A relação entre o fracasso do ajuste fiscal e a reeleição
Agência Brasil
A relação entre o fracasso do ajuste fiscal e a reeleição


Como se sabe, o governo anunciou uma reformulação das metas fiscais. O objetivo de obter um superávit nas contas públicas de 1% em 2025 foi jogado para 2028 – e, para o ano que vem, o governo promete agora zerar o déficit (a meta para 2026 seria um excedente de 0,25% e de 0,5% para 2027). Uma piora no quadro de política fiscal deve trazer mais pressão sobre a dívida interna, mas não deve por enquanto pressionar os juros para o alto.

A mudança na trajetória fiscal divulgada pelo governo é ruim, pois mostra uma leniência em relação ao corte de gastos públicos. Mas, por outro lado, acaba com um jogo de cena no qual ninguém acreditava. Isso não quer dizer, contudo, que as novas metas estejam alinhadas com as previsões de analistas do mercado financeiro. Para se ter uma ideia, os economistas ligados aos bancos acreditam que somente em 2028 é que teremos um déficit zero.

Na prática, estamos voltando à mesma mentalidade dos tempos de Dilma Rousseff, que abriu os cofres estatais e promoveu um tremendo descontrole de contas, provocando inflação e recessão ao mesmo tempo – uma verdadeira façanha macroeconômica. A questão, agora, é saber qual será a intensidade desta nova orientação. Se  Luiz Inácio Lula da Silva gastar como se não houvesse amanhã, como fez Dilma, vai gerar um capital político de fôlego curto e correrá sérios riscos em 2026.

Falando em 2026, há apenas uma explicação para tamanha irresponsabilidade no trato das contas públicas: a reeleição. Lula pensa em ser reeleito desde que ganhou o último pleito e também pensa em emplacar seu eventual sucessor nas urnas de 2030. Para ele, popularidade se mede em obras e investimentos estatais.

Nos últimos meses, o presidente vem assistindo a uma queda em seus índices de aprovação. Além disso, a manutenção de juros reais relativamente altos deve provocar alta na renda das classes sociais mais altas, como mostrou um estudo da consultoria Tendências divulgado anteontem.

Lula, diante desse quadro, vê a reeleição ameaçada e resolveu agir, apelando para uma abordagem aparentemente light em seu programa econômico – uma aterrissagem suave para reduzir o déficit nessa administração e deixar a solução do problema para o próximo mandato (seja do PT ou de outro candidato).

O último pacote de controle nas contas do Estado foi o que se convencionou chamar de teto de gastos, uma medida criada pelo governo de Michel Temer. Essa medida foi tomada em meio a um caos fiscal deixado por Dilma e causou uma chiadeira sem precedentes na classe política. Mas Temer conseguiu aprovar algo do gênero porque não concorria à reeleição.

No fundo, Michel Temer acabou tomando várias decisões importantes para o país porque não iria concorrer no pleito seguinte. E teve coragem de assumir para si a doção de medidas impopulares, mas importantes para o futuro na Nação.

Entretanto, o governo de Jair Bolsonaro – outro que começou a falar em reeleição antes da hora, já no mês de fevereiro de 2019 –, apesar de ter um liberal na condução da economia (Paulo Guedes), afrouxou esses controles e furou o teto em R$ 795 bilhões. Cerca de R$ 500 bilhões desse total foram torrados durante a pandemia, é verdade. “Nós furamos o teto porque foi muito mal construído, o teto era justamente para não deixar o governo federal se hipertrofiar […] É tão mal construído que o ministro que vai ser do Lula aí, o [Henrique] Meirelles, nem economista é”, disse Guedes após as eleições de 2022.

De fato, Meirelles é engenheiro formado pela Escola Politécnica da Universidade de São Paulo. Mas foi ele quem consertou o nó dado por Dilma na economia. Talvez Meirelles tenha exagerado na dose do remédio, mas ele só conseguiu arrumar o cenário macroeconômico porque teve o aval de um presidente que não iria concorrer à reeleição.

Talvez esteja na hora de reformularmos nossos conceitos eleitorais e buscar um novo sistema que dê aos governantes coragem para pensar no longo prazo e desagradar o eleitorado em prol do bem comum. Enquanto formos reféns da reeleição, estaremos condenados a ter governos que serão dirigidos apenas pelas pesquisas de popularidade. Não iremos a nenhum lugar desse jeito, especialmente enquanto insistirmos em desprezar o controle das despesas públicas.

    Mais Recentes

      Comentários

      Clique aqui e deixe seu comentário!