Controlar, uma obsessão das autoridades. O alvo, agora, é a IA
Carlos André Cavalcanti
Controlar, uma obsessão das autoridades. O alvo, agora, é a IA


As redes sociais surgiram há cerca de duas décadas e, com elas, vieram as fake news. Desde que a enxurrada de notícias falsas e teorias da conspiração começou a tomar conta do mundo digital, várias autoridades cederam à tentação de tentar controlar os conteúdos postados na internet. Essa discussão em torno do controle das mídias digitais, porém, ainda está longe de terminar – e, agora, um novo capítulo se abre neste debate. Nesta semana, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, chamou a atenção para um tema que considera “preocupante”: criar uma regulamentação para os sistemas de  inteligência artificial.

“Precisamos de regras para disciplinar o instituto da inteligência artificial no Brasil, para que tenhamos conceitos de transparência, de responsabilidade, de ética, sem travar e atravancar a evolução tecnológica, mas com limites para que não se substitua a inteligência humana”, afirmou Pacheco em palestra para o Instituto de Advogados de São Paulo.

Antes de mais nada, entende-se a preocupação com fakes de maneira geral – e a IA, neste processo, pode inventar imagens, animações e vozes para prejudicar determinados indivíduos (ou simplesmente semear a discórdia). Até agora, precisávamos comparar fato e narrativa para comprovar um post falso. Mas imaginemos um vídeo com um determinado político (e com sua voz) manifestando um discurso preconceituoso, produzido artificialmente. Até que tudo seja explicado, muitos votos poderão ir para o ralo.

Mas por trás de tudo isso talvez esteja a obsessão das autoridades em controlar aquilo que é novo. Foi assim com as redes sociais, será assim com a inteligência artificial. O problema é que, nos dois casos, a tentativa de controle é igual a enxugar gelo: não tem efeito prático nenhum.

A internet surgiu como um ambiente caórdico, como diria o escritor Dee Hock, fundador da Visa. O que define esses ambientes é uma mistura de caos e ordem. Como em todos os ambientes inovadores, o caos é um elemento necessário para a quebra de paradigmas. Dessa forma, é virtualmente impossível controlar o caos. Mas, nas poucas vezes em que isso ocorre, enterram-se as condições para que a inovação prospere.

O mundo digital conta com uma grande dose de caos em sua estrutura, a começar pela forma com a qual os servidores de todo o mundo, de certa forma, estão interligados. O mesmo vale para o controle daquilo que é publicado pelos influenciadores. Cala-se um aqui e surgem outros dez acolá, abrigados em países nos quais os eventuais xerifes não têm poder jurídico.

Controlar esse ambiente é gastar energia à toa. Já temos uma lei que coíbe calúnias e afins. Por que não a adaptamos para os novos tempos em vez de criar regras específicas que atinjam a tecnologia?

Vamos dizer que o presidente do Senado consiga patrocinar um projeto de lei para regulamentar a inteligência artificial. O grande risco está, para variar, no momento em que as regras serão escritas. No Congresso, por conta de negociações pontuais, surgem itens inesperados em certos PLs. Neste contrabando, os parlamentares podem passar regras no texto final que atentem contra a liberdade de expressão, ou que podem deixar abertas portas para que o discurso dos cidadãos deixe de ser totalmente livre.

Neste caso, o que é melhor? A ordem ou o caos? Talvez a solução seja convivermos com os dois cenários ao mesmo tempo – abraçar, de fato, os princípios da era caórdica.

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