
O Mercado Livre iniciou oficialmente sua incursão no mercado farmacêutico com a aquisição de uma drogaria na zona sul de São Paulo. A operação, aprovada recentemente pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica ( Cade), envolve a Target, nome comercial da Cuidamos Farma Ltda., até então controlada pela startup Memed, especializada em digitalização de receitas e exames.
Embora financeiramente modesto, o movimento é considerado estratégico e abre espaço para a empresa testar sua atuação em um dos setores mais regulados do varejo nacional. A compra foi revelada no fim de setembro, e os detalhes foram explicados no dia 9 de outubro, em uma coletiva com executivos da companhia.
Participaram do encontro o vice-presidente sênior de commerce e líder do Mercado Livre no Brasil, Fernando Yunes; o diretor sênior de marketplace, Tulio Landim; e a diretora jurídica de e-commerce, Adriana Cardinali.
“Começamos a perceber um movimento do qual não compartilhamos os valores, então optamos por realizar uma conversa transparente e aberta”, afirmou Yunes, ao abrir a coletiva, segundo o site Meio e Mensagem.
Ele explicou que a ideia inicial é entender melhor o mercado antes de tomar próximos passos. A compra da farmácia permite que o Mercado Livre opere no modelo 1P (quando a própria empresa compra e revende os produtos) — que hoje é o único permitido para comercialização online de medicamentos no Brasil.
A companhia diz que não pretende montar uma rede física, mas sim compreender a dinâmica do setor por dentro: logística, armazenamento, regras sanitárias, atendimento e conformidade regulatória.
“Não é nossa estratégia criar uma rede de farmácias. O que queremos é que as farmácias vendam dentro do Mercado Livre, mantendo o DNA de marketplace e de vendas no modelo 3P, em que o vendedor é responsável pelo estoque, pelo envio e pelo relacionamento com o cliente, e nós atuamos como plataforma de intermediação e pagamento”, reforçou o executivo.
Transparência após críticas da Abrafarma
A Associação Brasileira de Farmácias e Drogarias (Abrafarma) questionou o negócio junto ao Cade, alegando falta de clareza sobre os termos da aquisição e possíveis acordos futuros. A entidade mencionou risco de “incidente de enganosidade” caso informações relevantes não tenham sido integralmente apresentadas ao órgão regulador.
Segundo Yunes, a decisão de se pronunciar após a aprovação do Cade teve como objetivo afastar interpretações equivocadas. “Percebemos um movimento com o qual não concordamos e optamos por fazer uma conversa aberta”, afirmou.
Regulamentação em debate e pressão no setor
Hoje, marketplaces não podem vender medicamentos no país, mas o Mercado Livre defende a revisão dessas normas. A empresa articula com órgãos públicos e parlamentares mudanças na RDC 44/2009, da Anvisa, que restringe o comércio digital do setor.
Enquanto isso, a farmácia adquirida funcionará como projeto piloto, e a ampliação só deve ocorrer após avanços regulatórios.
O anúncio da operação provocou reação imediata no mercado de ações. No dia em que os rumores vieram à tona, papéis de grandes redes caíram: Raia Drogasil acumulou queda superior a 5% em dois dias; Panvel recuou mais de 3%; e Pague Menos registrou baixa de cerca de 1%.
O que acontece fora do Brasil
Nos países onde atua, o Mercado Livre já opera em formatos híbridos e menos restritivos. No México, Chile, Argentina e Colômbia, o modelo 3P permite que farmácias parceiras vendam diretamente aos consumidores pela plataforma.
Em mercados como Estados Unidos, China e grande parte da Europa, a venda de medicamentos — com ou sem prescrição — é regulamentada e liberada para plataformas digitais.
No Brasil, a empresa espera que a experiência da operação-piloto ajude a embasar a discussão sobre a modernização do setor.
O Portal iG tentou contato com o Mercado livre e aguarda resposta. A matéria será atualizada assim que obtivermos resposta.