Pablo Di Si, Presidente da Volkswagen Brasil, na frente do Virtus. Lançado em janeiro deste anos, é um sedã baseado no Polo, o quarto carro mais vendido do Brasil
Volkswagen/Divulgação
Pablo Di Si, Presidente da Volkswagen Brasil, na frente do Virtus. Lançado em janeiro deste anos, é um sedã baseado no Polo, o quarto carro mais vendido do Brasil

Na pesada luta das montadoras de carros pela conquista da liderança do mercado, não é raro uma delas tomar decisões erradas que a faça cair no ranking. No entanto, quando essa empresa reage, a sorte nunca é um fator que explica a retomada de resultados positivos, e a volta pela briga do primeiro lugar. No caso da Volkswagen do Brasil  esse fator chama-se “um excelente trabalho em time”, liderado por Pablo Di Si.

“Chegamos a ocupar a terceira posição em 2014, hoje estamos em segundo e nosso objetivo é conquistar a liderança. Iniciamos a maior ofensiva da história da Volkswagen do Brasil, com 20 lançamentos de novos carros nos próximos 3 anos. Voltamos a nos conectar com nossos consumidores, nossas concessionárias e fornecedores. Estamos no caminho certo”, diz Pablo Di Si , que desde de outubro de 2017 é o Presidente e CEO da Volkswagen Região América do Sul e Brasil.

Durante décadas a Volkswagen foi a maior montadora do Brasil. Os icônicos Fusca e Gol foram os carros mais vendidos por 24 e 27 anos respectivamente. Mas isso mudou. No início dos anos 2000, a VW perdeu a liderança e há quatro anos caiu para o terceiro lugar; As fracas vendas do icônico Gol, o tiraram até da lista dos dez carros mais vendidos.

O primeiro Fusca fabricado no Brasil, saindo da linha de montagem em 1959, foi líder de vendas por 24 anos. O Gol, lançado em 1980, foi o carro mais vendido do Brasil por 27 anos
Volkswagen/Divulgação
O primeiro Fusca fabricado no Brasil, saindo da linha de montagem em 1959, foi líder de vendas por 24 anos. O Gol, lançado em 1980, foi o carro mais vendido do Brasil por 27 anos

Há cerca de dois anos isso começou a se alterar, quando a montadora alemã se lembrou que possui uma grande fatia de consumidores fiéis e decidiu ouvi-los. Os bons resultados apareceram rapidamente. Hoje a VW Brasil cresce mais do que a média do mercado, sua fatia de participação no mercado aumentou para 15%, o Gol voltou a fazer parte da lista dos 10 mais vendidos, em quinto lugar, e o recém lançado Polo já ocupa quarta posição.

Leia abaixo a análise de Pablo sobre como essa virada aconteceu, e quais são seus planos para a nova Volkswagen reconquistar o título de maior montadora do Brasil.

Você chegou ao Brasil e assumiu o comando da Volkswagen há 8 meses. O país te deu boas vindas com umas das crises crise político-econômicas mais conturbados da nossa história recente. Como você está enfrentando esse cenário?

Meus primeiros meses foram muito intensos, um desafio, mas altamente positivo. O ponto mais crítico da crise já ficou para trás, o mercado atingiu o fundo do poço no ano passado, e no segundo semestre começou a reagir. Foi nesse momento que voltamos a lançar carros fabricados no Brasil, iniciando com o Polo e o Virtus. Isso foi um reaprendizado, tanto internamente na VW como para nossos fornecedores.

Em poucos meses esses dois carros se posicionaram como sucesso de vendas. Tivemos uma grata surpresa ao ter que ajustar o nosso mix de produção do Polo, já que a demanda do consumidor no modelo Highline, aquele que tem o painel digital, foi muito maior do que havíamos planejado. Uma boa surpresa, mas que exigiu uma readequação interna rápida entre vários setores da nossa empresa para que trabalhassem como um time, e não de forma compartimentalizada.

Conseguimos assim entregar rapidamente o carro que o consumidor queria e não o que achávamos que ele desejava. Essa lição foi aprendida e aplicada no lançamento do Virtus, em fevereiro deste ano, e será lembrada na chegada do T-Cross (SUV compacto que também será fabricado no Brasil e lançado em 2019) e todos nossos novos carros que serão lançados na sequência. Essa crise também nos levou a ter uma relação muito mais próxima e intensa com nossos fornecedores e concessionários.

Panel digital do Polo Highline, a versão mais vendida do carro
Volkswagen/Divulgação
Panel digital do Polo Highline, a versão mais vendida do carro


Hoje o Brasil possui uma capacidade para produzir 5 milhões de carros por ano, mas estamos fazendo metade disso e o cenário de curto e médio prazo não é otimista. Como lidar com isso?

Essa situação não aconteceu de repente. Você se lembra da capa da revista The Economist em 2009? Tinha uma imagem do Cristo Redentor decolando como um foguete, e a chamada era: “Brazil Takes Off”. Os indicadores econômicos eram sólidos e mostravam um crescimento consistente, e foi nesse clima que as montadoras, tanto as estabelecidas como as novas, decidiram investir em mais produtos e em quantidade, construindo novas plantas que quase dobraram a capacidade da indústria. Mas a realidade foi inversa e em 2013 a Economist publicou uma capa bem diferente. A medida que as fábricas ficavam prontas o mercado caiu, e os prejuízos foram brutais, na casa dos bilhões de dólares.

No caso específico da Volkswagen, nossa visão sempre é de longo prazo. O Brasil é um mercado relevante e importante, e estamos aqui para ficar, temos planejamentos para 5, 10 e 30 anos. Há quase 2 anos, quando a crise estava no pior dos momentos, anunciamos um investimento de R$ 7 bilhões no Brasil, e até 2020 estamos lançando 20 novos produtos neste mercado. Não há dúvida que ajustes visando a produtividade, redução de custos e eficiência irão acontecer e já estão acontecendo, não só no Brasil como no mundo todo.

Capas da Revista
The Econmist
Capas da Revista "The Economist" de 2009 e 2013. As montadoras investiram em fábricas para produzir 5 milhões de carros por ano no Bras. Hoje metade desta capacidade está ociosa

Esse acordo mundial entre a Volkswagen e a Ford, indica que no Brasil podem haver readequações em função do alto número de montadoras instaladas aqui com tanta capacidade ociosa?

Essa não é uma situação só do Brasil. A indústria automotiva mundial passa pelo mesmo problema e os ajustes no Brasil serão uma consequência. É de conhecimento público o acordo entre a Nissan e Renault, ou entre a BMW, Fiat e a Intel para desenvolver carros autônomos. No caso da cooperação da Volkswagen com a Ford , este é um processo bastante inteligente pois não envolve controle acionário e é aplicado por região, ou seja, se uma ação for positiva para as duas empresas num determinado mercado, vai para frente.

Vou te dar um exemplo. O custo para se desenvolver um farol pode chegar a centenas de milhões de reais, para que duplicar isso? A ideia é amortizar o custo do investimento sobre um volume maior, com uma capacidade já existente. O foco é cooperarmos no segmento de veículos comerciais leves, mas se outras oportunidades pontuais surgirem poderão ser analisadas.

Quanto a VW do Brasil representa para a matriz alemã?

Somos a região que mais cresce, representando cerca de 8% do tamanho global da montadora. A VW mundial cresceu 6,3% no primeiro semestre, já a operação brasileira atingiu 33% de crescimento. Como informação adicional, a média da indústria brasileira nesse mesmo período foi de 14%.

Algumas montadoras recorrem ao mercado de vendas no atacado, como locadoras e frotistas, para aumentar suas vendas, mesmo com prejuízo. Qual sua visão sobre isso, você procura mais market share ou lucratividade?

A grande capacidade ociosa e a dificuldade das montadores em retomar a produção plena é real. Eu procuro crescer minha fatia de mercado e voltar a ser líder de mercado, mas com responsabilidade. Não acredito em soluções temporárias para aumentar níveis de venda oferecendo descontos altíssimos para o mercado corporativo (locadoras e frotistas).

Além de gerar um prejuízo imediato para a fábrica, as concessionárias também sofrem, pois quando os corporativos decidem vender esses carros, após seis meses de uso, conseguem praticar um preço irrealmente abaixo do mercado, desestimulando a compra de carros novos. Esse é um ciclo autodestrutivo que não pode durar muito tempo. Vou te mostrar dados reais.

Do dia 1 a 17 de julho o mercado de carros cresceu 18%, sendo que vendas feitas por concessionárias aumentaram 1% e para locadoras em 48%. Nós como Volkswagen, no mesmo período de julho, crescemos nossas vendas em 26%, sendo que em concessionárias foi de 28% e para locadoras 24%.

Precisamos ser sustentáveis e coerentes. Acredito em trazer os consumidores para os nossos produtos porque eles veem valor nos nossos carros e os desejam. Acredito em criar demanda real para o comprador final e não em empurrar produtos com prejuízo.

Você viu?

Preço é a principal varável para definir quem vende mais, especialmente nessa época de economia tão delicada?

Preço é sempre um componente crítico, mas vou te dar os resultados de pesquisa que fizemos com o consumidor brasileiro. O primeiro motivo na compra de um carro é o design e o estilo. O segundo é a inovação, o conteúdo tecnológico, o preço vem em terceiro lugar. Curiosamente, segurança não está entre os cinco primeiros motivos de compra, mas isso está mudando. Outro fator a ser considerado é o conhecimento técnico do publico feminino sobre os carros. Já participei de várias pesquisas com consumidores na Europa, Estados Unidos, mas aqui no Brasil é surpreendente como as mulheres conhecem esse assunto.

Você falou em liderança de mercado. A Volkswagen foi a maior montadora do Brasil por décadas. Caiu para terceiro lugar e agora está em segundo. O que você está fazendo para recuperar o primeiro lugar?

A Volkswagen é como um grande time de futebol da primeira divisão, sempre buscamos a primeira posição. Essa foi a primeira coisa que falei ao chegar aqui. O que aconteceu no passado foi um reflexo das nossas próprias decisões, na realidade, falta de decisões. Quando cheguei no Brasil, muitas pessoas me disseram que na verdade a VW não foi para trás, é que não fizemos nada de novo em termos de produtos, e a concorrência avançou.

Há dois anos decidimos mudar isso, nos reconectando com os consumidores e retomar o lançamento de novos carros. Até 2020 faremos a maior ofensiva da história da Volkswagen do Brasil, com o lançamento de vinte novos produtos. Começamos no ano passado com o Polo, o Virtus e a nova Tiguan, e nesta semana lançamos os novos Gol e Voyage com transmissão automática. Ano que vem será a vez do T-Cross, um SUV compacto. Nossa meta é voltar a ser a maior montadora do Brasil, com esse agressivo portfólio de produtos.

Novo Gol com transmissão automática será lançado esta semana
Volkswagen/Divulgação
Novo Gol com transmissão automática será lançado esta semana


T-Cross é o novo SUV compacto da Volkswagen, que será produzido no Brasil e lançado no início de 2019
Volkswagen/Divulgação
T-Cross é o novo SUV compacto da Volkswagen, que será produzido no Brasil e lançado no início de 2019

A Volkswagen ficou 15 anos fora do mercado de SUVs. Você mencionou o T-Cross, há planos para mais carros dessa categoria?

Dos vinte lançamentos que eu mencionei, 5 serão SUVs e esse movimento já começou. Esse mês começamos a faturar o Novos Tiguan Allspace, importado do México, um SUVs médio para 5 e 7 lugares, um carro fantástico! No início de 2019, chega o T-Cross, um SUV compacto feito aqui no Brasil, e em dois anos lançamos o Tarek, outro SUV , que será produzido na Argentina. Os outros dois virão na sequência.

Se você possui cinco SUVs, você possui plataformas para fazer novas picapes.  A Volkswagen pretende concorrer com as picapes médias Oroch e a Toro?

Teremos novidades no futuro breve.

A Volkswagen tem planos para trazer o Golf elétrico, para o Brasil?

Vamos lançar nosso carro elétrico no Brasil no ano que vem. Existem várias opções de modelos que podem ser trazidos, mas ainda não decidimos qual, pois estamos em fase de estudos. No Rota 2030 há um capitulo, ainda em discussão, sobre uma drástica redução de impostos para carros elétricos e híbridos, mas vamos trazer nosso carro independente disso.

Como você enxerga o Rota 2030, um programa desenhado para dar segurança de longo prazo para as montadoras continuarem a investir no Brasil?

Desde que assumi o comando da Volkswagen Brasil, sou muito enfático em todas minhas declarações quando digo que o Rota 2030 é fundamental para o futuro do Brasil, não apenas para as montadoras fabricarem mais carros, mas pelo patrimônio de inteligência de tecnologia, de design e de engenharia avançada que ele vai induzir a ser criado e mantido no país. A Anfavea está fazendo um trabalho forte nesse sentido.

Estive recentemente com o Ministro da Fazenda e ele entende perfeitamente a importância desse projeto. Os pontos macro do Rota 2030 foram aprovados semana retrasada, e em breve o decreto será publicado. O Rota 2030 irá estimular as montadoras a criar e manter áreas de pesquisa e desenvolvimento para programas avançados de redução de emissões, aumento de eficiência energética, eletrificação e segurança.

O resultado dessa pesquisa fica no Brasil e esse é um patrimônio de conhecimento que irá ser usado em todos países do mundo. O Brasil pode ser um exportador de engenharia avançada. Sem o Rota 2030 as montadoras não possuem um horizonte de médio prazo de quais são as regras e requerimentos que lhes dê segurança de quanto e aonde investir.

Para Pablo Di Si, presidente da Volkswagen Brasil, o Rota 2030 é fundamental para o futuro do Brasil
Volkswagen/Divulgação
Para Pablo Di Si, presidente da Volkswagen Brasil, o Rota 2030 é fundamental para o futuro do Brasil



Você foi um jogador de futebol que tentou ser profissional. Que lições você trouxe do campo para o mundo empresarial?

O mundo corporativo  é cheio de desafios, e o que eu aprendi é que quando temos uma situação a ser resolvida, é preciso atacar a bola e não o jogador. Buscar a solução e não os culpados. Trouxe várias lições daquele mundo para este, mas acho que a principal é a importância do fator humano, o conceito de time e ter um objetivo em comum.

Veja o que aconteceu na Copa, acabou aquela fase do jogador que é uma estrela, onde todos dependem da ação de apenas um, que não possui espírito de time. O número 10 da Croácia, o Modric, correu quase 10km por jogo, e se entregou 100% para o time. A mesma coisa aconteceu com a França e Bélgica. Todos jogadores ralavam e corriam e se davam por completo para o time.

Quando você está usando a camisa do seu país, você está fazendo muito mais do que jogar bola, você representa uma pátria composta por milhões de pessoas. Essa é a grande lição que trago do futebol para o mundo empresarial: colaboradores que trabalhem em conjunto, com espírito forte, que defendem a sua companhia e que tenha os mesmos objetivos, vão criar as condições corretas para a empresa vencer.

Lembra do caso do mix de vendas do Polo que mencionei no começo da nossa conversa? Esse é um ótimo exemplo disso. Quando percebemos que o Highline era a versão que possuía mais demanda, tivemos que resolver a falta de painéis digitais. Nossa área de compras precisou pagar um pouco mais por isso, a área de marketing teve que ajustar seu programa de vendas e a produção teve que fazer mudanças na linha de montagem.

Os três indicadores individuais de cada unidade pioraram em relação às suas metas: compras pagou mais, marketing não vendeu o mix, e a manufatura levou mais horas, porém vendemos mais carros. O time ganhou. Esse deve ser espírito das pessoas: o time e seus objetivos em primeiro lugar. 

Pablo Di Si chegou no meio de uma profunda crise político economica no Brasil, mas isso pode ser um fator positivo na sua missão de consolidar a Nova Volkswagen e recolocá-la como maior montadora do Brasil. Ele é um gestor competente à frente de um time motivado, comadando um ousado plano de lancamentos de produtos superiores e renovados. Quem ganha é o consumidor. 

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