Aneel autoriza termelétrica a cumprir contrato emergencial de energia, mesmo com fim da crise hídrica
Redação 1Bilhão Educação Financeira
Aneel autoriza termelétrica a cumprir contrato emergencial de energia, mesmo com fim da crise hídrica

Em reunião de diretoria realizada anteontem, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) aprovou o pedido da Âmbar Energia de usar a usina termelétrica Mário Covas, localizada em Cuiabá (MS), para suprir a energia contratada por quatro projetos de termelétricas do grupo vencedoras do leilão para contratação emergencial de energia realizado em outubro de 2021.

Diante da pior crise hídrica no país em mais de 90 anos, o governo fez o leilão para contratar energia emergencial para o período de maio de 2022 até o fim de 2025, a um custo de R$ 39 bilhões. Este ano, porém, o nível dos reservatórios subiu e a medida deixou de ser necessária, na avaliação de especialistas.

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Como esse custo mais alto de contratação bate no bolso do consumidor, encarecendo a conta de luz, a avaliação é que esse poderia ser o momento de rever esses contratos. Além disso, o programa emergencial oferecia preço mais alto por prever a entrada em operação de novas usinas. Para especialistas, ao autorizar uma termelétrica existente a honrar o contrato a preço alto, isso poderia dar margem a que outras empresas reivindicassem o mesmo tratamento.

"A decisão pode abrir um precedente, contrariando a regra do leilão que foi feito para incentivar a entrada emergencial no sistema de nova capacidade (novas usinas). A Mário Covas já opera", destaca Bernardo Menezes, diretor de Inovação, Produtos e Regulatório da Omega Energia.

Para ele, o ponto central é que essa decisão vai na direção contrária das condições e demandas atuais de mercado:

"Hoje, temos excesso de energia nos reservatórios. O cenário mudou. O racional seria discutir até a revogação desses contratos porque o consumidor não precisa mais dessa energia emergencial, mas vai arcar com esse custo cobrado via encargo na conta de luz."

Das 17 usinas contratadas no leilão emergencial, apenas uma entrou em operação no último dia 1º, conforme previsto em contrato.

Paulo Pedrosa, presidente da Associação dos Grandes Consumidores Industriais de Energia e de Consumidores Livres (Abrace), classifica a decisão como um “retrocesso”:

"O leilão foi feito para enfrentar uma possível nova crise hídrica que não veio. As quatro usinas foram compradas pela Âmbar num projeto de nova geração. Se foram substituídas por uma termelétrica antiga, a empresa vai estar entrando pela porta dos fundos, e não pela regra do leilão."

Ele também teme que a decisão, que ainda não é final, leve outras empresas a seguirem os passos da Âmbar. E destaca haver somas robustas em jogo.

"Há mais de R$ 200 milhões em multas dessas usinas em jogo. Elas são quase metade da energia contratada no leilão. Sem elas, seriam quase R$ 20 bilhões a menos na conta do consumidor", diz Pedrosa, que avalia que o atraso nas entregas é oportunidade de a Aneel rever os contratos.

A Âmbar é controlada pelo grupo J&F, dona da JBS. A Mário Covas, sozinha, tem capacidade de geração de 480MW, superando a soma das potências das quatro usinas vencedoras do leilão — Edlux X, EPP II, EPP IV e Rio de Janeiro I— , de 343,81 MW. Em seu requerimento à Aneel, a empresa reforça que o atraso nas operações das usinas resultaria em R$ 209 milhões em multa por mês, e por isso solicitou o uso da Mário Covas. Como o preço é tema central no debate, oferece uma espécie de desconto com o uso de Cuiabá.

Procurada, a Âmbar informou que as usinas serão entregues no prazo contratual, para adicionar nova geração ao sistema elétrico. “A proposta da companhia mantém a construção das novas usinas, já em andamento, além de reduzir a emissão de NOx (gás de efeito estufa) em 15 vezes e beneficiar o consumidor em R$ 628 milhões em relação ao projeto inicial”, disse em nota.

O diretor da Aneel, Efrain Pereira da Cruz, relator do processo, diz em seu voto que a usina Mário Covas está indisponível para o sistema elétrico desde 2009, “gerando energia apenas em períodos extraordinários e com autorização da Aneel”. Com isso, e o fato de frisar que a usina não tem contrato de comercialização de energia, avalia que a substituição pela Mário Covas não fere as regras do leilão. Procurada, a Aneel não comentou.

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