Bolsa de Valores
Reprodução: iG Minas Gerais
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‘Vou tirar todo o meu dinheiro para não perder de novo’, afirmou Natália, que aos 75 anos tem na memória a crise dos anos 1990. Assim como ela, milhares de russos enfrentaram filas para sacar recursos ontem, como parte de um dia de caos na economia do país, um impacto direto da guerra promovida por Moscou na Ucrânia. A moeda local encerrou o dia com queda de cerca de 20%: para comprar US$ 1 são necessários agora 101,4 rublos. Para conter a derrocada da divisa, o banco central (BC) do país dobrou a taxa de juros de 9,5% para 20%. Não foi suficiente.

O BC russo liberou mais US$ 7 bilhões em reservas que haviam sido separadas como garantia para empréstimos e fechou a Bolsa de Moscou na segunda-feira (27). Já nesta terça (1), ela seguirá de portas fechadas para evitar a derrocada das ações. O governo ordenou que as empresas vendam 80% de suas reservas em moedas estrangeiras, para tentar elevar a demanda por rublos e impedir estoques de dólares ou euros.

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A presidente do Banco Central da Rússia, Elvira Nabiullina, disse que a situação da economia russa se “alterou drasticamente”, mas prometeu “usar as ferramentas necessárias com muita flexibilidade” para lidar com “a situação totalmente anormal”.

Diante do risco de quebradeira de empresas e bancos, o presidente russo, Vladimir Putin, impôs uma série de medidas de controle de capitais. O decreto do Kremlin diz que pagamentos em moeda estrangeira referentes a contratos de empréstimo a não residentes na Rússia estão proibidos a partir de hoje. E diz que pagamentos a bancos e outras instituições financeiras fora da Rússia serão barrados.

Risco de quebra de banco

A magnitude das medidas pegou parte do mercado de surpresa e abriu espaço para especulações se o alcance poderia levar ao não pagamento da dívida russa. No fim de semana, a agência de classificação de risco Standard&Poor’s já havia rebaixado a dívida soberana da Rússia para junk (lixo), e a Moody’s colocou a nota do país para revisão para potencial rebaixamento.

O conjunto de ações para tentar proteger a economia foi uma resposta às sanções adotadas pelo Ocidente após a Rússia invadir a Ucrânia. Estados Unidos, União Europeia e outros países anunciaram no fim de semana a exclusão de alguns bancos russos do sistema internacional de pagamentos bancários Swift.

Também foram impostas medidas que restringem o acesso do Banco Central da Rússia a reservas internacionais, uma sanção de efeito imediato e sem precedentes, que limita a capacidade de Moscou de defender sua própria moeda.

Na Rússia e nas filiais de bancos russos em outros países, houve corrida por saques nas agências bancárias. Isso levou o Banco Central Europeu (BCE) a afirmar que a filial europeia de um dos maiores bancos russos, o SberBank, poderia quebrar. O SberBank Europe AG, com sede na Áustria, e suas filiais na Croácia e na Eslovênia, “tiveram saídas de depósitos significativas como resultado do impacto das tensões geopolíticas”, explicou o organismo de supervisão bancária do BCE em nota.

A entidade alertou que “no futuro próximo, é possível que o banco não possa pagar suas dívidas ou outros passivos à medida que vencerem”. Os dois maiores bancos russos, SberBank e VTB Bank, têm sido alvo de sanções americanas.

A partir da estratégia de asfixia financeira, o cenário que se delineia para a economia russa é dramático. Especialistas já falam em disparada de juros, da inflação e derrocada do Produto Interno Bruto (PIB).

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"Isso já está impactando a economia russa, com o mercado acionário fechado e a desvalorização do rublo. Vamos observar implicações significativas para investimentos europeus na Rússia", afirmou Carlos Primo Braga, professor associado da Fundação Dom Cabral e ex-diretor do Banco Mundial. "A grande implicação da desvalorização da moeda é o impacto inflacionário na Rússia. A alta de juros vai ter implicações para os custos de empréstimos. A consequência para o país, é um cenário de estagflação."

Para o analista sênior da Oanda, Craig Erlam, o impacto da queda do rublo será concentrado na população local e nos que têm interesse comercial na Rússia:

"A depreciação do rublo afetará a Rússia de maneira terrível, principalmente com a inflação e as taxas de juros. O aumento das taxas não fará nada para amenizar o golpe das sanções. Prejudicará a economia, mas ajudará a reduzir os danos causados pela inflação."

De volta aos anos 1990

Elina Ribakova, vice-economista-chefe do Instituto de Finanças Internacionais, afirmou ao Wall Street Journal que a última rodada de sanções levará a uma contração de ao menos 10% no PIB da Rússia e a uma inflação de dois dígitos.

“Isso nos leva de volta à década de 1990, quando a economia (russa) estava completamente desconectada da economia global”, disse ela, acrescentando que a Rússia provavelmente deve ser forçada a dar calote em sua dívida externa por falta de acesso à moeda estrangeira para pagá-la.

Para a economia global, um grande impacto das últimas sanções sobre a economia russa provavelmente será no comércio. As sanções até agora pouparam amplamente o setor de energia da Rússia. Ainda assim, na noite de ontem o contrato para abril do barril do Brent subia 3,1%, a US$ 100,99. O contrato para maio subiu para US$ 97,26.

O mercado de commodities metálicas e agrícolas também foi afetado. O alumínio chegou a saltar 5% durante o pregão, mas fechou em alta de 0,8%, a US$ 3.385. A expectativa do mercado é que as sanções dificultem as exportações de commodities russas.

No mercado, o dia foi de nervosismo na Europa. A maior queda foi na Bolsa de Paris, com baixa de 1,39%. No Brasil, o mercado segue fechado até quarta-feira.

Ontem, a Bolsa de Valores de Nova York (Nyse) e a Nasdaq suspenderam a negociação de papéis de empresas russas, como a operadora de telecomunicações Mobile TeleSystems e a varejista on-line Ozon Holdings, chamada de a “Amazon da Rússia”. As paralisações são temporárias enquanto as Bolsas analisam as sanções impostas ao país.

*Com agências internacionais

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