Cartão de crédito é vilão do endividamento para 72% dos consumidores
9% a menos em relação a 2021, de acordo com a pesquisa Aspectos do Endividamento, realizada pela Associação Brasileira de Defesa do Consumidor (Proteste)
O mau uso do cartão de crédito é a principal causa de superendividamento para 72% das pessoas, 9% a menos em relação a 2021, de acordo com a pesquisa Aspectos do Endividamento, realizada pela Associação Brasileira de Defesa do Consumidor (Proteste). O levantamento busca entender o grau de inadimplência dos clientes, além dos comportamentos e fatores externos que levam o grupo até essa situação. Ao todo, foram ouvidas 500 pessoas do Rio de Janeiro e São Paulo, com idade média de 44 anos, sendo a maioria (53%) mulheres.
De acordo com os resultados, 23% dos entrevistados acreditam estar “muito endividados”, um crescimento de 5% em relação a 2021. Destes, 36% têm pelo menos uma dívida em atraso. Dentro desse grupo, 92% relatam que estão sendo mais cobrados, sendo que 97% vivem em São Paulo e 84% no Rio.
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Entre aqueles que se classificam como “muito endividados”, 45% ganham entre um a dois salários mínimos e 31% entre dois a cinco salários mínimos. Aqueles que ganham entre cinco e dez salários representam 7% do total de muito endividados e as pessoas com rendimentos de mais de dez salários mínimos são apenas 5% desse grupo.
Nos dados regionais, é possível verificar que os cariocas têm uma percepção maior do próprio endividamento, uma vez que 26% dos entrevistados consideraram-se "muito endividados". Já o entendimento do nível de endividamento dos paulistas cresceu 10%, posto que hoje 21% se declaram "muito endividados", contra 11% em 2021.
Diante da alta proporção de endividados, a maioria das pessoas (78%) vê o uso inadequado do cartão de crédito como o principal fator de dívida, principalmente aquelas que têm renda familiar mensal de cinco a dez salários mínimos. Quando são considerados os dados locais, 63% dos cariocas indicam esse fator como motivo de preocupação, contra 54% dos paulistas.
Mesmo com a alta taxa de juros, a ferramenta é muito utilizada pela facilidade na hora de comprar, já que permite que uma pessoa consuma determinado produto ou serviço sem que tenha saldo suficiente para pagar por isso.
"A maioria das pessoas não tem clareza que ao usar o cartão de crédito estão pegando dinheiro emprestado. Usam como extensão do salário e se enrolam com o acúmulo de parcelas", explica a educadora financeira Aline Soaper.
Além disso, o cartão oferece a possibilidade de crédito rotativo, quando a pessoa não paga a fatura integral no mês seguinte ao consumo e fica sujeita a altas taxas de juros no saldo que não foi pago.
O número de pessoas que indicou o cheque especial como um dos principais fatores de endividamento também foi alto, 42%, um aumento de 25% em relação à última pesquisa.
Para o economista Alexandre Prado, a explicação para essa variação é a mesma do cartão de crédito. "O cheque especial tem um efeito psicológico, a pessoa entra nele porque naquele momento ela quer consumir, então ela parcela, mas depois não tem capacidade de honrar a dívida que contraiu. Esse aumento também pode ser explicado porque o cartão de crédito, que é a forma mais fácil de consumir, tem taxas de juros muito mais altas do que o cheque especial, que já tem taxas absurdamente altas".
Os entrevistados também apontaram o desemprego (44%) e a pandemia (33%) como causas da aquisição de dívidas. "As pessoas tiveram que consumir e não tendo renda ou estando em trabalho informal, elas acabaram não tendo renda ou tendo uma renda menor e tiveram que adotar o cheque especial e cartão de crédito", explica Prado.
Para resolver o problema das dívidas com o cartão, Soaper orienta que as pessoas não gerem novos débitos na ferramenta de crédito e tentem pagar o valor integral da fatura mesmo que precisem passar por um período de restrição de crédito.
Hábitos de consumo
A pesquisa da Proteste também mostrou que 28% dos entrevistados aumentaram o consumo durante a pandemia, o que representa uma queda de 36% em relação ao ano anterior. Entre os que mais compraram ou contrataram serviços estão os paulistas, que equivalem a 38% desse valor. Já 46% dos cariocas consumiram muito menos nos últimos 12 meses.
Dívidas atrasadas
Dos entrevistados, 42% já deixaram de pagar pelo menos uma conta no último ano, sendo que a conta de telefone é a que apresenta mais atrasos (32%). Em seguida, aparecem a conta de energia (30%) e internet (29%), que também ficou em terceiro lugar em 2021. Em quarto e quinto lugar também estão outras duas importantes despesas domiciliares: água e IPTU, ambas com 23% de inadimplência.
Dos entrevistados, 42% já deixaram de pagar pelo menos uma conta no último ano, sendo que a conta de telefone é a que apresenta mais atrasos (32%). Em seguida, aparecem a conta de energia (30%) e internet (29%), que também ficou em terceiro lugar em 2021. Em quarto e quinto lugar também estão outras duas importantes despesas domiciliares: água e IPTU, ambas com 23% de inadimplência.
Os cariocas atrasaram mais contas que os paulistanos, foram 46% de inadimplências entre os que moram no Rio, contra 40% dos que vivem em São Paulo.
As diferenças regionais também são perceptíveis nos receios que cada grupo tem de não quitar suas contas. 89% dos paulistanos têm medo de ficar com o nome sujo, enquanto os cariocas temem os juros e as multas. No panorama geral, considerando entrevistados do Rio e de São Paulo, 84% dos entrevistados temem ficar com o nome sujo e 61% têm receio de ter o serviço suspenso.
Na busca pela quitação dos valores, os mutirões de renegociação de dívidas se apresentam como uma possibilidade de resolver o problema. Segundo o levantamento, 31% das pessoas ouvidas já conseguiram renegociar suas dívidas em uma dessas iniciativas. Por outro lado, 51% acharam as propostas desvantajosas, enquanto 80% apontaram os juros muito altos como uma das principais desvantagens, seguido de parcelamentos muito longos (46%). Os cariocas são os que mais veem desvantagens nos mutirões (46%), já 32% dos paulistas conseguiram renegociar nesses eventos.
Assim como no ano anterior, 38% dos entrevistados procuram por propostas de renegociação de dívidas assim que percebem que não terão condições de pagar. Nos dados regionais, 49% dos paulistanos procuram a renegociação logo que percebem que não terão condições de pagar as contas, contra 19% dos cariocas que só buscam pela renegociação quando já estão sem condições de pagar.
"Outra possibilidade é trocar essa dívida de cartão de crédito e cheque especial, que tem taxas muito altas. A pessoa pode tentar fazer uma captação de recursos via empréstimo consignado ou vendendo alguma coisa", sugere Prado. Além disso, os endividados podem recorrer à própria instituição financeira em que tem débito aberto para renegociar.
Negociar as contas, no entanto, não impede novas dívidas no futuro. Para evitar isso, é preciso uma mudança no pensamento dos consumidores, que precisam evitar as compras por impulso e tentar pagar à vista. "A melhor forma de usar o cartão de crédito é com planejamento sobre o valor da parcela e de quanto pode realmente pagar na fatura mensal. Quem tem pouco controle financeiro, deve evitar os parcelamentos", alerta Soaper.
"O melhor momento para usar o cartão é em emergência, como comprar um remédio, algo urgente ou quando está investindo para gerar mais renda, como um curso ou um empreendimento", completa a educadora financeira.
A pesquisa, no entanto, revela um comportamento diferente do ideal. Cerca de 80% dos entrevistados possuem 1 cartão de crédito ou mais. Desses, 83% fizeram compras parceladas no último ano.
Entre os paulistanos, 33% têm ao menos 2 cartões de crédito e são os que mais tiveram compras parceladas no último ano (85%). A maior parte dessas compras, 69% aconteceram no setor de alimentação/supermercado. Entre os cariocas esse resultado não mudou muito, foram 56%.
A expectativa dos entrevistados para os próximos meses, no entanto, são boas. Entre os cariocas, 37% acreditam que terão suas parcelas quitadas em um prazo de sete a 12 meses, já 49% dos paulistas acreditam que terão suas parcelas quitadas em até 6 meses.
A avaliação dos entrevistados é parecida com a avaliação de Prado. "A expectativa é se mantenha estável com viés de reduzir, porque as taxas são muito altas e, nesse momento, temos uma expectativa de novos empregos. Dessa forma, a consequência será que as pessoas terão renda e vão poder consumir sem assumir dívidas", afirma o economista.
Deslocamento e alimentação
O levantamento também revelou dados sobre o deslocamento e alimentação dos paulistas e cariocas. Do total de entrevistados, 38% trabalham e precisam se deslocar até o serviço, sendo que 50% desse grupo é formado por cariocas. Já os paulistas se destacam no home office (48%).
Além disso, 25% das pessoas ouvidas precisaram arcar com transporte ou alimentação para trabalhar. Desses, 17% não recebem nenhum tipo de benefício. Entre os cariocas, 42% tiveram que arcar com alimentação e transporte para trabalhar no último ano, sendo que 27% não recebem nenhum tipo de benefício.
Mesmo quem recebe benefício ainda precisa deslocar recursos para a compra de comida. Entre aqueles que têm vale refeição ou vale alimentação, 17% responderam que não consideram o valor do benefício suficiente e que precisam complementar. 41% já deixaram de pagar uma conta para custear despesas de alimentação.