mercado com a iminente reeleição de Dilma.


Outro caso na equipe econômica

Além de Paulo Guedes, outra autoridade envolvida no caso Pandora Papers é o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto . Nos documentos a que o ICIJ teve acesso, ele consta como dono da Cor Assets S.A., uma offshore localizada no Panamá, outro paraíso fiscal.


A situação de Campos Neto, entretanto, é um pouco diferente porque ele criou sua offshore em 2004, com capital de 1,09 milhão de dólares - o valor equivalia a 3,3 milhões de reais na época e, hoje, vale 5,8 milhões na moeda brasileira -, mas encerrou a empresa no ano passado, com aprovação dos acionistas em 12 de agosto e registro da ata dois meses depois. Ainda assim, chegou a passar mais de um ano e meio mantendo os postos de controlador da offshore e de presidente do BC, já que assumiu o posto no governo em fevereiro de 2019.


Dessa forma, ele poderia ter sido enquadrado no artigo 5º do Código de Conduta, mas isso não aconteceu. No Banco Central, Campos Neto tem acesso a informações importantes, como câmbio e taxas de juros, que podem afetar seus investimentos no exterior.


À publicação, o executivo disse que "as empresas estão declaradas à Receita Federal e foram constituídas há mais de 14 anos com rendimentos obtidos ao longo de 22 anos de trabalho no mercado financeiro, decorrentes, inclusive, de atuação em funções executivas no exterior". "Não houve nenhuma remessa de recursos às empresas após minha nomeação para função pública. Desde então, por questões de compliance, não faço investimentos com recursos das empresas. Questões tributárias não são atribuição da minha função pública", minimizou. Ele disse ainda que declarou ser proprietário da Cor Asset quando foi sabatinado no Senado antes de assumir o cargo no Banco Central.