A diminuição da conectividade (geo)econômica do Brasil
Leandro Gaunszer
A diminuição da conectividade (geo)econômica do Brasil


O mundo  pós-pandemia tem sido desafiador na esfera geopolítica. Seja pelas disputas estruturalmente de longo prazo como aquelas travadas entre Estados Unidos e China, pelas  guerras na Ucrânia ou entre  Israel e Hamas ou pela simples dificuldade em navegar por um mundo multipolarizado, a verdade é que sustentar relações internacionais em um ambiente tão tumultuado é desafio hercúleo até para os corpos diplomáticos mais estabelecidos. As vulnerabilidades sanitárias recentes (fruto da dependência de cadeias de produção que foram desorganizadas durante a pandemia) trouxeram questionamentos quanto ao ritmo (e ao nível) ótimo de integração econômica internacional em diversas regiões. Aliando isso à disputa pelo protagonismo na indústria de semicondutores, movimentos de ascensão de extremos no espectro político-ideológico em diversos continentes e experiências de retrocesso democrático, nunca foi tão delicado equacionar as trocas financeiras e comerciais com parceiros que, por ventura, podem divergir ideologicamente. Nesse sentido, o trabalho de Shekhar Aiyara e Franziska Ohnsorged, intitulado “Geoeconomic Fragmentation and “Connector” Countries” (veja uma síntese aqui ) traz dados importantes ao debate.

Os autores medem a distância geopolítica bilateral entre as nações por meio de dados de padrões de votações nas Nações Unidas e combinam com estatísticas de transações comerciais e financeiras para verificar a evolução da conectividade (e da vulnerabilidade) de parceiros dos países em algumas esferas diferentes, como, por exemplo, passivos financeiros, exportações e importações. Para este texto, elenquei três pontos que, ao analisar os dados do trabalho, concluí que merecem destaque no que tange a conectividade (geo)econômica do Brasil: insumos importados, bens de capital importados e exportações de bens de consumo. Nos três casos, os dados são anuais e a amostra vai de 2002 a 2022.

Comecemos com os insumos importados. O gráfico a seguir nos revela que entre 2002 e 2014 houve uma tendência de aumento na conectividade, isto é, na variabilidade no que diz respeito às posições no espectro ideológico dos países dos quais importamos insumos para a produção. Depois disso o índice caiu mais de 45%.

Conectividade dos insumos importados
Gráfico 1
Conectividade dos insumos importados


E por que isso é relevante? A concentração (e, portanto, a diminuição do índice) leva a relações com países geralmente mais próximos ideologicamente. Portanto, quanto maior é a concentração, menor é a “diversificação” ideológica dos parceiros econômicos. A teoria de finanças sempre nos lembra dos ganhos de diversificação, portanto, há como transplantar, ainda que no campo das hipóteses, esse tipo de conceito para o comércio internacional. Maior diversificação tende a diminuir a vulnerabilidade a riscos idiossincráticos. Vale para ações, pode valer para países.

Essa menor diversificação também é observada no caso dos bens de capital importados,

Conectividade dos bens de capital importados
Gráfico 2
Conectividade dos bens de capital importados


e nas exportações de bens de consumo:

Geoconectividade das exportações de bens de consumo
Gráfico 3
Geoconectividade das exportações de bens de consumo


As trocas (comerciais ou financeiras) em um contexto de menor diversificação podem, em tese, aumentar os impactos de movimentos geopolíticos mais disruptivos. Nos três índices apresentados nesta  coluna, esse risco pode ter aumentado (cuidado ao olhar apenas uma variável para extrair conclusões muito profundas). Todavia, existem outros pontos nos quais o Brasil tem ido melhor no que diz respeito à conectividade geoeconômica, segundo as estimativas dos autores (tema para uma coluna futura). De qualquer forma, é importante seguirmos monitorando as relações econômicas entre países: é lá que poderemos identificar oportunidades ou ameaças que podem fazer toda a diferença.

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