Segundo estudo dos pesquisadores Isabela Duarte Kelly, Claudio Considera e Hildete P. de Melo, feito no Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas, o FGV IBRE, independentemente do nível educacional , todas as mulheres dedicam, em média, mais de 20 horas semanais a afazeres domésticos e cuidados, enquanto os homens realizam apenas uma jornada de 11 horas semanais nessas tarefas.
O trabalho não pago de afazeres domésticos e cuidados nas famílias, se contabilizado, acrescentaria 13% ao PIB brasileiro, com variações por região.
Em todo o Brasil, segundo a pesquisa, essa jornada acaba impedindo que as mulheres alcancem melhores posições no mercado de trabalho , enquanto os homens, podem se dedicar inteiramente ao trabalho remunerado.
Para Isabela Duarte Kelly, uma das autoras do estudo, esse quadro vem de normas sociais que acabam contribuindo também para a forma como a mulher entra no mercado de trabalho. “Esse quadro acaba agindo como uma barreira que impede que as mulheres alcancem melhores posições, ela até consegue entrar no mercado de trabalho, mas ela não consegue chegar a posições que remunerem melhor, e isso acaba afetando a questão da independência financeira”, defende.
Segundo a pesquisadora, é importante reconhecer o quadro para formulação de políticas públicas. “Aumentar a oferta de creches públicas, por exemplo, promoveria igualdade de gênero. Isso porque as mulheres conseguiriam deixar seus filhos em horário integral e isso permitiria uma mudança mais rápida no quadro. Porque a mudança nas normas sociais, nessa construção que impõe à mulher a dedicação às tarefas domésticas são lentas de se mudarem”, complementa.
“O homem só pode estar no mercado de trabalho, porque tem alguém que vai cuidar do lar, Então, é um ponto muito importante atribuir o valor monetário dessas tarefas para chamar ainda mais atenção do quanto que elas são valiosas”, finaliza.
As horas dedicadas a afazeres domésticos e cuidados são registradas pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua) . As informações foram coletadas nos anos de 2016 a 2019 e 2022. Para calcular o valor monetário desses afazeres não remunerados, os pesquisadores multiplicaram a quantidade de horas dedicadas em cada Unidade da Federação pelo valor médio da hora trabalhada por empregadas domésticas em cada localidade.
Um dos principais impulsionadores desse aumento foi a valorização dos salários das empregadas domésticas ao longo dos anos, notadamente devido à promulgação da PEC das Domésticas em 2013. Esse marco contribuiu significativamente para a mudança no cenário, refletindo-se no aumento percentual do trabalho não remunerado incorporado ao PIB.
A contribuição ao Produto Interno Bruto (PIB) para cada Região:
Região Norte
A Região Norte do Brasil registra o segundo menor PIB per capita do país. Uma análise mais aprofundada revela que, caso os afazeres domésticos/cuidados fossem considerados no cálculo do PIB, contribuiriam significativamente, adicionando 13,8% ao PIB regional. Essa parcela se divide entre mulheres, responsáveis por 9%, e homens, com 4,8%.
A região se posiciona como a segunda maior contribuinte dos afazeres domésticos/cuidados para o PIB, ficando atrás apenas da Região Nordeste. Vale destacar que a disparidade de horas dedicadas ao trabalho doméstico entre mulheres e homens é a menor nesta região, sendo 1,85 vezes mais horas para as mulheres, a menor diferença por gênero entre todas as regiões brasileiras.
Região Nordeste
A Região Nordeste do Brasil, marcada pelo menor PIB per capita do país, destaca-se como a que teria a maior contribuição dos afazeres domésticos e cuidados para o seu PIB, atingindo expressivos 17,3%, caso fossem devidamente valorizados. Nesse incremento, as mulheres respondem por 12%, enquanto os homens contribuem com 5,4%. Estados como Alagoas (19,4%), Paraíba (19,8%) e Piauí (19,1%) sobressaem-se nesse cenário, com as mulheres desempenhando um papel proeminente. Contudo, a região apresenta os menores salários, tanto para trabalhadoras domésticas quanto para mulheres e homens ocupados.
Região Sudeste
A Região Sudeste ostenta o segundo maior PIB per capita do país, sendo superada apenas pela Região Centro-Oeste, impulsionada por Brasília, cujo PIB per capita é 1,77 vezes o de São Paulo. Caso os afazeres domésticos e cuidados fossem devidamente valorizados, contribuiriam com 12,5% para o PIB dessa região, destacando-se a significativa participação das mulheres, responsáveis por 8,4%. Minas Gerais sobressai com uma contribuição de 15,5%, impulsionada pelos 10,7% de contribuição das mulheres, enquanto os homens contribuem com apenas 4,8%.
Região Sul
A Região Sul se destaca por oferecer o maior valor pago por hora trabalhada às trabalhadoras domésticas entre todas as regiões do país. Nessa localidade, o trabalho de afazeres domésticos e cuidados representaria um acréscimo de 13,5% no PIB. O estado de Santa Catarina ganha destaque ao apresentar uma contribuição acima da média regional, atingindo 14,3%. Um dado curioso é que isso se deve aos salários mais elevados atribuídos às trabalhadoras domésticas nesse estado, uma vez que o número de horas dedicadas por elas ao trabalho não remunerado é o menor da região, registrando uma média de 19,5 horas.
Região Centro-Oeste
Esta região apresenta a menor contribuição dos afazeres domésticos para o seu próprio PIB, representando apenas 9,6%. Mulheres contribuiriam com 6,4%, enquanto os homens com 3,2%. Apesar de ser a região mais rica quando mensurada pelo PIB per capita, impulsionada pelo Distrito Federal e seus elevados salários na Administração Pública Federal, não é a que melhor remunera as empregadas domésticas, superando apenas as regiões mais pobres (Norte e Nordeste).